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486 I SÉRIE - NÚMERO 16

contraste, por um lado desarmar alguns agentes económicos contra os riscos da imprevisão, e por outro desencadear uma espécie de perícia das cautelas por parte de alguns agentes políticos, mais afoitos nas águas fundas da maré enchente do que nos baixios da maré vazante!
Receio que o Governo se tenha eximido a esse esforço de previsão e esclarecimento, uma vez mais por ausência de ideias.
Optar é difícil. E o momento de escolher é sempre o mais indicativo de clarividência ou de falta dela.
Daí que, não sendo este Governo clarividente, não surpreenda que salte de três opções secas e genéricas, na proposta de lei, para uma caldeirada delas na prosa do relatório.
Melhor seria dizer-se que, no relatório - gordo repetitivo, programático e adorador do cifrão - o Governo propriamente não faz opções. Faz promessas, confundindo optar com prometer.
Promete sem medida e sem critério. Se a cada promessa equivalesse uma opção, estaria achado o caminho mais curto para não optar por coisa alguma! É porventura o mais panglossiano programa de Governo até hoje apresentado.
Seria impossível reter aqui tudo o que o Governo promete.
Mas adianto que o faz naquele seu conhecido estilo de prometer medidas sem dizer quais, subsídios sem dizer quantos, apoios sem dizer em que consistem, estímulos sem adiantar em que se traduzem, esquemas sem esclarecer em que se desdobram.
Lê-se tanto desenvolvimento, tanto progresso, tanta modernização, tanta formação, tanto reforço, tanto acréscimo, tanta panaceia, tanto milhão, que começa a faltar-nos o ar!...
Em matéria de consequências para a economia portuguesa da dinâmica comunitária, o Governo brinda-nos com esta visão simplificadora e estreita: a necessidade de ajustar a agricultura portuguesa aos resultados da reforma da política agrícola comum, nomeadamente à sua reforma; idem os sectores transformador e de serviços a um maior desarmamento em face de terceiros; o aumento da produtividade; a deslocação de activos; a redução dos custos decorrentes da distância; a redução das barreiras não aduaneiras; o reforço da concorrência no mercado interno.
Eis um exemplo da ligeireza com que por vezes se toma a parte pelo todo. Será que o Governo se não apercebe da revolução pacífica que vem aí, e já está a caminho, pelo facto de termos escolhido integrar-nos numa comunidade mais evoluída, mais vasta e progressivamente mais unificada?
Será que se dá conta de que, num futuro próximo, a maioria dos normativos que regem a nossa economia, sem cuidar de outros, escapam à competência dos nossos órgãos legislativos tradicionais?
Será que faz tábua rasa dos efeitos da liberdade de circulação das pessoas sobre a idade da população, a percentagem dos activos, o destino e a mentalidade dos nosso emigrantes, a mutação dos nossos hábitos, a adulteração da língua?
Será que o preocupam os possíveis efeitos negativos da livre circulação dos capitais sobre a titularidade do nosso património?
Será que lhe tira o sono pensar no destino da «panela de barro», do preço e da qualidade dos nossos produtos, lado a lado e rio abaixo com a «panela de ferro»
dos preços e da qualidade dos similares concorrentes ou sucedâneos europeus?
E será mesmo verdade que a nossa participação entusiástica na construção europeia «não representa, nem implica, enfraquecimento da nossa soberania?...»
Não se terá este Governo apercebido ainda de que a formação de grandes espaços económicos a caminho de políticos - de que a Comunidade Europeia é apenas o exemplo mais frizante - bem como as crescentes interdependência e complementariedade das economias e das políticas nacionais características deste fim de século, são o reflexo de uma crise profunda e de consequências não de todo previsíveis geradora dessa forma de «egoísmo em ponto grande» que é o chauvinismo?
Quando será que nos damos conta de que os mais graves problemas do nosso tempo - incluindo a insegurança individual e colectiva, a exaustão dos recursos naturais e a preservação da vida sobre a terra - não têm qualquer solução quando «abordados segundo a lógica dos estados soberanos»?
O meu país continua a ter sempre razão? O país meu vizinho continua, por definição, a ser meu inimigo? Continuo a estar-me nas tintas para fome no Bangladesh? Tenho o direito de inquinar de radioactividade a atmosfera que não é só minha? Ou de comprometer equilíbrios naturais que estão longe de ser uma questão interna?
Pelo que me diz respeito, não cultivo ilusões. E adiro convictamente ao projecto europeu entre outras razões por estar convencido de que antecipa a superação à escala nacional de egoísmos que já não toleramos à escala individual ou de pequenos grupos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É este apenas um exemplo de que este Governo não sabe em que país vive, nem sabe que Portugal programa, que Portugal deseja, tão pouco o Portugal que quer.
Se suspeitasse ainda que só por intuição, o mundo que vem aí, não trazia até nós opções tão parecidas com o rol de legados de um testamento de surpresa.
O Governo não tentou sequer reflectir e escolher. Modelou uma espécie de «bezerro de oiro» com os anéis da comunidade e, mesmo ao dar prioridade à educação e à formação, procura aparentemente mais produção e mais eficácia, como se a felicidade dos homens se medisse em unidades de performance.
Não há, infelizmente, muitos futuros possíveis. E de pouco nos valerão um modernismo ou um crescimento económico de efeitos perversos. Se formos mais evoluídos e mais ricos sobrepovoando e deshumanizando os centros urbanos, sobrexplorando os campos, exaurindo os recursos naturais e poluindo o ambiente, seremos mais atrasados e mais pobres.
Como eu gostaria de surpreender o Governo do meu País preocupado com os reais problemas deste fim de século! Como eu gostaria de encontrar na proposta de lei das Grandes Opções do Plano corajosas e esclarecidas opções sobre questões tão candentes como o futuro energético do País e do Mundo; a explosão demográfica; os ciclos de regeneração e renovação da natureza; o consumismo alienante; a publicidade perversa; a busca dos contornos de uma nova ordem não só económica, mas também política e moral internacional.