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13 DE JANEIRO DE 1989 993

Parece dever assim concluir-se que os proponentes têm consciência de que algumas das medidas que propõem podem colidir com disposições expressas do Tratado de Roma, pelo que ao menos essas só vigoram no decurso do período de transição.
Daí que seja pertinente a questão de saber se, sendo então inelutável o que se receia, a um ou dois anos de data valeria em qualquer caso a pena limitar agora o que logo após terá de ser tão franqueado não tendo a limitação outro efeito que não seja o de aguçar o apetite do investigador estrangeiro. Ainda nesse caso, não estaríamos cumprindo as normas comunitárias que nos vinculam a progredir na redução das discriminações no decurso do período de transição.
Sobretudo se houvermos de ter por certo - como realisticamente parece que temos - que a maioria das proibições prescritas seriam de fácil e conhecida neutralização por recurso a maiorias sociais fictícias ou à conhecida figura do «homem de palha», do que bem poderia emergir o risco da instituição de uma ineficaz e de ilustrantes, salvo seja, «palhaçada»!.
Um pouco de familiaridade com este tipo de proibições ensina-nos que, em regra, só desestimulam os bons investidores, sendo que os maus arranjam sempre maneira de tornear o obstáculo discriminatório.
De onde se concluiria que até o Partido Comunista Português, aliquando pode ser ingénuo!...
Seja como for, subjaz ao seu projecto uma preocupação que deve ser de todos nós, eventualmente corrigida de excessos e exiguidades de diagnóstico e terapêutica.
Mas é bom que tomemos consciência de uma dupla limitação: não podemos, por um lado, fazer apelos desesperados ao investimento estrangeiro e por outro pôr um «muro de Berlim» legal e administrativo de uma barragem de desestímulos a esse investimento. De igual modo não podemos pretender, à força de reserva mental ou de ardis de regulamentação estar simultaneamente dento da CEE e fora dela.
A CEE representa uma nova ordem jurídica internacional cujo primado sobre a nossa própria ordem jurídica debalde se recusaria. E talvez seja bom irmos ensarilhando os argumentos com que por vezes tentamos iludir-nos, opondo a esse primado uma reserva de Constituição só eficazmente oponível em relação a princípios fundamentais da nossa Constituição material.
Que os doutores se deleitem sobre se, sendo mais europeus, somos ou não menos soberanos. Que nomeadamente se confortem com a consideração de que uma autolimitação de soberania é, ela ainda um acto soberano que reserva aquilo que transfere.
Demorará tempo, decerto. Mas um dia virá em que não mais será possível fugir à evidência de que o mundo velho está em trabalho de parto para um mundo novo e que o próprio conceito de soberania - como quer que se defina - não vai resistir incólume a essa mudança.
Talvez que, nesse futuro, o conceito de estrangeiro de que no projecto em apreço se faz tão dilatado uso, se assemelhe tanto ao seu significado hoje corrente quanto um cidadão se parece com uma nota de música.
Se assim for, só teremos de felicitar-nos por cedo termos tomado lugar no foguetão que há-de conduzir-nos a essa galáxia.
De onde a conclusão de que, se estamos na CEE e dela não queremos apear-nos, bom é que nela estejamos sem reserva mental e de espírito pronto para aceitai o projecto político-social em que se traduz o sistema jurídico em que se baseiam os valores e os principio»» por que se rege.
Mas se alguns desses princípios - caso princípios da unidade, da liberdade e da igualdade - constituem um fundo interpretativo e uma essência orientadora que pode, de algum modo criar embaraços a necessidade eventual ou transitória de medidas discriminatórias de autoprotecção ao nível das legislações dos Estados-membros, outros há - como o princípio de solidariedade - que, de algum modo eticamente legitimam o recurso a essas medidas.
O princípio da solidariedade tem duas vertentes fundamentais: a solidariedade inter-pares e a solidariedade dos Estados-membros no confronto com países terceiros.
Daí uma dupla consequência: a de que mal se justificariam restrições que não distinguissem o nacional de um Estado-membro de um nacional de um Estado -terceiro, pecado em que sistematicamente incorre o projecto em apreço: a de que os Estados membros devem compreensão e ajuda aos seus pares afectados por específicas debilidades, mais ou menos sectoriais ou duradouras.
Daí a consagração de poderes aos Estados-membros para, sem limitações de tempo quanto a alguns domínios e limitadas aos períodos de transição quanto a outros introduzirem nos seus sistemas jurídicos restrições às liberdades comunitárias desde que fundadas no interesse geral.
É assim que o artigo 55.º do Tratado de Roma excepciona das regras aplicáveis ao direito de estabelecimento as actividades que participem mesmo a título ocasional no exercício da autoridade pública.
É assim que o mesmo artigo prevê que o conselho por maioria qualificada sob proposta da comissão isente certas actividades da aplicação do disposto no capítulo relativo ao direito de estabelecimento.
É assim que o artigo 56.º consagra que as prescrições do mesmo capítulo não impedem regimes especiais para os súbditos estrangeiros justificadas por razões de ordem pública, de segurança pública e de saúde pública.
É assim que o tratado prevê todo um sistema de cooperação e consultas para ocorrer a situações de excepção ou de conjuntura.
É o caso tipicamente do artigo 103.º que comete aos Estado-membros o dever de considerarem a sua política de conjuntura como uma questão de interesse comum prevendo consultas mutuas com a comissão sobre as medidas a tomai em função das circunstâncias.
É o caso do artigo 224.º que prevê que os Estados-membros se consultem para estabelecerem em comum as disposições destinadas a evitar que o fundamento do mercado comum seja afectado pelas medidas que um deles possa vir a adoptar em caso de perturbações graves internas.
É ainda o caso do artigo 226.º, segundo o qual durante o período de transição, e em caso de graves dificuldades susceptíveis de persistir num sector de actividade económica, bem como de dificuldades que pôs sem traduzir-se na alteração grave de uma situação económica regional, um Estado-membro possa pedir autorização para adoptar as medidas que permitam reequilibrar a situação ou adaptar o sector interessado a economia do mercado comum.