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3224 I SÉRIE- NÚMERO 67

Pedia, portanto a V. Ex.ª que não tomasse as reflexões em substituição dos instrumentos regimentais que cada um tem ao seu alcance. Se com a utilização desses instrumentos a situação já é dificil, se levarmos em conta as meras reflexões que cada deputado pretende fazer sobre o quórum, pior ainda ela se torna.
O que eu solicitava, Sr. Presidente, era que cada Sr. Deputado que entenda requerer a verificação do quórum o faça regimentalmente e que V. Ex.ª lhe dê satisfação, mas só nessas circunstâncias.

O Sr. Presidente: - A Mesa reconhece que não estavam restabelecidas as condições para se continuar o debate, e, tem; o direito, de o reconhecer. Nessas circunstâncias, tomou a reflexão que o Sr. Deputado José Manuel Mendes fez como tendo implícito um pedido de contagem de quórum o que iria fazer imediatamente.
Aliás, a Mesa também já tinha verificado que as condições para o prosseguimento dos trabalhos não eram as adequadas e já tinha suspendido os trabalhos por cinco minutos.
Finalmente, a Mesa implorou e continua a implorar que se criem as condições minimas de funcionamento do plenário. Estamos quase em condições de o fazer e julgo mesmo que, neste momento, estamos em condições de o fazer, pois acaba de entrar o deputado que faltava para prefazer o quórum. Por isso, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, e em especial Sr. Deputado Nogueira de Brito: Talvez valha a pena rememorar que ontem a sessão foi interrompida, no momento em que estavamos a assistir a um debate muito vivo, e muito interessante entre os Srs. Deputados Nogueira de Brito e Costa Andrade, sobre o inciso «desde o momento da concepção» proposto pelo CDS para o n.º 1 do artigo 24.º
Mais uma vez pude constatar a vivacidade e o entusiasmo, diria mesmo a alegria, que o Sr. Deputado Nogueira de Brito põe na defesa dos seus pontos de vista.
Não resisto a prestar-lhe a homenagem porque é isso o que significa aquilo que vou dizer - de lhe referir que, cada vez que o vejo defender com essa vivacidade, por vezes sem razão, mas sempre com entusiasmo e com convicção, um ponto de vista, me lembra o saudoso deputado Amaro da Costa. Não vejo melhor maneira de o elogiar, neste momento, não obstante me encontrar, mais uma vez, em discordância consigo, como é natural.
O Sr. Deputado começou por fazer uma afirmação singular e ouvi-o discutir com o Sr. Deputado Costa Andrade qual o significado deste inciso «desde o momento da concepção». O Sr. Deputado Costa Andrade disse que ele não acrescenta nada, que não vem inconstitucional, a Lei do Aborto, e disse também que, do ponto de vista juridico- penal, não tem real significado.
Com surpresa minha o Sr. Deputado Nogueira de Brito veio a dar-lhe razão e discutiram não sei bem porquê. Discretiaram os dois mas estavam ambos de acordo, porque ouvi-o dizer que «já é este o entendimento do n.º 1».
Fiquei, portanto, um pouco mais á vontade para podermos manter o nosso voto contra algo que o próprio Sr. Deputado Nogueira de Brito considera que é inutil, pois o n.º 1 já tem o significado que continuará a Ter depois do acrescento.
Estou de acordo com o Sr. Deputado Costa Andrade em que este acrescento não passa, necessariamente, a ser um crime de homicídio, não obstante, para quem pretenda argumentar em sentido contrário, este acrescento dê algum jeito. Nessa medida, justifica-se o entusiasmo que o Sr. Deputado pôs na defesa do seu ponto de vista.
Devo dizer-lhe que tenho uma escala de adesões aos valores do menos para o mais. O Sr. Deputado está no topo, eu estou perto do topo. Na base eu coloco aquilo a que poderia chamar um cepticismo judicioso, que já tem alguma adesão, depois o agnosticismo, depois a convicção, depois a crença ou acto de fé. Paro na convicção - sou um homem de convicções -, o Sr. Deputado vai além de mim e vai mesmo até á crença, até á fé que põe na defesa de, pelo menos, alguns municípios.
Não estamos disponiveis para reiniciar esta querela jurídica ou filosófica sobre o problema de qual o momento em que começa a vida e que vida, sobre a qual é o valor tutelado. E isto até porque, quando digo que estou de acordo em que este inciso não transforma em homicidio o aborto, quero realçar o aspecto de que é assim, sem duvida, mas quando o n.º 1 refere que a vida humana é inviolavel, põe-se o problema de saber que vida.
Na Lei do Aborto em vigor - pela qual me bati, de que sou o principal autor, não há nenhuma especie de fuga a essa responsabilidade - coloca-se exactamente o problema do conflito de valores e o da escolha, por vezes, entre duas vidas.
Bem sei que é comoda - e há quem prefira essas comodidade - a posição de transformar Deus no próprio médico-parteiro. Deus que decida!!! Nós não nos podemos dar a essa comodidade e daí que, perante um conflito real de valores, tenhamos, no fundo defendido a solução suave - português suave - que está consagrada na lei em vigor.
Mas ainda relativamente á minha afirmação de há pouco, no sentido de que o Sr. Deputado estava de acordo com o Sr. Deputado Costa Andrade, quero referir que o Sr. Deputado fez uma afirmação singular que gostava de comentar. Disse V. Ex.ª «isso é assim até porque o povo já tem esse entendimento» - penso que não estou a atraiçoar a sua afirmação.
É claro que o povo é uma abstracção com muitos donos e aí temos o Sr. Deputado Nogueira de Brito como um deles. Fiquei cheio de curiosidade e gostava de saber qual foi o universo da sondagem que há-de Ter sido efectuada para que pudesse fazer essa afirmação e fico cheio de esperança que este tema venha a constituir o primeiro objecto do primeiro teste sobre o instituto do referendo, que vamos consagrar na Constituição.
Não tenho a menor duvida de que o Sr. Deputado Nogueira de Brito e o seu partido vão transformar o aborto no primeiro teste do instituto do referendo,