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20 DE OUTUBRO DE 1989 69

Mexer nos problemas sem uma política inspiradora pode dar a impressão de actividade, mas o saldo é sempre o de fazer surgir problemas maiores. Os que hoje pagam mais pela justiça; os que aguardam que os tribunais se entendam sobre o sentido a dar às leis quanto a competência daqueles que foram mais recentemente criados; os que - e são, infelizmente, ainda muitos - aguardam há 5, 6 e 10 anos decisões de tribunais administrativos ou do trabalho ou a execução das suas decisões tom de encontrar uma voz que os represente neste debate e neste momento privilegiado de responsabilização do Governo.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sc é certo que liberdade e democracia são indissociáveis, também é certo que não existe democracia sem justiça. Ao fim de 10 anos de PSD nesta pasta, a justiça atravessa um dos seus mais graves momentos e corre riscos de uma degradação evidente.
Não é apenas a justiça que nos preocupa, são também os direitos do cidadão que são insuficientemente defendidos ou que são sistematicamente violados pelo legislador. Mas uma vez consolidado o regime, são nulos ou francamente diminutos o debate e a iniciativa legislativa neste domínio.
A sistemática sanha com que se tentam, mesmo nesta Assembleia, restringir os direitos da minoria faz que se não estranhe a inexistência da iniciativa no domínio do aperfeiçoamento dos direitos dos cidadãos. Não se estranha, mas lamenta-se. A oposição socialista não deixará, nos próximos meses, como já anunciou, de preencher tal omissão, de dar normal sequência à revisão constitucional e de exprimir o que por toda a parte se sente ser uma necessidade de proteger e estimular, as novas afirmações de cidadania.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Para fundamentar essa moção de censura, no exacto sentido, conteúdo e alcance que lhe demos, conjugam-se também razões de política económica, de política social e de ambiente/de política de educação, de contornos e de profundas repercussões estratégicas.
Há mais de 10 anos que o diagnóstico sobre a debilidade estrutural da economia portuguesa, decorrente de um perfil de especialização frágil e vulnerável, está feito. Há muitos anos que é evidente que os momentos de evolução favorável na conjuntura internacional e no enquadramento externo da economia portuguesa deveriam ser aproveitados para o desenvolvimento, pelo Governo, de programas estruturais de mudança do padrão de especialização, combatendo as dependências estratégicas ao nível agro-alimentar, energético e nos bens de equipamento e superando as fraquezas estruturais de um sector exportador, cuja competitividade assenta demasiadamente em vantagens comparativas decorrentes de salários baixos.

O Sr. António Guterres (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Governo do PSD, por actos, ou omissões, pelos critérios que seleccionou como determinantes para a concessão de incentivos, pela descoordenação entre a lógica dos Ministérios da Indústria, das Finanças e do Planeamento, é responsável pelo mau aproveitamento da oportunidade histórica de que o País desfruta, com o acesso àquilo que tem sido a proveniência dos fundos estruturais.
Em alternativa árduas políticas industriais - a do Ministério das Finanças, onde estão e para onde foram transferidas as empresas geralmente, rentáveis, e a do Ministério da Indústria, a que couberam as empresas problema - não se vislumbra nenhuma política industrial.
As indústrias tradicionais continuam por modernizar e reconverter, os nossos pequenos e médios industriais continuam desarmados perante o exterior e estão a tornar-se presas fáceis dos agentes dos compradores externos, hoje já não apenas em relação aos seus produtos, o que seria óptimo, mas em relação às próprias empresas.
O Governo do PSD é responsável por um processo que hipoteca o nosso futuro colectivo, por uma lógica de hipertrofia - e afunilamento dessa especialização produtiva, em termos de produtos e mercados.
O Governo do PSD prefere a satisfação de clientelas, em vez de incentivar os empresários que querem e não podem investir no desenvolvimento de novos produtos, em novos sectores, utilizando as modernas tecnologias.

Aplausos do PS.

A adesão de Portugal à CEE criou, na sociedade portuguesa, como seria lógico, grandes expectativas de mudança, desenvolvimento e progresso. Ficou também claro para muitos agentes económicos que os desafios que se enfrentavam eram decisivos, que o risco devia ser assumido, que o investimento privado na esfera produtiva deveria aumentar quantitativamente e melhorar qualitativamente. Os apelos ao espírito de iniciativa e de inovação foram multiplicados e muitos empresários portugueses assumiram-nos e mostravam-se dispostos a apostar no futuro.
Com uma política cega em matéria de crédito, o Governo vem gerando o desânimo e ressuscitando o fatalismo e a rotina, com o desenvolvimento de políticas em que o crédito ou não se obtém ou é obtido a taxas de juro reais proibitivas, vem, deste modo, contribuindo para à venda de patrimónios portugueses a interesses estrangeiros - o que é diferente da importância do investimento estrangeiro -, que não sofrem os mesmos condicionalismos e assim beneficiam do ambiente depressivo que atinge múltiplas pequenas e médias empresas de Portugal.
O Governo do PSD é responsável pela decepção de milhares de empresários que quereriam responder favoravelmente aos grandes desafios com que o País se confronta e que não podem exercer essa resposta. Objectivos nacionais decisivos não podem passar a ser chavões desprovidos de qualquer conteúdo prático.
Não podemos manter-nos impávidos perante a demissão deste Governo face as grandes linhas da transformação estrutural exigida pelo nosso futuro europeu. A Europa comunitária está a ser vista como um novo eldorado de fundos. Não podemos assistir, em simultâneo e por curiosa contradição, ao esbanjamento em favor de clientelas e até a não utilização de recursos disponíveis.
Para o Governo, a Europa é apenas uma inesgotável e providencial floresta de «árvores das patacas». Muitos já se aperceberam de que essa é a visão e a ambição que o Governo dela tem. Para além do mais, esse é o risco em que este Governo está a colocar o País. De facto, não será possível continuar por este caminho. Temos o direito de reclamar a solidariedade comunitária, mas também temos o mais rigoroso, dever de fazer bom uso dos frutos que, em nome dessa solidariedade, nos venham a caber.