O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

23 DE MAIO DE 1990 2551

seu Secretário-Geral, o Prof. Cavaco Silva atreveu-se a tocar no intocável, enquanto Vicente Jorge Silva qualificou o gesto do Primeiro-Ministro como uma «pedrada no charco» - o tal charco que, até aqui, não havia perturbado as narinas sensíveis e o apurado olfacto do Presidente da Câmara de Lisboa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Queremos afirmar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, se, por um lado, chamamos a nós o mérito da iniciativa, não podemos deixar de reconhecer, modestamente, que com isso não descobrimos a pólvora.
Por um lado, desde 1984 que o PSD consagrou formalmente, no seu Congresso de Braga e na moção de estratégia que teve o Prof. Mota Pinto como primeiro subscritor, a necessidade de introduzir reformas no actual sistema eleitoral, defendendo-se, inclusive, a criação de círculos uninominais.
Por outro lado, há mais de 10 anos que políticos responsáveis de todos os quadrantes democráticos - em particular do CDS e do PS - apontam o caminho concreto a que devem obedecer essas alterações, havendo em todas elas as seguintes preocupações comuns: reduzir o número de deputados; reduzir a dimensão dos círculos eleitorais; conseguir uma maior aproximação do deputado ao eleitor; mitigar o princípio da proporcionalidade, como condição de eficácia do sistema político e de garantia de existência de governos estáveis.
Ouvimos hoje as declarações de responsáveis por ambos estes partidos e não descortinamos onde esconderam os princípios que lhes foram tão caros há poucos anos atrás.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não apoiado!

O Orador: - O PS e o CDS lançam sobre esta discussão um manto insuportável de hipocrisia,...

Aplausos do PSD.

... procurando afastar a discussão para suspeições inadmissíveis que sempre lhes poderiam ser assacadas, já que não vai longe o tempo em que propuseram exactamente o mesmo que o PSD propõe hoje, nalguns casos de forma mais radical.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não é verdade!

O Orador: - Gabriel Garcia Marquez escreveu que «quem não tem memória faz uma de papel», e é dos papéis que me socorro para avivar a memória de quantos se juntam hoje em coro de carpideiras desvalidas, rezando ladainhas pelos malogrados defuntos que a iniciativa do Governo poderia provocar na área dos pequenos partidos.
Não vai longe o tempo em que o actual líder do CDS, em O Primeiro de Janeiro, se referiu ao sistema eleitoral português nestes termos: «O actual sistema eleitoral proporcional é o cancro da vida política portuguesa.»

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Em que data?

O Orador: -Já vamos à data! «Para se poder efectuar uma reforma política em Portugal é necessária uma alteração do sistema eleitoral.»
Assim, sem tirar nem pôr, com a crueza patenteada nesta metáfora, transcrita a 23 de Novembro de 1985 pelo Diário de Lisboa, Freitas do Amaral lançava uma «acha» em brasa na disputada corrida presidencial em curso.
O CDS, em particular, habituara-se, há muito, a ouvir o seu antigo líder anatemizar o sistema eleitoral em vigor. Na verdade, já no dia 23 de Maio de 1985 O Primeiro de Janeiro estampava, em letras garrafais: «Método de Hondt não garante a estabilidade. Lei Eleitoral deve consagrar sistema maioritário - defende Freitas do Amaral.»

Vozes do PSD: - Não têm vergonha!

Protestou do deputado Narana Coissoró, do CDS.

E, para que não restassem dúvidas, passados cinco dias...

Protestos do PS e do CDS.

Sr. Presidente, espero que isto seja descontado no meu tempo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Duarte Lima vai suspender durante alguns momentos a intervenção, até que se verifiquem as condições para continuarmos os trabalhos.

Pausa.

O Orador: - Como dizia, passados cinco dias, na conferência proferida sobre o tema «Portugal, País ingovernável ou não», Freitas do Amaral ia mais longe, dizendo: «O principal problema da sociedade portuguesa reside no facto de, depois do 25 de Abril, termos tido, em média, um governo por ano. Enquanto se mantiver o actual sistema de representação proporcional não será possível operar grandes modificações na sociedade portuguesa.»
Não houve então, Srs. Deputados, boas consciências indignadas e, se as houve, as crónicas não deram notícias delas.
As vítimas potenciais do holocausto eleitoral, se as havia, guardaram o prudentíssimo silêncio imposto pela conveniência da ocasião.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas, feito que estava o diagnóstico, não se iludissem os incautos na vã esperança de que o candidato presidencial não tivesse receita segura para debelar o mal que assim amofinava o País.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O candidato presidencial! Não o líder do CDS!...

O Orador: - Revelou-o diversas vezes. Desde logo, de forma soleníssima e grave, na conferência proferida no Grémio Literário a 9 de Maio de 1985, num círculo promovido pelo Clube de Imprensa subordinado ao título: «Portugal: as reformas necessárias». A citação é longa, mas é grande o proveito em ouvi-la: «De 1976 até hoje, em nove anos, devíamos ter tido dois governos de legislatura, mas tivemos nove, o que dá uma média de um governo por ano. Os prejuízos que daí advêm para a autoridade do Governo e para a eficácia da Administração são incalculáveis [...]. Por outro lado, ainda, o sistema político português afasta o cidadão das instituições: [...]»