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6 DE JUNHO DE 1990 2741

Começo justamente por lembrar que o conceito de escola empenhada que orienta, e com justificação, a política do actual Governo me parece necessitar de um debate nacional, que vai muito para além das afirmações de um departamento governamental, exactamente porque está muito em causa qual é a definição de valores que está a ser implantada para definir um novo conceito estratégico nacional, que não temos.
E isto porquê? Porque essa velha universidade, com os outros instrumentos de integração, que tão mal ensinou e que finalmente vai ser completamente renovada,' felizmente pela mão daqueles que ela própria educou, foi uma universidade formada e que exerceu a sua função numa comunidade subordinada a um conjunto de valores que exigia fidelidades verticais. Foi essa a concepção do Estado e da comunidade durante séculos.
Suponho que não reparamos suficientemente que todo o nosso processo actual é um processo de implantação de valores de fidelidades horizontais, que desafiam esses valores verticais, que se trata de uma nova estrutura do Estado e de uma nova definição da função da comunidade e que tudo isso precisa de ser debatido e relacionado para dar conteúdo ao simples conceito nominal de que a escola é uma escola empenhada.
Suponho que é justamente isso que exige alguma atenção da nossa parte para colaborarmos na política que está a ser executada, chamando a atenção para o facto de o processo de integração das gerações não ser exclusivamente um processo dependente do Ministério da Educação e dos aparelhos que lhe estão subordinados, pois há outros aparelhos de integração fundamentais que me parecem completamente descoordenados da actividade desse Ministério. É assim, por exemplo, que se entende mal ou não se conhece qual a relação entre o Ministério da Juventude e o Ministério da Educação, que filosofias convergentes os orientam e em que medida esse Ministério está consciente, informado e cooperante com a filosofia que é enunciada pelo Ministério da Educação.
Julgo que vimos com algum descaso a circunstância de ter havido uma modificação rápida, súbita e não anunciada da função das forças armadas neste processo. Tem a ver com este processo o conceito do serviço militar, tem a ver com este processo a função integradora que as forças armadas tiveram e que perderam. Não houve uma meditação sobre isso, nem há uma redefinição a esse respeito; portanto, suponho que o projecto do Ministério da Educação precisa de ser articulado com esta omissão, em relação à qual não houve qualquer anúncio, debate, meditação ou decisão.
Acontece que esta batalha em que o Ministério da Educação está empenhado se verifica numa data em que a maior parte dos instrumentos de integração social tendem a transformar-se em conceitos nominativos, porque perderam o conteúdo antigo e ainda não adquiriram um conteúdo novo.
A família não é a mesma, a sua função integradora é diferente e a sua capacidade está diminuída; a Igreja exige outras maneiras de intervir, já não lhe chega o ensino nas escolas e reclama a participação na grande cátedra que é a televisão; as forças armadas perderam a sua função de espelho tradicional da Nação. Todos estes instrumentos se debilitaram, perderam conteúdo e caminharam para conceitos nominais. Suponho que isso desampara bastante a acção do Ministério da Educação e que, em alguma instância, devemos discutir isto, mas numa instância mais abrangente do que aquela que se traduz na simples responsabilidade do Ministério da Educação.
Estamos numa época de pluralismo e bivalência das escalas de valores; a sociedade é de opinião e de pluralismos e os instrumentos de integração não foram reinventados.
Temos, pelo contrário, instrumentos integradores que nasceram à margem de qualquer plano e nos quais avultam, justamente, as formações políticas.
A maioridade foi antecipada. É nominativo afirmar que as forças armadas continuam a ter uma função integradora, pois quando os jovens lá chegam já foram integrados pela actividade política, porque estiveram nas juventudes partidárias, tomaram responsabilidades, criticaram os governos, votaram, fizeram campanha eleitoral e assumiram o conceito das próprias forças armadas que era suposto integrarem. Esse vazio também não está preenchido.
E no meio disto o ponto que me chama mais a atenção é justamente o da universidade. Suponho que também nos obriga a aceitar que o conceito antigo vai caminhando para nominativo e que não lhe encontramos um conceito novo. Mantém o prestígio nobiliárquico.
As instituições querem embandeirar-se com a dignidade universitária. Mas todas elas corresponderão a um conceito definido ou a um conceito substantivo e operacional?
Sabemos que elas têm variado no seu conteúdo e sabemos que é diferente a estrutura, por exemplo, da Universidade Internacional das Nações Unidas, que não tem currículo, não profissionaliza e não tem diplomas, mas desempenha uma função universitária de coordenação de estímulo à investigação.
Sabemos que não se chama universidade àquela que é, provavelmente, a maior universidade ocidental, a NASA, mas continuarão a ser universidades todas as instituições que estão a semear o campo do ensino superior entre nós.
Aqui levantam-se alguns problemas que vejo que prejudicam a serenidade do raciocínio, porque tudo se reconduz, quase sempre, ao conflito entre o ensino oficial e o ensino privado, entre privilégios dados a umas instituições que não devem ser dados a outras, mas suponho que o problema é bem diferente. E é bem diferente pelo seguinte: seja qual for o conceito de universidade, suponho que ela não existe quando não tem a capacidade de reproduzir o seu corpo docente. Essa é que é a natureza institucional da universidade.
Aquilo que se pergunta, e sobre isso não tenho informações, nem números fornecidos pelo Governo nem por outras entidades, é quantas das instituições embandeiradas com as dignidades universitárias demonstraram capacidade de reproduzir o seu corpo docente. É justamente esta incapacidade de reproduzir o corpo docente que, suponho, prejudica a posição deste Governo em termos realistas.
Basta-nos examinar cada uma das faculdades clássicas, podemos pensar nas mais clássicas de todas, as faculdades de Direito, e ver quantos doutores se sentam no Conselho Científico da Faculdade de Direito de Lisboa e quantos doutores se sentam no Conselho Científico da Faculdade de Direito de Coimbra. Relacionemos isso com o numerus clausus que as instituições oficiais fixam, somem-se as licenciaturas e o número de alunos das instituições que se chamam universidades privadas e perguntemos como é que o mesmo número de doutores sentado em duas faculdades, que têm o numerus clausus fixado pelas instituições oficiais, são os únicos que pó-