2744 I SÉRIE - NÚMERO 82
De resto, a formação profissional, hoje, resume-se na caça aos fundos comunitários, existindo em função deles. Esta perspectiva distorcida terá consequências mais visíveis no Portugal de 1993, quando os meios à disposição já não forem tão fáceis de obter como hoje. Porque hoje, em Portugal, é o improviso que funciona como regra: o perfil técnico dos formadores, os programas dos cursos, as instalações, tudo de improviso para aproveitar os fundos. É legítimo, pois, questionar o valor desta formação.
No sector primário, a situação de formação profissional é extremamente precária, até por consequência da fragilidade da estrutura fundiária portuguesa. Por isto mesmo, a formação contínua deveria constituir uma prioridade, mas tem sido descurada. No entanto, é quase intuitivamente perceptível que não dar formação aos actuais produtores põe em causa todo o progresso deste sector de actividade.
Também neste sector a formação profissional é feita em série, sem atender aos níveis de qualidade, e apenas com o objectivo de ultimar processos de financiamento. O mais grave é que nesta lacuna evidente não é oferecida qualquer garantia de que os formandos serão reciclados posteriormente.
Os jovens beneficiários destes cursos de formação são enganados, sendo-lhes criada a ilusão de que já estão preparados. No terreno, verificarão à sua própria custa e à custa da produtividade do sector primário as carências da sua formação.
Para o nível da eficiência e qualidade de formação é necessário um levantamento geral, no País, das várias áreas profissionais, como aliás se impõe, que permita identificar e delimitar as várias profissões/ocupações existentes em cada área, estabelecer os respectivos itinerários de carreira, delimitar os conteúdos ocupacionais, definir e caracterizar os perfis das várias ocupações, conceber e elaborar os conteúdos programáticos das mesmas.
Não é feita a actualização sistemática dos conteúdos programáticos formativos, como seria indispensável, com vista a acompanhar o ritmo de evolução tecnológica existente, designadamente ao nível das profissões pertencentes ao grupo das designadas por «novas tecnologias». Como é óbvio, esta grave lacuna decorre da não existência do levantamento atrás referido.
Por este facto, a eficiência/qualidade da formação fica muito aquém da que seria justamente desejável e que, a nosso ver, poderia ser alcançada, com os evidentes benefícios para o País... Faz-se a importação sistematizada de programas e soluções formativas, sempre desajustadas da nossa realidade e raras vezes adaptadas, quando, no entanto, temos capacidade para construir as nossas próprias soluções.
Não existe uma prática de levantamento e planificação sistematizada, instrumento indispensável que permitiria, a cada momento, identificar as necessidades de formação profissional a nível do País, com vista a possibilitar o adequado lançamento das acções, em qualidade e quantidade, para fazer face a essas mesmas necessidades atempadamente e com uma relação custo/qualidade que estamos longe de atingir nas actuais circunstâncias. Desta falha resulta que a formação profissional que se desenvolve actualmente no nosso país, da responsabilidade do IEFP, é quase exclusivamente no domínio da «qualificação profissional inicial», quando se justifica, a nosso ver, um forte investimento no domínio do «aperfeiçoamento profissional» dos trabalhadores já qualificados.
Esta medida permitiria que os nossos profissionais se aproximassem dos níveis de qualificação dos seus congéneres dos nossos parceiros da CEE, desejo esse que é repetidamente declarado pelos responsáveis pela formação profissional em Portugal.
Estamos, no entanto, ao invés, a aumentar o número dos «mal qualificados». Existe ainda outra agravante! É que os formados que terminam a sua qualificação inicial nem sempre têm uma perspectiva de emprego imediato e os que a têm é por vezes em profissões diferentes daquelas para que foram qualificados, daqui resultando em pura perda os conhecimentos e as capacidades adquiridos.
O nível de qualificação técnica dos candidatos a formadores, que ultimamente têm vindo a integrar o corpo técnico do IEFP, desce significativamente. E a razão é simples: as baixas condições salariais oferecidas aos possíveis candidatos não são de molde a possibilitar o recrutamento dos técnicos com a qualificação que seria desejável.
A juntar a este facto, assiste-se ainda, a nosso ver, a uma progressiva degradação da qualidade de formação técnico-pedagógica dos formadores. Na base desta degradação está, entre outras, uma duvidosa qualificação técnica dos formadores de formadores, que são contratados vindos não se sabe de onde e obedecendo a critérios de selecção duvidosos.
Não existe neste momento um sistema/serviço de certificação profissional. Mas todos sabemos que o Ministério da Educação certifica e homologa a formação que é obtida no sistema educativo.
É sabido que, futuramente e no âmbito da CEE, será o Instituto do Emprego e Formação Profissional o organismo a quem competirá certificar e homologar a qualificação profissional e o único acreditado para o efeito para que essa qualificação seja reconhecida em todos os países da Comunidade. Para quando a criação desse sistema? Como se verifica, também esta é uma lacuna grave que urge remediar quanto antes.
Quanto à formação profissional que é feita com os fundos comunitários, não será nunca de mais denunciar escândalos, desajustamentos e perversões. O que tem sido essa formação profissional na maioria dos casos, que o digam os jovens que, de uma maneira geral, têm sido os beneficiados. Muitos deles têm feito repetidas acções sem que daí tenham tirado qualquer lucro efectivo, excluindo o dinheiro/subsídio que recebem durante a frequência dos estágios. A qualidade dessa formação profissional, na maioria dos casos, é praticamente inexistente, porque as empresas estão, em muitos casos, mais interessadas nos subsídios que lhes são atribuídos do que na formação em si mesma.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Cremos que muitas das consequências da situação descrita estarão já explícitas ou implícitas. Mas gostaríamos de tentar sintetizar algumas das que nos parecem assumir maior importância neste contexto.
Da formação profissional que estamos a praticar resulta o acréscimo dos mal qualificados em detrimento da melhoria da qualificação dos já existentes. Os nossos trabalhadores são colocados em situação de desigualdade de oportunidades no acesso às profissões melhor remuneradas, face ao melhor nível de qualificação dos seus congéneres dos países mais desenvolvidos. A imagem de Portugal na CEE não sairá nada beneficiada se aos quantitativos aplicados não corresponder um aumento pró-