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12 DE JULHO DE 1990 3483

É admissível, Srs. Deputados, que se critique o Governo porque se acusa e o Ministério Público recorre? É admissível que se critique o Governo porque os absolvidos explicam que foram injustamente acusados? É admissível que se critique o Governo porque, com a legislação processual penal que temos, há presos preventivos a mais?
Afinal, pretende-se fazer do Governo o bode expiatório de quê? Pretende-se, no fundo, transformar a crise da justiça, não em algo que pode deprimir-nos se não for ultrapassável, mas num verdadeiro anti-depressivo. Todos precisamos da crise para vivermos tranquilamente na nossa postura de interventores democráticos; se, um dia, a crise desaparece, o que será de nós? Qual é o nosso papel?

Aplausos do PSD.

É fundamental, por isso, que tenhamos a noção de que muito se fez, quando comparamos a realidade de hoje com a de ontem. E é, por isso, necessário darmos, não um crédito dê confiança ao Governo, mas um credito democrático geral de que os debates desejáveis sobre a justiça são debates produtivos que caminham para o futuro e para a mudança e não são debates em que nos acusamos uns aos outros, procurando culpas, porventura inexistentes, em vez de, em conjunto, tentarmos encontrar as causas que solidarizam e não as culpas que dividem e nos colocam uns contra os outros em prejuízo da democracia e do cidadão, em nome de quem a justiça necessariamente e por força constitucional se administra.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Governo realizou muitas acções concretas que foram sendo desenvolvidas ao longo das várias exposições, nomeadamente ao longo da minha primeira exposição, várias vezes aludida neste Parlamento como sendo excessivamente filosófica - e filosófica no sentido tradicional de que a filosofia não serve a ninguém a não ser quando, afinal de contas, ela suporta uma ideologia, ideologia que, por sua vez, não é outra coisa senão o suporte daquilo que é um programa político, programa político que, por sua vez, não é outra coisa senão a consubstancialização de uma acção que se deseja.
A filosofia, no fim de contas, é ela, na postura final da execução do programa, a verdadeira primeira acção concreta. Ainda bem que um governo tem filosofia!
O importante agora é que, no desenvolvimento concreto dessa filosofia, estejam aí as acções. Essas acções estiveram presentes na primeira intervenção e, ao contrário do que foi dito - que o Ministro da Justiça não tinha respondido às questões colocadas -, estiveram presentes numa intervenção de resposta de cerca de 40 minutos; estiveram presentes na intervenção do Sr. Secretário de Estado, que, ao listar o conjunto de acções concretas que o Governo está a desenvolver, mereceu o epíteto de arrogante apenas porque demonstrou que a crise não tinha a dimensão que se pretendia; e estiveram presentes em muito mais, estiveram naquilo que, creio, não haver necessidade sequer de dizer aqui. E penso que não vale a pena fazê-lo por uma simples razão: é que o discurso faz-se sobre os programas e a acção ou é ou não se discursa sobre ela. Se o é, a atenção de todos levará, certamente, a reconhecer a sua existência.
Justamente porque não entendo dever trazer aqui um discurso que não seja um discurso de Estado, como vos propus inicialmente, convido-vos, por intermédio da 3.ª Comissão, por intermédio do Plenário em geral - isto se me permitirem violar o próprio regulamento -, a que sempre que o Ministro da Justiça se desloque neste país seja acompanhado pelo número de deputados que a 3.ª Comissão entender para que VV. Ex.ªs possam também conhecer, ao lado dos tribunais em situação degradada, ao lado dos sistemas que não funcionam bem, todos os outros que estão recuperados, todos os tribunais que são novos, todos os estabelecimentos prisionais que funcionam de modo diferente, para que, assim, possam realmente ver aquilo que é, na globalidade, o funcionamento do sistema de justiça em Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não pretendo com isto dizer que a intervenção de VV. Ex.ªs foi menos honesta. Apenas ficou para mim claramente provado que há muito da realidade do sistema judiciário que, por razões de natureza geográfica, vários de VV. Ex.ªs não conhecem.
Portanto, é necessário que, numa postura de Estado, que tenha a ver com o debate alargado sobre a situação, todos possam conhecer a totalidade da situação e, nessa altura, entender então que existe crise mas que é uma crise relativa, que está em vias de superação, que permite que se defina uma política de justiça para o futuro e que vale a pena, em conjunto, partilharmos essa política.
Um exemplo só do que não disse - aliás, não o queria dizer porque tenho medo de ser considerado novo-riquista ao fazer essa afirmação - é este: em Março do próximo ano todos os tribunais do País estarão apetrechados com sistemas de gravação audio. Mas porquê dizê-lo aqui? Para fazer uma listagem das várias compras que vamos fazendo, do vário apetrechamento que vamos fornecendo ao sistema judiciário. Eles lá estarão, serão visíveis, dar-se-á conta deles! Irá dar-se um salto qualitativo na celeridade e na garantia de qualidade do recurso e na possibilidade de apreciação da prova em recurso. Mas isso, Srs. Deputados, faz-se, não se discursa sobre isso!

Aplausos do PSD.

Discursa-se é sobre os contornos que definem os programas. Pode discorrer-se se se deve ou não instalar um Tribunal da Relação em Évora (aliás, já o está); pode discorrer-se se se deve ou não instalar outro Tribunal da Relação no Algarve. Como é evidente, o ministro não pode responder de imediato a essa questão.
Será que o Sr. Deputado, quando propôs a instalação do Tribunal no Algarve, pretendia extinguir, simultaneamente, o de Évora? Será que, quando propôs instalar um Tribunal da Relação no Algarve, tinha o levantamento do número de processos pendentes no Tribunal da Relação de Lisboa, que permitirão ou não tomar essa decisão?

Vozes do PSD: - É claro que não tem!

O Orador: - De qualquer modo, é uma proposta e todas as propostas são bem-vindas.
Inicialmente, tive receio de que, com a sua intervenção, o Sr. Deputado Hermínio Martinho estivesse a propor a instalação do Tribunal da Relação na Sertã.

Risos do PSD.

Digo isto porque hoje, por força do novo Código de Processo Penal, há repetição da prova em segunda instância e, como o Tribunal da Relação de Coimbra fica bastante mais longe de Vila de Rei do que o Tribunal de Castelo Branco, fiquei sem saber se, de facto, essa proposta também estava no seu espírito. Presumo que não!