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12 DE JULHO DE 1990 3481

E, por mais que se afirme, ainda que de forma brilhante, como o fez o Sr. Ministro, que o acesso à justiça é uma realidade, é preciso deixar claro que ela nunca o será, de facto, enquanto a justiça custar o que custa, enquanto os tribunais estiverem dissociados das pessoas, como estão, enquanto o cidadão não participar activamente na realização da justiça. Há que fazer com que os cidadãos sintam a aplicação da justiça mais como a legitimação da sua própria vontade do que a legitimação da vontade do Estado.
Decidimos pensar a aplicação da justiça, na certeza e com a certeza de que, ao pensarmos, fazemos o mundo em estilhaços, mas também com- a certeza de que, sempre e logo, insensivelmente, vamos erguendo, com eles, de novo, uma ponte.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Se houve algo de positivo neste debate, e houve muito, em nossa opinião, foi o facto de o Sr. Ministro da Justiça ter reconhecido que o Governo, apesar de ser de legislatura, ao fim de três anos ainda não cumpriu o que de mais significativo se propunha fazer no seu programa. É importante que o tenha feito, porque só uma postura de verdade permitirá trilhar os longos caminhos que levarão a justiça em Portugal a ser o reflexo real e a prova de sermos um verdadeiro Estado de direito democrático.
Além do balanço mais significativo que podíamos fazer desta interpelação -o reconhecimento das omissões e dos erros passados -, o mais importante é, no entanto, como, aliás, nos propusemos, logo desde o início, o definir um conjunto de medidas essenciais que levem ao desbloqueamento da justiça em Portugal.
Neste aspecto, o debate também não podia ter sido mais rico - embora a escassez de tempo não nos permitisse ir mais fundo e pormenorizadamente na análise das diversas questões que se colocaram -, já que dele foi possível extrair algumas linhas de força, que todos consideram importantes e essenciais, da actividade futura do Governo na área da justiça.
Assim, e sucintamente, entre muitas outras medidas, reconheceu-se:

A necessidade de rápida conclusão de um novo Código de Processo Civil que, para além das grandes opções sobre um novo tipo de relação jurídico-processual que privilegie a vertente social e os novos modelos processuais, simplifique os circuitos dos processos por forma a conseguir-se uma maior celeridade e, simultaneamente, uma real solução dos casos submetidos a discussão, com prejuízo, portanto, dos actuais obstáculos de natureza instrumental;
A necessidade de execução decidida do novo Código de Processo Penal, geralmente reconhecido como um bom código, embora se reconheça a necessidade de rever alguns dos aspectos que tem inviabilizado a aplicação da letra e do espírito que presidiu ao Código Penal de 1982, de forma a conseguir um julgamento célere dos processos com as garantias naquele contidas, nomeadamente a da redução a escrito da prova;
A necessidade da consagração, clara e sem quaisquer ambiguidades, da distinção de competências entre os serviços prisionais e tutelares de menores e os serviços de reinserção social, para que aos dois primeiros pertença, exclusivamente, a administração e disciplina dos diversos estabelecimentos e aos últimos a assistência prisional e pós-prisional e a assistência aos não imputáveis (menores de 16 anos);
A necessidade da aprovação da legislação complementar da lei do acesso ao direito e à justiça e à sua execução decisiva nas componentes da informação e consulta jurídicas e o patrocínio oficioso;
A necessidade do fomento de uma política de extensão da Polícia Judiciária a todo o País e de uma política de investigação criminal mais eficaz e garante dos direitos e liberdades fundamentais;
A necessidade de intensificação do combate à droga nas prisões;
A necessidade de reorganização dos serviços e do registo e notariado no sentido da sua desburocratização;
A necessidade de elaboração de uma nova Lei Orgânica do Ministério da Justiça por forma a codificar os actuais diplomas avulsos dos serviços nele compreendidos;
A necessidade de intensificação da formação dos oficiais de justiça, dos funcionários prisionais e, em geral, dos funcionários dos organismos dependentes do Ministério da Justiça;
A necessidade de intensificação da recuperação e construção de estabelecimentos prisionais, bem como dos tribunais, esquadras da polícia, e outros serviços na dependência do Ministério da Justiça;
A necessidade de intensificação da informatização dos serviços do Ministério da Justiça, com prioridade para os tribunais.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Como o Sr. Ministro aqui afirmou, e bem, a justiça exige uma visão de Estado, porque é nesta área que nos momentos difíceis e de crise uma sociedade põe à prova a sua capacidade de auto-regulação e auto-controlo, em suma, a sua viabilidade como Estado democrático de direito. Não existe democracia sem justiça. Não existe nem democracia nem justiça se o principal responsável governativo não informa o orgão de soberania Assembleia da República do que foi feito e das soluções concretas que preconiza.
Ficámos preocupados. Ficámos preocupados com o facto de o Sr. Ministro se ter limitado a enunciar princípios e filosofias, deixando sem resposta esta Assembleia quanto às perguntas muito concretas que lhe foram colocadas, e que se baseiam em factos que, ultimamente, têm vindo a público demasiadas vezes e ilustrando uma situação preocupante, nomeadamente: as questões relativas à Polícia Judiciária, a sua actividade e a relação com o Ministério Público e com os Serviços de Informações; aos estabelecimentos prisionais, ao relatório da Amnistia Internacional, reportando a existência de alegadas práticas de violência; à política de reinserção social e tutelar de menores; ao combate à criminalidade organizada e internacional; à toxicodependência e ao tráfico de droga que prolifera nas prisões; à justiça laboral; enfim, a todo um conjunto de factos que cada vez mais nos preocupam e preocupam os Portugueses.
Em relação a tudo isto, factos passados e planos para o futuro, o Sr. Ministro nada nos disse, contrariamente ao que nos linha prometido no início do debate. Provável-