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3 DE DEZEMBRO DE 1990 665

Os baldios são agora integrados no sector cooperativo e social, assegurando-se a sua coexistência com os restantes sectores da propriedade.
Mas, se, nos termos do artigo 86.°, n.° l, o Estado estimula e apoia a criação e a actividade de cooperativas, já não dispensa idêntico favor àqueles bens comunitários.
Em suma, a Constituição garante a existência dos baldios, mas, banida dela a meta do socialismo, já não os privilegia, nem lhes confere qualquer protecção especial.
Justamente, por isso, excluídos do sector da propriedade pública, onde estiveram integrados até à 2.* revisão constitucional, o estatuto da sua posse e gestão tornou-se manifestamente inconciliável com qualquer tipo de tutela administrativa, já que apenas se lhe pode adequar, directa ou supletivamente, uma tutela jurisdicional.
Expendidas estas considerações, é altura de apreciar a nova investida do PSD contra o regime jurídico dos baldios.
É óbvio que o projecto de lei n.° 532/V não é só um repositório de flagrantes inconstitucional idades, pois, mais do que isso, ele consubstancia uma autêntica fraude à Constituição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Da leitura do seu articulado se deduz, na verdade, sem qualquer esforço, que, em face da decisão do Tribunal Constitucional, o PSD propôs-se contornar os preceitos da Constituição em que aquele se baseou para impedir que as comunidades locais fossem despojadas dos baldios em proveito das juntas de freguesia.
Proclamada por aquela suprema instância a impossibilidade desse esbulho, à luz do artigo 82.°, n.° 4, alínea b), da Constituição, que assegura às comunidades locais a posse c gestão dos baldios, o projecto de lei lenta iludir essa proibição, servindo-se agora, para o efeito, do governador civil.
Aproveitando-se da vocação institucional deste representante do Governo para o exercício de actividades de fiscalização e polícia, o projecto de lei incumbe-o prodigamente de tarefas desse jaez com o transparente propósito de paralizar a acção das assembleias de compartes e dos conselhos directivos, esvaziando-os, na prática, dos seus poderes mais significativos.
Já não se trata, com efeito, de possibilitar ao governador civil apenas uma intervenção a posteriori na gestão dos baldios, como acontece agora com a homologação do plano anual de aplicação das receitas previamente aprovado em assembleia de compartes.
Nada disso! O governador civil, investido em amplíssimos poderes de tutela, virá a dispor, se o absurdo projecto vingar, de um representante, que participará, sem direito de voto, não só nas reuniões das assembleias de compartes mas ate nas dos conselhos directivos.
Esse representante poderá "espiolhar" a contabilidade, solicitar outros elementos, interpor-se entre os órgãos comunitários e os serviços públicos e, enfim, poderá praticar outros actos que se enquadram igualmente no perfil de um verdadeiro polícia.
Mas há pior: o projecto de lei tem ainda a audácia de prescrever que, sem a aprovação do governador civil, carecem de eficácia as deliberações das assembleias de compartes que visem a regulamentação do uso e fruição dos baldios e até as que elejam ou demitam os membros dos conselhos directivos!

O Sr. Armando Vara (PS): - Uma vergonha!

O Orador: - Ignoramos qual terá sido, nesta última parte, a fonte de inspiração do projecto, mas vem-nos irresistivelmente à memória o modo de tutela que o regime fascista adoptou para impedir ou controlar a expansão dos movimentos associativos, designadamente o sindical, o estudantil e o das associações culturais.

Aplausos do PS.

Em suma: como o acórdão do Tribunal Constitucional impediu a usurpação dos baldios pelas juntas de freguesia, o projecto de lei tenta agora consumá-la pelo governador civil, mediante a organização de uma tutela inflacionada, que coloca na inteira dependência do representante do governo no distrito a fruição e destino daqueles bens comunitários.
É um expediente grosseiro, já que hoje, à face do texto constitucional, não é sequer possível qualquer forma de tutela administrativa sobre os baldios, como demonstrámos, mas não é por acaso ou inocência que o projecto envereda por essa solução.
Ao pretender entregá-lo aos governadores civis, o projecto de lei tem certamente em conta os serviços prestados por estas entidades, quando filiadas no PSD, no bloqueamento da acção dos conselhos directivos, ao escusarem-se, umas vezes, e, outras, ao retardarem a aprovação do plano anual de aplicação das receitas, ao abrigo dos poderes que, para o efeito, o Decreto-Lei n.° 39/76 lhes concedeu, sempre na mira de inviabilizarem o regime de fruição dos baldios consagrado por este diploma.
Já não resta, infelizmente, tempo para proceder à análise das demais inconstitucionalidades de que o projecto se encontra recheado, em especial as referentes aos bizarros temas da instituição e extinção dos baldios e da sua integração no domínio privado das freguesias.
Serão, por isso, discutidas na especialidade, já que não é de presumir que a maioria que temos venha a assumir uma postura autocrítica que a leve a suster uma iniciativa legislativa que se esgota, de facto, numa nova arremetida contra a Constituição, mais insidiosa, mas não menos perversa, do que aquela que foi censurada pelo Tribunal Constitucional.
Tudo indica, na verdade, que o PSD se manterá obstinado no seu intento de esbulhar as comunidades locais dos seus baldios, fascinado pela perspectiva de os vir a lançar no comércio jurídico, onde os grandes interesses económicos continuam a acenar com chorudas negociatas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não terá a cumplicidade do Partido Socialista. Por isso, vamos votar contra o projecto de lei em defesa das comunidades locais, num debate que, certamente, não vai, outra vez, ter a última palavra nesta Assembleia.

Aplausos do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Maçãs.

O Sr. João Maçãs (PSD): - Sr. Deputado Oliveira e Silva, ouvi-o com atenção e quero manifestar a maior