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672 I SÉRIE - NÚMERO 20

existe para que os terrenos chamados baldios devam integrar-se no domínio público da autarquia em que se localizam e exceptuados os casos dos terrenos com aptidão e uso florestal, explorados em comum pelos moradores ou vizinhos desse terreno, independentemente da circunscrição administrativa em que se inserem.
Nestes casos, deve ser mantido o regime estabelecido em 1976, ainda que actualizado, e, nomeadamente, introduzindo-se regras que assegurem a anulação dos actos de ocupação que claramente contrariem a lei.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD, através da presente iniciativa legislativa, pretende contornar os escolhos levantados pelo acórdão do Tribunal Constitucional. Parece-nos, contudo, que «é pior a emenda que o soneto». As disposições constitucionais impedem a solução preconizada na tentativa anterior. De forma inadequada, envolve-se a figura do governador civil numa função inspectiva e tutelar, o que se nos afigura indevido, excessivo e inconveniente. Sabemos bem das características sócio-culturais dos compartes dos baldios que ainda subsistem, que entenderiam mal esta incumbência de características quase policiescas.
Para ultrapassar o impasse criado, que reclama uma solução ajustada aos tempos que correm e que respeite o peso relevante do direito consuetudinário e no decurso de soluções próximas que advogámos em anteriores debates, somos sensíveis à proposta contida no parecer elaborado pelo Sr. Deputado Almeida Santos e apresentada na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Preconiza-se, no citado documento, a possibilidade de a assembleia de compartes poder, por maioria, a quantificar, autorizar o conselho directivo a delegar, no todo ou em parte, na junta de freguesia em cuja área o baldio se integre, com ou sem prazo de duração, os seus poderes de administração. A solução proposta parece-nos perfeitamente aceitável, já que tal acto de delegação poderá ser a todo o tempo livremente revogável. Contemplar-se-ia, assim, a vontade expressa das populações usufrutuárias dos baldios, conjugada com a actividade de órgãos legítima e democraticamente eleitos, evitando-se os conflitos de poderes, ou mesmo a permanência, sempre deletéria de poderes e contrapoderes em constante disputa, que seriam sempre prejudiciais às comunidades locais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como prevalece sempre a vontade do PSD em manter o diploma nos exactos termos em que foi apresentado, apesar da achega seria e consequente do relator do parecer, teremos de votar contra, pois julgamos que se encontra ferido de inconstitucionalidade nesse como em outros aspectos e, pior do que isso, será fonte de confrontos inevitáveis e indesejáveis entre membros da comunidade, que certamente desejam que o poder instituído não seja fonte de divisões, mas que apresente soluções que devolvam definitivamente a paz num domínio tão sensível como o do usufruto da terra.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs Deputados: Apesar do pouco tempo de que disponho, não resisto à tentação de citar história, um pouco recuada, da «plena guerra dos baldios» que se desenvolvia no
século XVIII, desencadeada por um alvará - o projecto de lei do PSD fez-me lembrar constantemente esse alvará - que permitia aos municípios a alienação dos baldios, através de autorização do Desembargo do Paço, Aqui, o Desembargo do Paço é o Conselho de Ministros.
Vila Nova Portugal escrevia, relativamente a essas alienações ou aforamentos: «E contudo as impugnações dos moradores eram justas; sempre o fundo de semelhantes impugnações não é a cultura das terras, é não serem eles os cultivadores e convenciam certamente... Quem requeria os aforamentos eram pessoas poderosas e ricas que queriam grandes porções, Justamente, pois, eles, os compartes, impugnaram e justamente se lhes não deram aos outros.»
Como estamos hoje perante mais uma reedição de sucessivas tentativas de esbulho dos baldios, aquelas palavras, distanciadas de nós cerca de dois séculos, continuam a manter uma actualidade pujante, tal como são actuais as lutas dos povos contra o esbulho, cujo maior ou menor sucesso deixou as marcas, em avanços e recuos, nos variados diplomas que através dos tempos regularam os baldios.
Não cabe nesta intervenção fazer uma análise histórica da evolução dos baldios ou mesmo encará-los do ponto de vista da Etnologia, embora tal análise seja importante para compreender que, hoje, estamos a debater um projecto que afronta uma realidade viva e bem arreigada no Centro e no Norte do País.
Em poucos meses, após o 25 de Abril, realizaram-se 600 assembleias de compartes. E essa realidade não pode deixar de dotar de um som estranho uma afirmação feita no preâmbulo do projecto de lei. Com algum despudor, afirma o PSD: «Não podem os baldios passar ao lado da organização do Estado democrático.»
Desconhecíamos que era próprio da organização democrática fazer depender da aprovação do governador civil, por exemplo (e só para dar um exemplo), a eleição dos membros do conselho directivo feita pela assembleia dos compartes.
A homologação de direcções é figura de que todos nós nos lembramos, definitivamente afastada do nosso ordenamento jurídico-constitucional.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O projecto de lei afasta-se, de facto, de uma ponta à outra dos princípios do Estado de direito democrático c está viciado de diversas inconstitucionalidades, que sumariamente se indicam.
A Constituição da República, no seu artigo 82.°, estabelece como um sector de propriedade dos meios de produção o sector cooperativo e social. E este tem um subsector constituído pelos meios de produção comunitários, possuídos e geridos por comunidades locais.
Assim, a Constituição diz que pertence a estas comunidades a propriedade (a titularidade) dos baldios e a sua posse e gestão.
Assim sendo, é inconstitucional fazer depender da aprovação dos governadores civis quaisquer deliberações das assembleias de compartes. Elas detêm a propriedade, o uso e fruição dos baldios, pelo que são soberanas para decidir quanto à utilização dos baldios, à alienação dos terrenos, à utilização das receitas, às pessoas que devem integrar o conselho directivo.
E aqui cabe meter um parêntesis para dizer ao Sr. Deputado que levantou a questão que gostaria de, relativamente