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956 I SÉRIE-NÚMERO 28

muitas figuras e grande número de cidadãos que perfilham este ideal político.
A conturbada situação vivida nos primeiros anos do regime democrático agudizou de forma dramática as relações interpartidárias e mesmo interpessoais. Pena é que algumas sequelas desse período subsistam, ainda com todos os inconvenientes daí resultantes. Tal clima de instabilidade, de golpes anunciados quase diariamente, reclamava uma eficaz capacidade de resposta, nem sempre ponderada e reflectida.
Portugal deve a alguns portugueses, entre os quais se conta Francisco Sá Carneiro, a manutenção da liberdade readquirida. A forma contundente e firme como agiu neste período dramático reafirmou o seu carácter empenhado e decidido num combate há muito iniciado. A sua pertinácia, próxima muitas vezes da obstinação, aumentou o número dos seus adversários e criou mesmo inimigos, muitos deles no seio do seu próprio partido.
É saudável a divergência aberta e leal entre ideários ou estratégias diferentes quando assumidas frontalmente no cenário próprio. Contudo, muitos dos seus contestatários, possuídos de virulência desmedida e inadequada noutros tempos, ao sentirem hoje a inversão do rumo previsto, fazem confissões de fidelidade total e permanente, reclamando, despudoradameme, a herança do seu ideário e da sua acção política.
Sá Carneiro lutava pela separação das águas e pela clarificação de posições. Por isso lutou sempre contra um bloco central ou um projecto de poder partilhado entre os dois maiores partidos.
Hoje, por razões mais de estratégia partidária do que de interesse nacional, faz-se renascer, pelo menos episodicamente, uma postura política que, de todo, ele não perfilhava. E, curiosamente, muitos dos seus defensores assumem-se como herdeiros autênticos do seu pensamento.
Divergindo em alguns domínios da sua política, consideramos, todavia, que a sua independência cívica e a sua coragem não se compadeceriam com tais entorses.
Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Membros do Governo, Srs. Convidados e Srs. Deputados: A firmeza das suas opções, muitas vezes discutíveis, marcaram um período da nossa vida política.
O seu carácter determinado, deixando pelo caminho espíritos mais reticentes e titubeamos, conduziu a soluções discutíveis, mas quase sempre vitoriosas e benéficas para o País.
O seu inquestionável patriotismo, assumido através de estratégias e apostas arrojadas, puseram fim a um ciclo na vida nacional, abrindo perspectivas claras de progresso e desenvolvimento.
Sem cairmos em juízos maximalistas, de duvidoso discernimento, afirmamos, contudo, que Sá Carneiro pertence, indiscutivelmente, ao número dos que, como dizia Camões, «da lei da morte se vão libertando».
É esta homenagem que, em nome do PRD, faço a Francisco Sá Carneiro na evocação do aniversário da sua morte, rendendo à sua memória o respeito devido aos homens de uma só fé e de um só parecer.

Aplausos do PRD, do PSD, do PS, do CDS e do deputado independente Carlos Macedo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Constitucional, Altas Autoridades, Ex.ª Família de Francisco Sá Carneiro, Srs. Deputados: O Plenário da Assembleia da República foi convocado para hoje, dia 19 de Dezembro, com o fim de, na ocasião do 10.º aniversário da sua morte, concretizar a evocação da memória de Francisco Sá Carneiro, falecido quando era Primeiro-Ministro do Governo de Portugal.
Cumpre, no início desta intervenção, apresentar à família de Francisco Sá Carneiro, como o fizemos aqui em 1980, os sentimentos do Grupo Parlamentar do PCP de respeito pela dor que a atingiu há 10 anos e que é hoje renovada. E à bancada do PSD, partido de que Francisco Sá Carneiro foi fundador e presidente, a expressão do respeito do Grupo Parlamentar do PCP pelo sentimento que a atinge.
Srs. Deputados, a evocação que aqui hoje realizamos não pode ser feita com a neutralidade do historiador. Muitos dos que aqui se sentam hoje em lugares cimeiros exerceram a função política com Sá Carneiro e contra ele. A morte interrompeu, de forma repentina e brutal, a acção concreta de Sá Carneiro na nossa história recente. Mas esta continuou, nestes 10 anos, a mesma época histórica, a mesma história recente que hoje fazemos.
Não cairemos na tentação de iludir essa questão central, que percorre esta evocação. Assumiremos com clareza que fomos oposição combativa ao ideário político de Francisco Sá Carneiro e ao Governo de que foi Primeiro-Ministro. Mais: que continuamos, hoje, a ser oposição a um núcleo largo das suas ideias e da sua prática política, que permanecem, e, nalguns casos, se agravaram, na sociedade portuguesa.
Assumindo-o sem ambiguidades, podemos e queremos intervir nesta reunião plenária com a sobriedade que exige o acto de Estado que aqui realizamos.
Não vamos reinventar a história, nem reconstruir um pensamento político à medida das necessidades de hoje, nem fazer a catalogação dos fiéis e dos infiéis.
Este acto de Estado, para revestir, do nosso ponto de vista, a dignidade de que deve ser revestido, não se pode tornar na intervenção pública do presente e sobre o presente, seja qual for o título ou a legitimidade que se invoque para isso.
Srs. Deputados, em 1973, numa entrevista que concedeu já depois de ter renunciado ao mandato de deputado à Assembleia Nacional, Francisco Sá Carneiro comentava assim a sua entrada na vida política, verificada quatro anos antes: «Eu não me reconhecia qualidades de político [...]; não tinha tão-pouco gosto pela acção política.»
Francisco Sá Carneiro como que reconhecia assim, em 1973, quanto se tinha mal avaliado. O gosto pela política, as qualidades de político são as apreciações de Sá Carneiro que mais unem todos, amigos e inimigos, seguidores e adversários.
Nesse ano de 1973 claudicava o sonho de Sá Carneiro de transformar por dentro o regime ditatorial.
O balanço que faz desse tempo, numa outra entrevista, é particularmente frustrante. «Todas as reformas legislativas» - diz nessa entrevista - «foram sistematicamente recusadas, sem que tivesse sequer a possibilidade de discuti-las.» E descreve-as: «Isto foi o que sucedeu com a reforma da Constituição, a liberdade de imprensa, a liberdade de associação, a liberdade de reunião, os funcionários civis, as modificações do Código Civil (divórcio e separação de pessoas e bens), a organização judicial e a amnistia