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958 I SÉRIE -NÚMERO 28

eis o que faz de Sá Carneiro o titular indiscutível de um método político e o que o diferencia positivamente na história política do Portugal contemporâneo.
Invocamos, em terceiro lugar, o homem do Porto e o cidadão da Europa.
O homem do Porto, porque indiscutivelmente as traves mestras da intervenção pública de Sá Carneiro estão fortemente relacionadas com a idiossincrasia da sua terra de origem, liberal e social na sua tradição, individualista e solidária, «capital do trabalho», como gostam de lhe chamar os Portuenses (para quem o Porto é e continuará a ser, antes do mais, uma verdadeira «nação» no todo nacional), mas igualmente terra da festa, da alegria e do São João.
O cidadão da Europa, porque essa foi, também para Sá Carneiro, a grande meta da evolução de Portugal. Ao travar a batalha da liberalização no anterior regime, ao pugnar pela estabilização da revolução, ao empenhar-se na criação de condições básicas de governabilidade e ao preconizar alterações institucionais de vulto, detecta-se em Francisco de Sá Carneiro o fio condutor da ideia modernizadora, da ideia reformista, da ideia europeia para a sociedade portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Compreendemos os motivos que levam os Portugueses a não ficarem indiferentes à recordação emocionadamente vivida de Francisco de Sá Carneiro. Qualquer que seja o posicionamento perante a sua trajectória. Ficará para sempre gravada na memória colectiva a tonalidade lendária que um misto de paixão e morte sempre confere às figuras ímpares, marcando o perfil das grandes almas.

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Muito bem!

O Orador: - Homem de rupturas - com a ambiência política do seu meio, com o autoritarismo anacrónico do anterior regime e com os excessos da revolução, com adversários e correlegionários políticos -, Francisco de Sá Carneiro foi igualmente paladino de uma grande e generosa construção: a construção da moderna democracia portuguesa. Que desta homenagem nacional, vivida na tolerância e na compreensão recíprocas, possa, por isso, sair reafirmado o empenhamento do Parlamento português e das instituições nesse supremo objectivo de todos.

Aplausos do PS, do PSD, do PCP, do PRD, do CDS e dos deputados independentes Carlos Macedo, Helena Roseta, José Magalhães e Raul Castro.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Sr. Presidente do Tribunal Constitucional, Sr. Procurador-Geral da República, Srs. Ministros e Secretários de Estado, Sr. Provedor de Justiça, Exmas. Autoridades Civis e Militares, Srs. Familiares de Francisco Sá Carneiro, Sr.ªs e Srs. Deputados: É sempre difícil falar de Francisco Sá Carneiro. A amizade que, durante anos e até à sua morte, lhe dediquei e sempre vi retribuída faz com que, para mim, ainda seja mais difícil falar sobre ele.
E que, por isso, tenho receio de não ser isento, tenho o justo medo de me deixar conduzir por essa saudosa amizade, o que, pelo menos hoje e aqui, não quereria que acontecesse.
Francisco Sá Carneiro foi demasiado grande para que a sua pessoa, o seu pensamento político e a sua obra possam conter-se num simples discurso, ainda que grande e bem elaborado ele fosse, o que manifestamente não é o caso.
Deixarei, pois, apenas alguns apontamentos dispersos sobre um grande amigo, um grande homem, um dos mais insignes homens de Estado que conheci até hoje.
Encontrei Francisco Sá Carneiro no início da sua vida política. Como costuma dizer-se, vi-o nascer para a vida pública e nela crescer até ao topo.
Pertencentes a gerações diferentes, com origens diferentes também nos nossos iguais posicionamentos contra a ditadura, nem por isso deixámos de ter em comum muitas e muitas coisas: o nosso amor pela Uberdade, pela democracia, pela social-democracia, pela solidariedade entre os homens, pela justiça social e pelo humanismo.
Nem sempre estivemos de acordo em tudo, mas sempre nos respeitámos reciprocamente. Francisco Sá Carneiro era assim: respeitava para poder exigir ser respeitado. Não gostava que todos estivessem sempre de acordo com ele. Com frequência, demonstrava o seu desprezo por aqueles que, vivendo à sua volta e à sua custa, apenas o louvavam para conseguir ilegítimas benesses.
Pelo contrário, adorava que dele divergissem, para depois, em diálogo construtivo, mostrar as mais das vezes as suas razões. E, quando chegava à conclusão de que a razão não era sua, era ele o primeiro a reconhecê-lo.
Francisco Sá Carneiro adorava o diálogo, a conversa, a discussão. Lutador implacável pelos seus pontos de vista, teimoso até aos limites em que podia sê-lo, gostava doidamente da abordagem séria e pormenorizada dos problemas. Estudava os assuntos, preparava-se sempre para a sua discussão, recusava abordar aquilo que não sabia. Mas, com o mesmo calor e a mesma determinação, recusava também o diálogo logo que percebia que quanto lhe queriam impor não tinha outro objectivo que não fosse o de dilatar a solução desses mesmos problemas ou fazer mera chicana política.
Francisco Sá Carneiro vivia muito depressa e tinha o pressentimento, tantas vezes manifestado, de que a sua vida iria ser curta. O tempo, para ele, era precioso, não o podia gastar em coisas de somenos importância.
Senhor de uma vasta cultura intelectual, político hábil e experiente, sabendo muito bem o que queria e para onde queria ir, conseguiu ser, num tão pouco tempo de vida, um dos políticos mais notáveis e corajosos da história contemporânea portuguesa.
Até os seus adversários políticos sempre o reconheceram como tal. Ainda hoje, com uma frequência que sabe bem verificar, quando a ele se referem, fazem-no sempre com o maior e o mais subido respeito.
Há homens que ultrapassam o partidarismo político transformando-se em verdadeiras figuras nacionais. Francisco Sá Carneiro foi um deles. A sua vida, a sua obra, o seu património, o seu pensamento político constituem hoje um bem nacional.
Ilegítimo é, por isso, que quem nada teve com ele em vida, que quem sem razão tantas vezes o atacou, queira hoje da sua memória servir-se para alicerçar qualquer espécie de qualquer campanha. Actuação ilegítima, reprovável por isso. Ninguém tem o direito de se apropriar do pensamento político de Sá Carneiro que não seja a sua própria família política.

Aplausos do PSD e do deputado independente Carlos Macedo.