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20 DE DEZEMBRO DE 1990 963

dignidade da pessoa humana e a guerra contra a pobreza e a ignorância.
Retomo ainda o discurso de investidura do VI Governo Constitucional: «Como realidades políticas singulares na história da democracia portuguesa, ambos» (Governo e maioria) «se sentem autorizados a sublinhar, antes de mais, a sua inalienável fidelidade aos valores da liberdade, da democracia e da justiça. Princípios éticos da sua criação e da sua acção, neles encontra(mos) [...] o critério para a luta em defesa da dignidade da pessoa humana e de um Portugal renovado, moderno e próspero.
A política do Governo é, por natureza, humanista no projecto, portuguesa na raiz e europeia na vocação [...] interessada no aprofundamento das solidariedades entre os Portugueses.»
Muitos dos ideais por que se bateu Sá Carneiro são hoje realidades da vida portuguesa. Alguns permanecem ainda na ordem do dia: uns à espera de chegar o seu momento, outros em vias de concretização.
Podemos dizer que foi um visionário lúcido. Tinha uma ideia e um projecto para Portugal.
O desaparecimento de Sá Carneiro da vida política portuguesa deixou-nos mais pobres: aos que o acompanhávamos e aos que dele divergiam.
A visão e o estímulo dos autênticos «engenheiros sociais» são enriquecedores para o debate do progresso democrático e para a realização das aspirações profundas do País.
Recordar os filhos ilustres da Nação, de forma responsável, solene e na busca da sua essencialidade, é acto que nos dignifica e que nos chama à terra para o que é fundamental, deixando de lado a pequena política, aproveitamentos, distorções dos factos, quesílias ou o império do efémero - aspectos e comportamentos que Sá Carneiro também detestava.
Termino, minhas senhoras e meus senhores, ainda com palavras suas, ao evocar o amigo e companheiro de luta, e que a Sá Carneiro se aplicam com inteira propriedade: «Já que não podemos usufruir da riqueza da sua companhia, saibamos, pelo menos, aproveitar a lição da sua vida.»

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Por direito próprio, vai usar da palavra Sua Ex.ª o Sr. Presidente da República.
O Sr. Presidente da República (Mário Soares): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Sr. Presidente do Tribunal Constitucional, Exma. Família de Sá Carneiro e demais convidados, Srs. Deputados: Há 10 anos, em circunstâncias muito diversas, tive a honra de pronunciar aqui um discurso de homenagem às três personalidades políticas que, poucos dias antes, haviam falecido na tragédia de Camarate - Francisco Sá Carneiro, Adelino Amaro da Costa e António Patrício Gouveia -, bem como às duas dedicadas senhoras que os acompanharam na morte e aos pilotos que igualmente perderam a vida no desempenho das suas funções profissionais.
A essas palavras marcadas por uma emoção, que a actualidade do triste evento justificava, e por um cunho de inconfundível sinceridade por todos reconhecido, não tenho de acrescentar nada. Passaram 10 anos, recheados de acontecimentos, muitos dos quais completamente inesperados, outros contraditórios, de dificuldades, de tristezas e também de algumas alegrias, e em circunstâncias políticas tão distintas, continuo a perfilhá-las em absoluto, não precisando de lhes retirar uma só vírgula.
Hoje, na homenagem nacional que a Assembleia da República resolveu - e com toda a justiça - prestar a Francisco Sá Carneiro, quero apenas salientar - em primeiro lugar, com a minha presença aqui, como Presidente da República, e, depois, usando a palavra nesta sessão, convite que agradeço e que tanto me honra - o cunho autenticamente nacional desta homenagem de representação portuguesa e que é devida, porque o País na verdade a esperava.
Sá Carneiro, pela força das coisas e, em parte, também pelo peso das circunstâncias que rodearam a sua morte, é hoje uma legenda e uma referência democrática indiscutível. Não só para os seus partidários e apoiantes de sempre, mas também para todo o Portugal democrático de hoje e, naturalmente, para os seus adversários de então, entre os quais me conto, não obstante os pontos de convergência que algumas vezes singularmente nos uniram, para além das inelutáveis rivalidades partidárias.
Como combatente da liberdade, antes e depois do 25 de Abril, como um dos grandes fundadores do regime democrático e pluralista que temos - assente numa ampla convergência pluripartidária quanto ao ordenamento jurídico definidor do regime, mas também em acentuadas divergências quanto às melhores políticas de governo em concreto, expressão natural de conflitos de interesse que hão-de considerar-se normais nas sociedades abertas -, como homem de Estado de ampla visão relativamente ao futuro, Sá Carneiro marcou, com a sua personalidade inconfundível, a sua frontalidade, patriotismo, coragem política e inteireza de carácter, uma época decisiva do nosso percurso democrático, tão repleto de dificuldades vencidas, de contradições felizmente ultrapassadas e de acertos e desacertos, perante as diferentes conjunturas nacionais.
O reconhecimento desta realidade não exclui, como disse, antigas divergências nem pode significar que um adversário assumido, como eu fui, se queira agora reclamar do pensamento de Sá Carneiro ao qual me opus, frontalmente, em alguns momentos históricos determinados, como estará ainda na memória de tantos. Não há na minha atitude de hoje - como na de há 10 anos - qualquer aproveitamento político de uma situação triste que não só me diminuía aos meus olhos, se houvesse, como pareceria naturalmente abusiva aos olhos alheios. Trata-se de um reconhecimento de facto: Sá Carneiro é, indiscutivelmente, um dos próceres do nosso regime democrático que nessa qualidade tem direito, apagadas com a morte as divisões políticas conjunturais, a ombrear com as grandes figuras do liberalismo e da I República, como um dos seus iguais. Foi, além disso, um ilustre e vivíssimo parlamentar com réplica sempre pronta e discursos memoráveis que figuram nos anais desta Casa - estou bem colocado para o afirmar -, o que constitui ainda uma razão suplementar para justificar a homenagem que hoje lhe presta a Assembleia da República - e por seu intermédio todo o país - e para, porventura, o termos na galeria dos bustos dos grandes parlamentares do passado que honram esta Casa.

Aplausos do PSD, do PS, do PRD, do CDS e dos deputados independentes Herculano Pombo e José Magalhães.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A sessão de hoje é consagrada à figura de Sá Carneiro. Seja-me permitida, no entanto, uma referência comovida à memória de Adelino