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1278 I SÉRIE -NÚMERO 39

Não entendemos o porquê de em 16 municípios do Algarve somente seis terem núcleos concelhios do Projecto VIDA e só um tenha um plano de trabalho em execução.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dando eco a um pedido da associação de pais e encarregados de educação da Escola Secundária de Tavira, ao finalizar esta minha intervenção, vou ler alguns excertos do poema de um jovem toxicodependente, que é um grito de angústia e de alerta.

Diz assim:

Vozes no fundo do túnel,
Escuridão total, grades à volta, o inferno.
Arame farpado...
Quero fugir, quero correr, mas não consigo,
As pernas estão presas ao chão.
Calmantes...
O céu parece estar mais perto,
A noite brilha mais que o sol...
Subterfúgios, o suicídio ou a morte lenta,
A marginalidade, o ódio...
A integridade, a amizade...
Que opção? Qual a situação?
A escolha entre a agulha e a liberdade...
Porque não os dois? Impossível!
Vozes no fundo do túnel.

Este é o poema escrito pelo Lúcio Ferreira. Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.

O Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos últimos seis anos fecharam 16 jornais. O vendaval que atinge o sector da comunicação social não tem precedentes no País.
O Diário acabou em Junho; o Diário de Lisboa em Dezembro; o Diário Popular, irreconhecível, agoniza; o Primeiro de Janeiro parece ter os dias contados.
O Governo português contempla a devastação e conclui que tudo vai bem. O Executivo actua em função de um objectivo que se tornou obsessivo: privatizar todos os jornais que haviam sido estatizados após o 25 de Abril. Falta apenas um, o Diário de Notícias, precisamente o mais tradicional, prestigiado e influente dos órgãos da imprensa diária portuguesa. O seu destino já foi, porém, traçado: o leilão em quatro fases tem o início marcado para o próximo dia 15.
Srs. Deputados, um jornal que merece o respeito dos seus leitores não deve ser tratado como mercadoria Os jornalistas que o criaram e produzem imprimem-lhe, no rolar das semanas, dos meses, dos anos, uma personalidade diferenciada, inconfundível, que faz dele um ser animado de vida própria. A relação que se estabelece é complexa, íntima. Ele ajuda a ver e compreender o mundo envolvente. É como se pensasse, tivesse alegrias e dores, como se fora humano.
A resolução do Conselho de Ministros que estabeleceu as regras da alienação do capital social deixa transparecer, sobretudo, a preocupação do Governo em esconder o desfecho que preparou e deseja para a operação.
A primeira oferta de acções foi, segundo o Executivo, concebida para acautelar os interesses dos trabalhadores do Diário de Notícias. Cabe perguntar: terão mesmo sido os trabalhadores que ficaram na posse de 200 000 acções? Todos sabemos que não!
A segunda oferta pública é igualmente enganadora: pretende convencer-se o País de que 25% do capital poderá ficar nas mãos de cooperativas de jornalistas e de profissionais da comunicação social. Trata-se de uma encenação.
Repete o Governo que a comissão de trabalhadores foi ouvida. Conseguiu gastar 1300 palavras numa resolução que não pode ocultar a evidência: o grande diário cairá dentro de semanas sob o controlo de um poderoso grupo económico. Dissipada a espuma e a música das quatro fases, o País será confrontado com a realidade. O Diário de Notícias vai ser tratado como se fora uma fábrica ou um banco. O Executivo identifica nos seus jornalistas uma força de trabalho cuja sorte acompanhará mecanicamente a do bem material leiloado.
Ao agir assim, o Governo demonstra não compreender o papel do jornalista na sociedade contemporânea. Não se apercebe de que o jornalista, pela sua função social, é hoje chamado com frequência a actuar como historiador e sociólogo do quotidiano. As notícias, análises, reportagens, comentários que redige, neste final de século, tornaram-se inseparáveis não somente da compreensão da vida como do bom funcionamento e estabilidade das sociedades organizadas. E contudo, Srs. Deputados, o Governo, através da política que vem a realizar, não dá mostras de tomar consciência do significado social da profissão de jornalista. Os repetidos alertas lançados pelo Sindicato dos Jornalistas expressam uma realidade que não pode ser negada: a falta de respeito pelos direitos dos trabalhadores da imprensa tornou-se rotineira.
Somente no Porto, mais de 300 jornalistas perderam em 1990 os seus postos de trabalho no Primeiro de Janeiro e no Comércio do Porto.
No caso específico da privatização do Jornal de Notícias, o processo foi conduzido como se os jornalistas fossem simples robots.
Srs. Deputados, é uma evidência que as novas tecnologias tiveram um efeito revolucionário no desenvolvimento da imprensa. Mas as novas tecnologias, sendo necessárias, não são neutras. Os grandes jornais, para serem viáveis, exigem hoje investimentos colossais. Daí uma contradição crescente entre a sua desejável independência e o domínio cada vez mais acentuado que poderosos grupos monopolistas exercem sobre o sector da comunicação social.

Pergunto: que margem de independência podem ter os media das cadeias de Murdoch, Hersant, Springer, Berlusconi, Mondadorí?
A resposta tem sido dada pelos jornalistas em reuniões internacionais, onde denunciam os perigos do avanço galopante da imprensa mercenária numa época em que os próprios satélites artificiais que difundem fluxos de informação são financiados por esses grupos, funcionando como instrumentos de uma engrenagem trituradora.
Segundo o semanário O Jornal, um empresário do Norte, o Sr. Amorim, levou a sua sobranceria ao ponto de afirmar que se comprasse o Janeiro, seria para o vender logo a seguir. Entre os interessados, de acordo com a mesma fonte, estariam o multimilionário italiano Benedetti e o diário madrileno El País.
O desabafo de Amorim é revelador de uma mentalidade. Aos olhos de quem assim se exprime, um diário tradicional como o Janeiro aparece como se fora uma quinta ou o pacote de acções de uma empresa distante e desconhecida.