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21 DE JUNHO DE 1991 3285

Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Pela primeira vez, vai esta Assembleia da República apreciar a Conta Geral do Estado. Melhor dito, iremos, hoje, apreciar 13 Contas Gerais do Estado!
Este simples facto dá ideia da anormalidade que tem reinado neste aspecto concreto dos poderes e deveres de fiscalização da actividade governativa pela Assembleia da República.
Anormalidade que, diga-se em abono da verdade, a todos responsabiliza: aos governos, que, durante muitos anos, suportaram enormes atrasos na elaboração da Conta; ao Tribunal de Contas, que, por carência de meios adequados, durante bastante tempo, foi prolongando o atraso, com a tardia emissão dos respectivos pareceres; à Assembleia da República, quê, mesmo após a recepção dos pareceres do Tribunal, nunca chegou a apreciar qualquer conta, pese embora os trabalhos efectuados em 1987 por uma subcomissão eventual, que não teve oportunidade temporal para concluí-los.
Proceder, de uma só vez, à apreciação de 13 Contas Gerais do Estado significa que este acto de fiscalização do Parlamento não vai revestir a profundidade que, em si mesmo, seria exigível. Desde logo, pela dificuldade material de fazê-lo, mas também, e fundamentalmente, porque, compelindo à Assembleia da República a apreciação política da Conta (já que a respectiva apreciação jurisdicional pertence ao Tribunal de Contas), tem hoje pouco efeito útil proceder a uma exaustiva apreciação política da actividade financeira desenvolvida pelo governo socialista de 1976, pelo governo PS/CDS de 1978 ou pelo governo do Prof. Mota Pinto.
Justifica-se, no entanto, que, sucintamente, se elenquem alguns dos traços gerais e comuns à forma como durante muitos anos foi exercida, por governos diversos, a actividade financeira do Estado.
Em primeiro lugar, as diferenças enormes que, de um modo geral, se verificam entre os valores orçamentados e os utilizados mostram, julgo que de forma inequívoca, que a regra na elaboração dos orçamentos foi a de apresentar um défice politicamente defensável pelos governos no respectivo debate parlamentar, sem grandes preocupações com a aderência das verbas orçamentadas à evolução previsível das grandezas económicas para o efeito relevantes.
Em segundo lugar, a utilização generalizada de circuitos paralelos na actividade financeira do Estado, assim se reduzindo, de forma artificial, os défices orçamentais, mas não os défices do Estado. De realçar, neste âmbito: a multiplicação que se verificou na criação de fundos e serviços autónomos e no empolamento dos seus orçamentos próprios, que, além do mais, durante muitos anos, fugiram ao debate orçamental na Assembleia da República e a uma efectiva fiscalização; o abusivo e ilegal recurso às operações de tesouraria, realizando despesas efectivamente orçamentais, no valor acumulado de centenas de milhões de contos, sem qualquer controlo orçamental; a acumulação de «atrasados» às empresas públicas, que chegaram a ultrapassar os 400 milhões de contos, em consequência da realização de despesas não orçamentadas ou que excediam os limites orçamentais.
Em suma, bem pode dizer-se que as Contas em apreciação, na sua generalidade, mostram a repetida prática de distorção dos orçamentos e das contas, a ausência de transparência na actividade financeira do Estado e a manifesta indisciplina financeira, que durante anos reinou, fundamentalmente decorrente da vontade objectiva de todos os governos.
Por isso, aqui deixamos registada esta apreciação política de crítica e de censura a todos os governos que exerceram funções até ao final de 1985.
Encontram-se, igualmente, em apreciação as Contas Gerais do Estado relativas aos exercícios de 1986 a 1988, da responsabilidade do actual Governo e seu antecessor.
Grande foi a campanha dos governos de Cavaco Silva contra a indisciplina financeira reinante e a favor da moralização das contas públicas. Não nos custa reconhecer que bastante foi feito nesse sentido, desde a regularização dos «atrasados» à contenção dos fundos autónomos, passando pela atribuição ao Tribunal de Contas de condições mínimas (que não adequadas) para o exercício atempado e eficaz das suas atribuições.
Mas ú actual Governo não está isento de muitos dos pecados cometidos pelos que o antecederam no âmbito da actividade financeira do Estado. Vejamos, nomeadamente, o que diz o Tribunal de Contas sobre a Conta de 1988 e que é extensivo, na sua totalidade, às Contas de 1986 e 1987:

Afectação, sem justificação, de 600 000 contos da dotação provisional ao reforço de uma dotação destinada a subsídios. De facto, tal reforço apenas veio a ser utilizado, e só em parte, no final de 1989, pondo em causa [...] um dos requisitos do recurso àquela dotação provisional [...].
Não apresentação peio Governo à Assembleia da República, para aprovação, de novos mapas, face à declaração de inconstitucionalidade da dotação concorrencial e a consequente necessidade de serem definidos outros montantes, por forma a obter-se de novo o equilíbrio orçamental [...].
Não cumprimento do artigo lei do decreto-Lei n.º 27 223, de 21 de Novembro de 1936, que determina a apresentação do balanço entre os valores activos e passivos do Estado, que mais uma vez se encontra em falta [...].
Não contabilização de toda a receita na Conta Geral do Estado, por a receita respeitante aos consulados continuar a não corresponder à efectivamente cobrada no ano por estes cofres públicos, mas apenas à incluída nas contas consulares de anos anteriores certificadas pela Delegação da Direcção-Geral da Contabilidade Pública, adulterando-se, desse modo, a receita do Estado [...].
Não inclusão, em despesa orçamental do Ministério dos Negócios Estrangeiros, de 92- milhões de contos de «Despesas a liquidar» por regularizar, • realçadas de forma abusiva no âmbito do artigo 647.º do Regulamento Consular, violando os princípios e regras orçamentais contidos na Lei n.º 40/83, de 13 de Dezembro [...].
Interpretação abusiva do disposto no artigo 58.º da Lei n.º 114/88, de 30 de Dezembro, ao serem processados por conta do Orçamento e depositados em operações de tesouraria saldos de dotações orçamentais que, de acordo com as normas da Contabilidade Pública, não estavam em condições de podarem ser utilizados na «liquidação das respectivas despesas», porquanto não existia, à data, resolução do Conselho de Ministros a autorizar a realização daquelas despesas [...].