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6 DE JANEIRO DE 1993 929

A linha seguida pelo Ministro, para tentar explicar o rotundo fracasso do Governo no campo da habitação, foi a linha obsessiva do passa-culpas para o poder local. O Ministro - é preciso dizê-lo com clareza! - faltou à verdade. Atirou responsabilidades para as câmaras, quando ele sabe perfeitamente que são do seu Ministério. Acusou as autarquias de atrasos, que são provocados pela legislação que o seu próprio Ministério e ele mesmo propõem e fazem aprovar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O espectáculo foi, repito-o, degradante e penoso. O Ministro foi apanhado em falta, meteu os pés pelas mãos, gaguejou, deu o dito por não dito, e só se animava quando pensava que podia passar a bola às autarquias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: há a Constituição, a lei, o orçamento, há todos os instrumentos de política que apontam para as responsabilidades nesta área do Governo e da administração central. E há também princípios exigíveis, como os da seriedade, os do conhecimento dos dossiers e os do sentido das responsabilidades, que se tem de exigir a qualquer alto dignitário da Administração, particularmente quando se trata de um membro do Governo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quando um Ministro não assume as suas responsabilidades mostra uma profunda ignorância dos dossiers e permite-se faltar despudoradamente à verdade, atirando para cima de outros as suas próprias culpas. Afinal, que noção tem da função pública e da função política? Um jogo? Um faz de conta para enganar papalvos?
Não é isso falta de perspectiva ético-cultural, falta de sentido da dignidade do serviço público?
Mas o que mais grave releva deste comportamento do Ministro da habitação, como das afirmações do Primeiro-Ministro e de outros membros do Governo, é a falta de perspectiva sobre o que é o poder local e sobre o seu insubstituível papel na estrutura democrática do Estado. O Governo pratica uma perspectiva centralista e avessa à descentralização dos poderes do Estado, contrariando expressamente o que a Constituição impõe.
Este comportamento, como outros, de afrontamento à Constituição na área modal da estrutura e regras do Estado democrático e dos direitos fundamentais provam que, ao contrário do que propagandeia o Primeiro-Ministro, em Portugal existe efectivamente um problema de defesa do Estado democrático, um problema de liberdades, ameaçados por perversões de vária ordem, que configuram no seu conjunto a intenção de instauração de um regime centralista, governamentalizado, autoritário, de partido dominante e confundido com o próprio aparelho de Estado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - As ameaças que o Primeiro-Ministro faz ao poder local são uma afronta ao regime tal como ele está instituído e tal como emerge do 25 de Abril e dos seus ideais transformadores. São uma ameaça à democracia política tal como está desenhada na Constituição.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - São uma ameaça ao mesmo nível da ameaça que o mesmo Primeiro-Ministro fez aos partidos da oposição que não subscrevem as suas teses sobre a construção europeia e sobre o Tratado de Maastricht, querendo excluir esses partidos políticos, nesta Assembleia, do debate desta ou daquela matéria política.
Quem faz afirmações deste jaez é que demonstra, sem qualquer pudor, que quer violar as regras da democracia política e do regime democrático-constitucional.
Parece que há quem não tenha ainda percebido isto. Os sucessivos casamentos do PS com o PSD para a revisão constitucional e para a aprovação do Tratado de Maastricht levaram alguns à tentativa de explicar o bloco central como um bloco de regime. Há quem assuma como missão teorizar assim, mesmo sentando-se na bancada do PS.
Para não lhe chamar outra coisa, fico-me por lhe chamar «missão suicida» - pelo menos, para o PS.
Bloco de regime com um Governo e uma direcção partidária que militam no estrangulamento de direitos fundamentais dos trabalhadores, como o direito de greve? Um Governo e uma direcção partidária que visam a adulteração das regras de proporcionalidade eleitoral, que praticam o hegemonismo do PSD no aparelho de Estado, que não hesitam em utilizar os Serviços de Informações para vigiar opositores sociais, sejam estudantes, agricultores, sindicalistas, imigrantes ou quaisquer trabalhadores?
Um Governo e uma direcção partidária que não hesitam em desvalorizar datas históricas como o 25 de Abril, mostrando não compreender o seu significado, incluindo quanto à caracterização do regime democrático e à defesa e afirmação das liberdades?
Um Governo e uma direcção partidária que não hesitam em afrontar os poderes autónomos do Estado, como o Tribunal de Contas ou a Procuradoria-Geral da República, ou o Provedor de Justiça, só porque não obedecem às directivas governamentais, e por isso, porque exercem as suas próprias competências, são apodadas de «forças de bloqueio»?
E isto que esses teóricos do «Arco de Maastricht» têm de explicar, isto é, se é com esta postura do PSD que assumem um pacto de regime, um pacto contra a democracia política, como hoje está consagrada, contra a estrutura democrática do Estado, como hoje resulta da Constituição e dos mecanismos de representação e participação democrática que aí têm acolhimento.
Da nossa parte, PCP, rejeitamos a tese, como rejeitamos práticas de cumplicidade ou benevolência em relação a qualquer postura antidemocrática, autoritária ou centralista.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Interviremos em todas as questões nacionais ou internacionais, queira ou não o Sr. Primeiro-Ministro. Falaremos de fundos estruturais, participaremos no processo fora daqui, nas autarquias locais e também na Assembleia da República, com propostas concretas, correspondentes à nossa própria visão dos interesses nacionais e dos interesses do povo português.
E para os que não reparam ainda nos perigos que a política do Governo vem criando à democracia, veja-se o estado da sociedade portuguesa - há claros sinais de crise e doença -, veja-se a proliferação dos grupelhos nazis que actuam nos estádios de futebol, com total e estranha impunidade, fomentados por sinais de xenofobia, que, por exemplo, transparecem na anunciada proposta governamen-