1002 I SÉRIE - NÚMERO 28
De há meia dúzia de anos para cá, as políticas de saúde têm conhecido problemas novos, os quais têm motivado reformas profundas e inevitáveis em diversos sistemas nacionais, um pouco por todo o mundo.
O envelhecimento da população, a quebra das taxas de mortalidade, o desenvolvimento das políticas de saúde preventiva, com maior número de actos médicos por cidadão, e a evolução tecnológica na área dos medicamentos e dos meios de diagnóstico justificam profunda reflexão e novas decisões políticas.
A OCDE tem promovido estudos comparados sobre os sistemas de saúde, procurando encontrar elementos de análise na evolução das respectivas políticas, tal como a Organização Mundial de Saúde e as Comunidades Europeias. De um modo geral, todos se preocupam com o assustador crescimento das despesas públicas para acudir aos fornecedores, à indústria farmacêutica, a exames com novas técnicas laboratoriais e de imagens computorizadas (TAC, ressonâncias magnéticas, etc...) e a problemas novos, como o SIDA e os toxicodependentes, entre outros.
Hoje em dia, com a facilidade de divulgação dos conhecimentos e técnicas novas, os técnicos de saúde de qualquer país querem, obviamente, por razões éticas e deontológicas, tratar os cidadãos e os pacientes de acordo com o «estado da arte» e não apenas, digamos assim, com a forma possível na ocasião. Querem sempre ter o melhor equipamento, as melhores condições e estar na fronteira do conhecimento.
Nos países de recursos menos abundantes esta pressão legítima sobre o Orçamento do Estado é a mais angustiante. Todos queremos, com razão, ser tratados bem, depressa e com a melhor tecnologia conhecida.
Importa aqui que se reflicta também sobre os valores da justiça social, da equidade e da solidariedade, pilares fundamentais das políticas de saúde.
Curiosamente, as respostas aos problemas que se colocam as políticas de saúde não são muito diferenciadas e específicas entre as diversas famílias políticas e correntes ideológicas, olhando à escala europeia. Assiste-se a mudanças com contornos semelhantes em países com governos e ministérios liderados por partidos socialistas ou por partidos conservadores e democratas-cristãos. É o que se passa em Espanha, em França, na Itália, na Grécia, no Reino Unido ou na Alemanha. Registam-se, no entanto, diferenças de actuação, muitas vezes mais relacionadas com as estruturas específicas da Administração Pública e com a organização histórica dos sistemas de saúde do que apenas com as raízes ideológicas dos políticos responsáveis pelas novas soluções.
Quer os sistemas de saúde, quer os sistemas de segurança social atravessam crises estruturais, tendo em conta as origens das receitas e o equilíbrio na distribuição das despesas. Nesta matéria, as famílias políticas democráticas sabem que a saúde e a segurança social têm de ser geridas em economia de mercado, em concorrência e não em esquemas estatais ou estatizantes fechados.
O sector empresarial da saúde e as alternativas de seguros e pensões são hoje contratos correntes em qualquer lado. Em todo o caso, todos mantêm vivos os princípios da justiça social, da equidade e da solidariedade, embora com divergências no seu modo concreto de aplicação.
Em certa medida, poderá dizer-se que também em Portugal os debates recentes entre as famílias democráticas parecem fazer-se mais por divergências secundárias do que por divergências de fundo. Todos defendem os valores e princípios atrás referidos, pugnando pela existência de um Serviço Nacional de Saúde, mas sem pôr em causa as clínicas privadas, os subsistemas de protecção social, as convenções, os seguros e as instituições privadas de solidariedade social.
As divergências e as contradições parecem advir de quem não sabe se é contra ou a favor de taxas moderadoras, de quem se preocupa com a demissão de uns funcionários mas não tanto com o sistema em si, e de quem, preocupando-se com os pobres, quer sobretudo evitar que os ricos comparticipem nas despesas.
Há que clarificar opções ideológicas e partidárias em matéria de saúde. Para bem e por respeito com os nossos eleitores é preciso que clarifiquemos as nossas opções de política social, designadamente nas áreas da saúde e da segurança social.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Há que ponderar uma fronteira de actuação do Estado, como agente e como árbitro do sistema. Há que reflectir até onde se deve chegar pelo Orçamento do Estado com os impostos sobre os contribuintes. Há que avaliar opções e depois assumir reformas progressivas e graduais que aperfeiçoem os nossos sistemas instituídos.
O PSD, nesta matéria, como noutras, não adormeceu nos corredores do poder e também é agente de reflexão e de mudança.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Consideramos necessária uma reforma dos sistemas de financiamento das políticas de saúde. Para melhor se protegerem as crianças, os idosos e os desfavorecidos é preciso que as famílias com posses paguem parte crescente dos seus cuidados de saúde.
Há que aprofundar a concorrência na prestação de serviços de saúde, com mais intervenção do sector privado, com um Estado mais firme na defesa da qualidade e com mais seguros, mais convenções e mais contratos de gestão empresariais.
Há que encontrar soluções em economia de mercado, alargando a protecção aos socialmente desfavorecidos, fazendo com que os que podem comparticipem na educação e na saúde. De outro modo, não seria justo.
Há que mudar em coerência e no rumo certo, para o que defendemos um reformismo social-democrata. O Estado deverá ser cada vez mais um bom e inteligente coordenador do interesse público e não um exagerado interventor em tudo. Hoje, em matéria de saúde, o Estado é proprietário de quase todas as instalações e equipamentos hospitalares, os médicos são, na sua maioria, funcionários públicos, o Estado é o principal cliente da indústria farmacêutica e paga, pelo Serviço Nacional de Saúde ou pelos seus subsistemas, a quase todos os cidadãos para se tratarem. Teoricamente, já ninguém defenderá este modelo.
Os produtores de toda a riqueza são os cidadãos, mas como a distribuição espontânea da riqueza provoca desigualdades, o Estado deve actuar como factor de correcção e protecção social. Justifica-se assim a criação de um cartão de saúde, o qual deve definir padrões de rendimento, por níveis de IRS, por exemplo, e por consequência taxas de comparticipação nas despesas de saúde. No entanto, a saúde infantil, os idosos, os doentes crónicos e outros deverão ser sempre objecto de um tratamento especial.
Definidas e aplicadas as novas regras do jogo, toma-se assim fácil de compreender uma nova orgânica mais fun-