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1526 I SÉRIE -NÚMERO 43

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, durante a manhã, o Governo solicitou-me, primeiro por via telefónica e depois por carta, o uso da palavra em primeiro lugar, hoje, no período de antes da ordem do dia, uma vez que o membro do Governo que vai usar da palavra tem de deslocar-se ainda esta tarde para fora de Lisboa, em visita de Estado.
O meu despacho foi nesse sentido, pelo que vou dar a palavra ao Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, para uma intervenção.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, essa Dão é a primeira inscrição!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o Governo solicitou-me a intervenção e, segundo o Regimento da Assembleia da República, ele intervém nas condições que por mim forem fixadas. Pela minha parte, fixei estas condições por escrito.

Tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. João Amaral (PCP): -Não é assim! O Sr. Ministro não tem vergonha de intervir nestas condições? Não sabe que primeiro deviam ser os grupos parlamentares? Isto não é a assembleia do Governo!

O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território (Valente de Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo tomou, na semana passada, a decisão de incluir o empreendimento do Alqueva na proposta que está a elaborar do Plano de Desenvolvimento Regional, com vista às negociações que tem de fazer com a Comissão da Comunidade Europeia para definir o novo Quadro Comunitário de Apoio.
Tratando-se de uma obra de grande vulto, que chega a apaixonar defensores e opositores, entendemos como conveniente vir à Assembleia da República justificar - ainda que de forma breve, face à extensão e profundidade dos estudos que foram feitos - a razão de ser da nossa decisão.
Dar água ao Alentejo, é ambição antiga! Sucedeu, até agora, não haver uma visão global do empreendimento ou não haver confiança no sucesso da mudança estrutural que tem de acompanhar a transformação do sequeiro em regadio ou, ainda, pretender-se justificar o empreendimento com base, quase exclusivamente, na sua capacidade para gerar energia, naturalmente por se temer que as práticas agrícolas não se adaptassem ao uso de um factor que as circunstâncias de disponibilidade e exploração tornam caro.
Todavia, já no princípio do século XXII, o padre Manuel Severim de Faria, cónego da Sé de Évora, propunha como medida azada para o Alentejo: «Povoar com aguai»
O Plano de Rega do Alentejo, elaborado nos finais da década de SÓ, previa um sistema de barragens para usos hidroagrícolas com algumas delas dependentes de um grande reservatório a construir no Guadiana. Foram mesmo erguidas algumas que nunca encheram, por não haver recursos hidrológicos locais suficientes: as barragens do Alvito, do Monte da Rocha, do Roxo e de Odivelas estão hoje sobredimensionadas, a contar com a água que para elas e, portanto, para os perímetros de regadio que comandam, há-de ser conduzida a partir da grande represa em que a lógica de todo o sistema assenta.
Após a apreciação do Conselho Superior de Obras Publicas e a atribuição, ern 1973, da concessão do aproveitamento hidráulico do Guadiana à Companhia Portuguesa de Electricidade, foi finalmente decidida, em 1975, a realização do empreendimento do Alqueva, cujas obras preliminares se iniciaram ern 1976. Em 1978 elas foram interrompidas, em virtude de um conjunto de circunstâncias interligadas nos seus efeitos: estava em queda a valia eléctrica do empreendimento, a situação financeira do País era preocupante, a confiança na reconversão agrícola do Alentejo era nula, havia outras preocupações mais urgentes do que a harmonização do desenvolvimento do território e a consideração da água como factor estratégico desse desenvolvimento e da própria viabilidade da vida ainda não se tinha revelado de importância tão crucial e instante como nos nossos dias.
Em Novembro de 1980, foi determinada a retoma das obras e, ern 1985, foi assinado um protocolo entre o Estado e a EDP para esse fim. Não obstante a expressão dessa vontade, as obras mantêm-se interrompidas desde 1979, altura em que ficaram concluídas as ensecadeiras de montante e de jusante, o túnel de desvio das águas do rio, a ponte entre as duas margens e um conjunto de construções de apoio ao estaleiro.
Quando se reacendia a questão, havia sempre alguém que levantava dúvidas acerca da relevância económica e social do projecto, em termos globais, ou sobre aspectos específicos da forma de calcular a valia eléctrica ou o impacte ambiental; outros duvidavam da oportunidade de aplicação de tão vultosos montantes num empreendimento de tão grande dimensão, fazendo relembrar outras realizações de dimensão similar que o tempo e as circunstâncias comprometeram nos seus futuros potenciais; outros queriam medições do caudal sólido no trecho final do Guadiana; outros, ainda, pretendiam uma avaliação rigorosa das consequências da transformação do sequeiro em regadio sobre a população das abetardas, que se sabe em regressão... Quase todos colocavam dúvidas em relação à viabilidade da transformação cultural, à possibilidade de os agricultores actuais se reconverterem à prática de novas culturas e, nos últimos tempos, à justeza da realização de investimentos tendentes a aumentar a capacidade de uso dos solos face à nova política agrícola comum.
Nunca estavam suficientemente avaliadas todas as consequências potenciais do projecto, levantando-se, sistematicamente, dúvidas acerca de novos aspectos do mês* mo ou retomando-se dúvidas antigas que surgiam com outras vestimentas ou com propósitos diferentes.
Não é possível persistir na hesitação, eternamente. Se houver boas razões para abandonar u/n projecto começado, deve desistir-se dele definitivamente, sem deixar prolongar a dúvida e a agonia, alimentando as esperanças e, ao mesmo tempo, iludindo as expectativas.
Foi por isso que, ern 1990, se tomou a decisão de não elaborar mais nenhum estudo parcelar mas, antes, articular todas as análises já feitas num exercício de avaliação global que pudesse fundamentar ou o abandono definitivo do projecto, com pesquisa de outras soluções para alcançar objectivos semelhantes, ou a retoma do empreendimento, acompanhada do lançamento das medidas complementares que hão-de permitir optimizar os resultados da sua realização. Decidiu-se, também, que esse exercício não fosse realizado no seio da Administração, porventura presa a posições anteriormente assumidas.