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28 DE MAIO DE 1993 2435

Diria ainda que, enquanto o projecto de lei do PCP propõe reformas legislativas, que consideramos necessárias em diversas vertentes processuais, o do PS aprofunda, inova, propõe algumas soluções nesta matéria, pelo que fazemos votos para que esse diploma seja aprovado, a fim de podermos dar a nossa contribuição, no debate na especialidade, relativamente a algumas soluções propostas.
Sr. Deputado, gostaria de ouvi-lo relativamente a uma questão já aqui referida e que tem a ver com a dimensão não apenas judicial mas também de procedimento do direito de acção popular. Creio que o projecto de lei do Partido Socialista considera o direito de acção popular como o direito de acção judicial, embora possa ser exercido perante vários tribunais. Quem acompanhou o último debate que há três anos aqui se travou sobre esta matéria sabe que não é essa a leitura que fazemos do n.º 3 do artigo 52.º da Constituição. Entendemos que ele deve ter uma leitura mais ampla e que o direito de acção popular, em consequência disso, deveria ter sido consagrado no Código do Procedimento Administrativo. Apesar da latitude com que se prevê nesse Código a tutela de interesses difusos, creio que não estamos propriamente perante o direito de acção popular, na medida em que esse Código exige que, apesar de tudo, exista uma conexão directa em função de um determinado local de residência, para se poder usar os mecanismos aí previstos para a tutela de interesses difusos, o que não configura propriamente o direito de acção popular.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado Almeida Santos, se não considera que seria útil, independentemente da leitura que se faça quanto à extensão a dar ao n.º 3 do artigo 52.º da Constituição, consagrar um direito de acção popular, em termos gerais, no direito administrativo, não apenas no plano contencioso mas também a nível do procedimento administrativo.
É sobre esta matéria que gostaria que o Sr. Deputado desenvolvesse um pouco mais o seu raciocínio.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr.ª Presidente, meu querido amigo Correia Afonso, agradeço-lhe a questão que me colocou. Estou de acordo consigo quando diz que este direito é velho, vem desde Roma, só que com uma configuração diferente porque correspondia, então, a realidades diferentes.
Refere-me o Sr. Deputado os interesses individuais, colectivos e difusos. Quanto aos individuais e colectivos, estamos entendidos: temos catedráticos para se ocuparem disto; quanto aos difusos, não os temos tido. Na doutrina portuguesa apenas conheço um artigo -aliás, bem escrito- de um assistente de Coimbra, mas que não me ensinou nada de novo, nada que eu não tivesse já lido na doutrina estrangeira por onde andei com muito empenhamento. Sei, no entanto, que a própria CE começa a preocupar-se com a realidade dos interesses difusos, pois começa a encarar a possibilidade de emitir uma directiva sobre esta matéria. Portanto, se não corrermos, daqui a dias, sujeitamo-nos a já não poder correr.
Relativamente à questão concreta que me colocou, esclareço-o que o projecto de lei, de que sou autor, prevê o seguinte: se um ou vários indivíduos decidirem intentar uma acção contra uma fábrica poluente ou para evitar que ela se instale ou para condicionar a sua produção a uma forma não poluente ou para fazer cessar a produção, é publicado um aviso para que todos os indivíduos com idêntico direito e que estejam a padecer de idêntica lesão, se quiserem, venham ao processo constituir-se parte, aceitando-o no estado em que ele se encontre. E a todo o tempo podem fazê-lo. Se não o fizerem, legitimam o mandato implícito que está na base do facto de um só litigar por todos. Portanto, também não se podem queixar. Quer dizer, não só cada um pode dizer: «Não aceito esse indivíduo a representar os meus interesses», e instaura outra acção, e, em vez de um, podem n indivíduos tomar esta atitude, como, ao invés, cala-se e diz: «Pois muito bem, se esse indivíduo já está a tratar disso, que trate e eu fico à espera do resultado.» No fundo, o problema é este, porque sabemos que o caso do indivíduo único que aparece a litigar é, em regra, uma ficção, não vai acontecer. As pessoas concertam-se, juntam-se e dizem: «Vamos intentar uma acção contra o malandro que está a instalar uma fábrica poluente, que vai matar os peixes do nosso rio.» Portanto, já haverá, nessa atitude, uma colectividade de indivíduos, um grupo de indivíduos, ficando, porventura, de fora outros, para os quais virá a notificação. Logo, creio que esse risco está salvaguardado. Se são colectivos, cada um representa os seus interesses e acabou, não se fala mais nisso.
Sr. Deputado António Filipe, quero, em primeiro lugar, agradecer as suas palavras e, em segundo lugar, dizer que há, de facto, uma complementaridade dos dois projectos de lei. Suponho que foi o vosso partido o primeiro - e quero saudá-los por isso - a tomar uma iniciativa deste género sobre esta matéria. O direito de iniciativa, a prioridade da iniciativa, pertence-vos, mas não é verdade que eu encare o direito de acção popular apenas como acção judicial, deixando de fora o foro administrativo.
Sr. Deputado, se verificar o n.º 1 do artigo 5.º do nosso projecto de lei, verá que «o exercício de direito de acção popular nos limites da sua consagração constitucional e legal,» - porque hoje já se encontra consagrado em matérias de direito dos consumidores, defesa do ambiente, etc. - «pode traduzir-se no exercício de qualquer dos direitos de acção» - visto aqui haver um direito de acção popular e, como não diz qual, são, portanto, todos - «previstos na lei civil, penal e administrativa». Por que é que aqui se não prevê, em especial, o foro administrativo? Porque, Sr. Deputado, dei por regulamentado, embora, em meu entender, insuficientemente, este instituto no Código do Procedimento Administrativo. Em meu entender - e o Dr. Rui Machete já o disse -, não chega o que lá está, foi pouco arrojado, pelo que temos de o complementar com mais algum arrojo. Contudo, não se diga que aqui não está previsto o procedimento administrativo.
Penso que, com isto, já respondi à questão que o Sr. Deputado António Filipe me colocou, que, se não me engano, foi apenas uma.
É, portanto, o momento de voltar a agradecer a todos os que me colocaram questões e o contributo dado através delas.
Sendo assim, temos de fazer uma profunda e continuada meditação sobre esta matéria, pois estes projectos de lei são dos que implicam que percamos alguns dias, algumas horas, na 1.ª Comissão, onde voltarei, quando o Sr. Presidente entender necessário. Apesar de tudo, penso que deveríamos aceitar o desafio de produzirmos uma lei de acção popular, que, se não for tão perfeita como desejaríamos - e preparemo-nos para ouvir os defeitos encontrados pelas catedráticos, porque, como já sabemos, isso