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10 DE MARÇO DE 1994 1551

liça global, que permita agir de modo multidisciplinar para a integração harmoniosa dos muitos que entre nós vivem, contribuem para o desenvolvimento do País e não podem continuar à margem da sociedade.
Fazê-lo passa por política de habitação que estabeleça regras de acesso a uma habitação condigna. Passa por uma nova atitude na escola, que favoreça o acompanhamento das crianças filhas de imigrantes, pelo seu envolvimento, pela sua integração social. Passa por uma outra atitude de conhecimento, valorização e promoção das diferentes culturas que entre nós coexistem. Passa por um novo olhar para a diferença e pela compreensão para a riqueza profunda que dessa diversidade advém. Passa pela tolerância e pela não violência, cada vez mais ausentes no nosso quotidiano. Passa por aceitar os imigrantes e as suas associações como parceiros sociais importantes que devem ser. Mas passa, em primeiro lugar, hoje e agora, por não aceitar que, entre nós, imigrantes possam permanecer clandestinos.
O projecto de lei que o Grupo Parlamentar de Os Verdes hoje apresenta corresponde ao compromisso por nós aqui assumido em 20 de Janeiro, aquando da discussão de uma petição sobre esta matéria. É a sequência lógica daquela que tem sido a nossa intervenção nesta área mas, sobretudo, este projecto, aliás, como os outros, não cai do céu antes vem precisamente ao encontro de uma prioridade.
Vem ao encontro de uma prioridade de justiça por que se clama, de uma prioridade das vozes que, de sectores vários da sociedade, reclamam uma nova oportunidade: associações de imigrantes, organizações humanitárias, autarquias, sindicatos, Igrejas e seus altos dignatários.
Aceitá-lo não é condescender com as oposições. Não é hipoteticamente transgredir no quadro espartilhado de uma «Europa-fortaleza» que, aliás, repudiamos. Não é «escancarar portas» a novos estrangeiros. Não é roubar empregos aos portugueses. Aceitá-lo não é violar a desumana lei de imigração que Maastricht nos impõe. Não é ferir tão pouco o tão sagrado espirito de Schengen nem cometer um qualquer sacrilégio que outros não ousaram.
Abrir um novo processo é um acto de elementar justiça. É um imperativo ético, uma prioridade nacional, uma medida profiláctica para atacar uma doença chamada racismo que, inquietante, ganha espaço e adeptos entre nós e que, nos imigrantes, tem um alvo preferencial.
Abrir um novo processo é um acto igual a tantos outros que diversos países, também da União - França, Espanha, Itália-, por diversas vezes tiveram de fazer. Um processo pensado agora de acordo com a experiência já adquirida, que equacione as deficiências anteriores e que tente ultrapassá-las, tal como o nosso projecto o propõe. Num processo mais desburocratizado, mais descentralizado: com horários, localizações e informação adequados aos seus destinatários. Que faça intervir activamente as associações de imigrantes no processo, em particular nos espaços de informação. Que simplifique procedimentos, face à realidade de emprego e de origem daqueles a quem se destina. Que atente à realidade familiar e cultural dos imigrantes, considerando a união de facto. Que preserve a garantia de direito de recurso daqueles que o evoquem e lhes assegure apoio jurídico.
Fazê-lo é defender laços de solidariedade que não podem ser quebrados. Fazê-lo é defender a segurança dos cidadãos, impedindo que os sentimentos de revolta, justamente nascidos da exclusão e da injustiça, ganhem novos ímpetos. Fazê-lo é defender a segurança dos cidadãos, evitando que a violência racista e xenófoba que, com permissividade, tem vindo a crescer possa deixar de fazer dos imigrantes vítimas. Fazê-lo é defender a segurança das pessoas, em particular, dos africanos contra violações a direitos, liberdades e garantias que, a pretexto de razões de segurança, se têm com impunidade cometido e que, seguramente, as chamadas acções de identificação tenderão a multiplicar. Fazê-lo é, finalmente, assumir as responsabilidades que temos para com as comunidades de imigrantes, em especial as africanas. É provar que a solidariedade e o espírito de entre-ajuda, de que o Primeiro-Ministro falava a propósito da campanha «África Amiga», estão presentes no espírito do povo português mas também no do Governo e que, também este, sabe interpretar o grito daqueles que por si chamam.

Aplausos do PCP e dos Deputados Independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Antes de dar a palavra ao orador seguinte, quero congratular-me, em nome da Mesa e também da Câmara, por termos connosco o Sr. Deputado Nogueira de Brito, já restabelecido da doença que teve ultimamente.
Portanto, é com muita satisfação que todos registamos a sua presença nesta Casa.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS-PP): - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim, na qualidade de primeiro subscritor do projecto de lei n.º 201/VI

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ontem à noite, quando pensava no esquema que iria adoptar para a intervenção a proferir hoje, por coincidência, uma estação de televisão transmitiu uma reportagem que, possivelmente, terá sido vista por muitos de VV. Ex.ªs e que me impressionou profundamente. Tratava-se de uma reportagem sobre redes de enganadores, de tráfico de trabalhadores portugueses, para um país da Comunidade Europeia, mais concretamente a Alemanha.
Tratava-se de trabalhadores portugueses que iam para a Alemanha, muitas vezes sem contratos, ou com contratos verbais, sem direito a qualquer garantia social nem assistência médica, alguns, tendo falecido em consequência de graves acidentes de trabalho e tendo deixado a família praticamente na miséria, outros, tendo sido acometidos de doenças mais ou menos graves e alguns ainda, tendo ficado incapazes de trabalhar para o resto da vida.
O programa era verdadeiramente impressionante. Aliás, a este propósito, já tive ocasião de redigir várias perguntas ao Governo sobre a matéria, de que vou fazer entrega na Mesa.
Mas isto foi uma introdução, interessante e impressionante para mim próprio e - suponho - também para esta Câmara, porque veio chamar-nos a atenção para os problemas da emigração ou do trabalho clandestino. Já não, nesse caso da reportagem da televisão, sobre os imigrantes que temos entre nós mas sobre os emigrantes portugueses que vão para outros países, num autêntico tráfico de carne humana ou, melhor, de «carne para canhão», como ontem assistimos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nas últimas semanas, os problemas da imigração, como, aliás, ciclicamente, vem acontecendo na sociedade portuguesa, foram objecto de uma atenção especial dos órgãos de comunicação social e deram origem a debates vários, quer nas televisões quer