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30 DE JUNHO DE 1994 2739

de afirmar, e reafirmo com profunda convicção, que um limite de prisão superior a este ultrapassa os limites éticos do direito de punir.
Por outro lado, mantemos a prisão por dias livres e o regime de semi-detenção e introduzimos na pena de multa, não a novidade da multa, como é óbvio, mas a novidade da multa alternativa. Apraz-me registar - julgo que com a felicidade do consenso - que se ultrapassou nesta questão uma posição gratuita e demagógica que pretendeu dizer que, através do recurso à alternativa de multa, o Governo queria resolver a questão da sobrelotação das prisões. Trata-se de uma afirmação que, a meu ver, ultrapassa - e não me cabe definir os limites de intervenção política - também a conformação moral do debate político.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É evidente que um qualquer governo que assumisse, discreta ou indiscretamente, uma solução pela via do direito penal substantivo deste tipo para resolver um problema de administração, como seja o da sobrelotação das prisões, nesse momento, tinha perdido a legitimidade ética para continuar a governar os portugueses.
Não é possível aceitar que se impute tal ao Governo, porque é um processo de intenção que, para além da crítica política legítima, comporta injúria no modo como são administrados os negócios e os interesses do Estado, muito particularmente quando essa administração se prende directamente com comportamentos de cidadãos.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É evidente que o que está nesta alternativa é exactamente a assunção da distinção apontada há pouco entre criminalidade de consenso e criminalidade de conflito. Por esta via, em nenhuma circunstância - e é bom que, de uma vez por todas, se clarifique este ponto- o tribunal fica inibido de aplicar pena de prisão. Todo o crime pode ser punido com pena de prisão, mas pode ser punido, em alternativa, com pena de multa. E cabe ao tribunal, em cada momento, tendo em conta o conjunto das determinantes que a lei lhe confere, decidir se, para os fins das penas em concreto e para a relação entre aquele valor negado e aquele comportamento que, desconforme à lei, o negou, a pena adequada é a de prisão ou a de multa.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por esta via, se recebe no interior deste Código Penal a possibilidade de afirmar que este é um Código com gente dentro, que não parte de uma concepção tecnocrática nem de exigências conjunturais de segurança, mas radica das exigências estruturais de segurança que existem sempre e assume-se claramente como um código à medida cultural do povo que vai servir e dos valores essenciais que nos determinam enquanto representantes, divergentes em opinião, da globalidade desse povo.

Aplausos do PSD.

Srs. Deputados, os fundamentos são claros e inquestionáveis.
Uma esmagadora maioria de reclusos é constituída, hoje, por uma camada jovem. Por isso, a questão que temos de pôr a nós próprios é justamente a de saber se não é essencial caminhar, como vos disse há pouco, no sentido de uma prevenção reforçada e, por outro lado, na possibilidade do encontro de alternativas que, junto do jovem que porventura, pela primeira vez, infringiu a lei penal, se possa dizer que a punição é mais por aquilo que ele fez e menos por aquilo que ele é; com um código penal que aponte para a reabilitação da pessoa e para a condenação do acto e não por um código penal que, para tranquilizar consciências, porventura, mortas, acaba por encontrar nessa camada jovem o bode expiatório, tantas vezes para as suas próprias frustações pessoais.
Não podemos permitir, sabendo, como sabemos, que são crimes de pequena gravidade e cometidos essencialmente por jovens, que o recurso se faça sistematicamente à pena de prisão. Não dêmos aos nossos jovens, quando as dificuldades da vida lhes batem à porta, a ideia de que a única coisa que podem fazer bem é serem criminosos.
Nesse sentido, impõe-se-nos um comportamento também ético que se reflicta claramente na política criminal concreta que trazemos ao Parlamento.

Aplausos do PSD.

Mas mais do que isso, estamos hoje diante de reformas eficazes alternativas de combate à criminalidade e a pena de multa criminal tem hoje, através do tempo e do direito comparado, essa capacidade de resposta. Aplicamo-la aos casos de menor gravidade, praticamente nunca nos crimes contra as pessoas. E quando comparamos o que se passa, hoje, noutros países que nos são próximos, rapidamente vemos como nos assiste razão.
A Alemanha aplica 92 % de penas de multa nas suas condenações criminais; a Holanda 90 %; a Áustria 91 %; a Espanha projecta uma revisão do código penal em que impõe, de forma quase imperativa, a substituição da multa sempre que a pena de prisão seja igual ou inferior a dois anos e, em Portugal, a pena de multa é aplicada em 60 a 70 % dos casos. Aí está, como, no fundo, se pretendeu fazer daquilo que era a continuidade de uma tradição cultural e de uma opção de política criminal concreta essencial, uma revolução perversa para resolver problemas de natureza meramente administrativa.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas é importante reter-se a noção de que esta é uma multa criminal e não puramente administrativa. É, portanto, uma multa que pune, que dói. Justamente por isso, ela deixa de ter como limite máximo os 10 000$ para passar a 100 000$, aumentando também, na duração em dias, a multa de 300 para 600 dias.
É exactamente por isso que os modelos de pagamento de multa não perdem nunca a raiz e a justificação da natureza penal da sanção. Daí que ela possa ser paga a pronto e, em situações de dificuldade de pagamento por essa forma, em prestações ou, ainda, no caso de dificuldade do pagamento em prestações, ser substituída por trabalho a favor da comunidade. Só em último caso, para não perder nunca a natureza criminal e punitiva da multa, ela poderá ser convertida em prisão.
Por outro lado, Srs. Deputados, existe uma melhoria de outro tipo de penas ou de sanções alternativas: a suspensão da pena de prisão com deveres; a suspensão com regime de provas; o trabalho a favor da comunidade, agora, com requisitos que vão tornar menos exigente a sua aplicação e, portanto, abrir mais a possibilidade desta medida alternativa à pena de prisão; a admoestação; a liberdade condicional.