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2 DE JULHO DE 1994 2827

O Sr. Marques Júnior (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, e receando ultrapassar o tempo de que disponho, quero agradecer ao CDS-PP a cedência de algum do seu tempo.
O projecto de lei que o PCP acabou de apresentar, para além de corresponder a uma proposta de alteração legislativa, corresponde também a um grito de revolta e a uma manifestação de indignação com a qual, independentemente das soluções propostas, penso que todos comungam.
O projecto de lei apresentado é a expressão dessa indignação, mas ele representa, em minha opinião, muito mais do que isso. Ele traduz a forma material que impede que situações escandalosas, como aquela que se verificou na atribuição de pensões aos agentes da ex-PIDE/DGS por serviços excepcionais e relevantes ao País, se possa repetir.
No entanto, este projecto de lei desperta-me para um conjunto de problemas muito mais vasto. Recorda-nos a ditadura, lembra-nos os tempos conturbados dos primeiros tempos da nossa democracia e traz-nos à memória a guerra colonial, que muita gente tem procurado ignorar mas que todos os dias se nos apresenta das formas mais diversas e, por vezes, dramáticas, como é o caso dos deficientes que clamam por justiça.
São os problemas económicos, clínicos e outros dos deficientes das Forças Armadas, juridicamente considerados como tais, e são aqueles outros, muitas dezenas de milhar, que ainda hoje sofrem os efeitos da guerra, mas que não são legalmente considerados deficientes das Forças Armadas e, portanto, não têm qualquer apoio do Estado português.
São os seus diferentes enquadramentos conceptuais e jurídicos que discriminam uns relativamente a outros e que continuam nas secretárias dos governantes à espera das respostas adequadas e que levam a desesperar muitos deles, considerando, e com toda a razão, que a luta pela Pátria justificaria uma outra prioridade no tratamento dos seus casos específicos.
Para além disto tudo, mas intimamente ligado, está a questão das pensões de preço de sangue e as pensões por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País e o seu também diferente enquadramento conceptual e legal, que cria as maiores discriminações e confusões e que são hoje objecto de vários recursos para o Supremo Tribunal Administrativo, nomeadamente no que se refere às condições e aos pressupostos de atribuição de umas e outras, independentemente das análises do mérito e demérito na sua atribuição.
A confusão está, pois, generalizada. A legislação avulsa e dispersa é muitas vezes contraditória ou de difícil e, portanto, diversificada interpretação, a necessitar de uma urgente reformulação, de forma a não permitir, o que hoje acontece, que para casos iguais haja soluções diferentes ou manifestamente injustas, na base de pressupostos que estão hoje claramente ultrapassados, 20 anos depois de terminada a guerra.
Mas, para além destas questões que estão intimamente ligadas há que considerar o caso concreto suscitado pelo projecto de lei do PCP, que é o que se refere à atribuição das pensões por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País, que não se devem confundir (o que hoje acontece como referi anteriormente) com quaisquer outras pensões, nem sequer com aquelas que são atribuídas aos deficientes das Forças Armadas, que resultaram exclusivamente de acções concretas que provocaram a sua deficiência e que possam não estar relacionadas com uma acção merecedora de mento relevante (embora seja de admitir que qualquer deficiência em campanha, merece, só por si, ser considerada resultante de uma acção relevante prestada ao País).
A importância destas pensões e o estatuto que lhe está subjacente não pode ser confundido com qualquer outra pensão de carácter económico. O seu mento não deve ser aferido em função de razões económicas e a sua atribuição e o seu valor não pode estar dependente das condições económicas do beneficiário. Esta confusão, no entanto, é hoje estabelecida pela Caixa Geral de Depósitos e contestada pelo Supremo Tribunal Administrativo.
Como refere o PCP na exposição de motivos «não é uma pensão atribuída no âmbito da Segurança Social e antes a expressão material de uma dívida de gratidão do Estado Português».
A atribuição desta pensão pelo Estado português implica, pois, o reconhecimento, para além de actos de abnegação, coragem cívica e altos e assinalados serviços à Humanidade e à Pátria, que o beneficiário seja um cidadão exemplar e identificado com os valores da dignidade da pessoa humana e cuja acção possa ser considerada, pelas mais variadas formas, como de luta pelos ideais da Liberdade e da Democracia, sem o que a expressão material dessa dívida de gratidão de um Estado de Direito Democrático não faz qualquer sentido.
É neste quadro que entendo a proposta do PCP.
Ela tem o mérito de procurar clarificar, para o futuro, a legislação existente no que se refere a estas pensões e à qual por certo não é estranha a sua atribuição a agentes da ex-PIDE/DGS, que personificam tudo aquilo que não deve ser considerado, no conjunto das razões objectivas e subjectivas subjacentes à atribuição das referidas pensões.
Compreende-se, pois, que o conhecimento público desta situação tivesse suscitado a mais viva repulsa, e, pelas mesmas razões, não se compreende que as entidades com responsabilidades neste caso não tenham sido sensíveis aos valores explícitos e implícitos que devem estar subjacentes nos pressupostos que justificaram a atribuição dessas pensões.
Na verdade, é difícil aceitar, mesmo na base do Decreto-Lei n.º 404/82, (sem as alterações entretanto introduzidas), que os responsáveis por todo este processo atribuam estas pensões aos agentes da ex-PIDE/DGS. Penso que não há base legal e/ou constitucional que suporte tal decisão.
Mas, para além da questão jurídica, há a sensibilidade e o senso comum que não podem estar ausentes destas normas. Não é crível que o legislador tivesse no seu pensamento a atribuição de tais pensões Se pensasse assim teria de considerar que a nossa democracia, que tantos sacrifícios custou, não estaria suficientemente consolidada ou teria os genes da sua destruição. A nossa democracia é ainda jovem mas acredito sinceramente na sua capacidade de afirmação, pois desde sempre tem dado provas de grande tolerância e de respeito pelos adversários e até pelos inimigos. Creio que essa atitude é correcta e ajustada mas não podemos confundir tolerância com inversão de valores e de ideais. Isto significaria violar grosseiramente os próprios alicerces da Democracia. Isto seria ser antidemocrático e contra a liberdade.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estão ainda bem vivos em todos nós os ecos de uma indignação generalizada relativamente à atribuição de pensões por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País a agentes da ex-PIDE/DGS. A polémica que na altura teve