520 I SÉRIE - NUMERO 15
de analistas do PSD a tornar incógnita a paternidade do texto aprovado. Após o veto presidencial o texto aqui aprovado pela maioria PSD teria sido inventado sabe-se lá por quem e aprovado sabe-se lá onde. E alguém chegou mesmo a insinuar que o próprio Primeiro-Ministro nem sequer sabe de tal proposta pois, caso contrário, tê-la-ia reprovado.
Puros exercícios de hipocrisia como hoje plenamente se revela. O que o PSD aqui aprovou responsabiliza-o e, evidentemente, compromete-o. O PSD tem de assumir perante os cidadãos a responsabilidade de pretender que as declarações de rendimentos dos titulares de cargos públicos sejam inacessíveis.
Pela nossa parte, o PCP mantém claramente as suas posições e hoje mesmo iremos aqui propor, durante o debate na especialidade, a plena publicidade e acessibilidade, a todo o tempo e a qualquer cidadão, das declarações de rendimentos apresentadas pelos titulares de cargos públicos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.
O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs Deputados, nos termos regimentais, a segunda leitura obriga a que se faça uma reflexão sobre os fundamentos do veto e se pretenda saber se a Assembleia da República confirma, infirma ou substitui o decreto que serviu de fundamento a esse mesmo veto.
Não se trata de abrir um novo debate, não se trata de apresentar novas iniciativas legislativas, mas apenas de saber - e este é o escopo do Regimento e da Constituição - o que é que cada grupo parlamentar pensa sobre esta segunda leitura.
Por isso mesmo, em vez de aproveitar esta figura regimental de segunda leitura para fazer novas declarações e apresentar novas iniciativas sobre um problema que está a ser discutido neste momento, diremos o seguinte: o CDS-PP pediu ao Presidente da República, em conferência de imprensa, que velasse o projecto de lei que foi aprovado unicamente com os votos do PSD.
Fizemo-lo porque entendemos que se tratava de uma medida de higiene democrática. Efectivamente o PSD tinha votado, sem saber a origem desse decreto legislativo - ninguém, até hoje, assumiu a sua paternidade, nem o PSD nem qualquer outro grupo parlamentar, ele apareceu como sendo o decreto legislativo votado na Comissão para ser enviado ao Sr. Presidente da República e, até hoje, mantém-se o mistério de quem foi o pai ou a mãe (esta principalmente) deste decreto legislativo -, regras que eram, fundamentalmente, de opacidade, de falta de transparência, de falta de publicidade, para além de serem um alento para a corrupção da classe política. Quem fez isto não sabia o que estava a escrever.
Na verdade, quem redigiu que um casal, casado em comunhão geral de bens, só podia fazer a declaração quando o titular de cargo público tivesse a administração dos bens do casal, esqueceu-se que com apenas com 300$ ele podia furtar-se a essa declaração. Para isso bastava-lhe ir ao cartório notarial, passar uma procuração à sua mulher entregando-lhe os poderes de administração dos bens do casal e dizer- eu já não sou obrigado a rever os bens do casal, a minha mulher é a administradora e, por isso, não tenho de apresentar qualquer declaração a quem quer que seja.
Em segundo lugar, tratava-se de separar os bens do casal quando toda a gente sabe que quem quer esconder os seus bens pode fazê-lo de mil maneiras. Aliás, o próprio decreto legislativo dava indicações, guiava o detentor do detentor de cargo político para fazer aquilo que a própria transparência obrigava a não fazer.
Em terceiro lugar, este decreto, quanto à publicidade, cercava de tal maneira os bens detidos pelos titulares de cargos públicos que quase os tornava um segredo de Estado.
Efectivamente, o que está em causa numa democracia e que o eleito, aquele que se preza de dar o seu nome para sufrágio popular, tenha uma vida limpa, não tenha nada que esconder. Por isso mesmo custa-nos ver publicadas nos jornais declarações dos rendimentos de titulares de cargos públicos, com os próprios políticos a louvarem a atitude desses jornais, semanários ou diários No entanto, quando se trata de votar, aqui, leis para fazer isso mesmo de uma forma sã, escorreita e legal, esses mesmos políticos arranjam abortos, monstruosidades e aleijões, tal como este decreto legislativo que, em boa hora, foi vetado pelo Presidente da República.
Sr Presidente, Srs Deputados. Nós queremos, em primeiro lugar, que a lista de detentores de cargos políticos ou públicos seja ampliada e, nesse sentido, apresentámos a nossa proposta de alteração
Em segundo lugar, não queremos que, por falsas vias da administração dos bens do casal ou cindindo os rendimentos do casal, se escondam ou ponham debaixo do tapete bens que foram ilegitimamente adquiridos ou que não queiram sujeitar ao escrutínio da publicidade.
Em terceiro lugar, queremos que a publicidade seja total, isto e, que, uma vez declarados os bens. qualquer indivíduo possa ter acesso a essa declaração e que, querendo, possa dar-lhe publicidade sem invocar o interesse legítimo. Apenas queremos que uma coisa seja prevista na lei: que quem publique uma declaração dos rendimentos de um titular de cargo político não o laça parcialmente, sob pena de incorrer em acção penal grave, porque se trata de difamação ou de falsidade de transcrição de um documento. Isto é, quem quiser servir-se de um documento destes deve dar publicidade ao documento todo e não apenas à parte deste documento que lhe interessa Esta é, para nós, uma norma fundamental para a garantia da integralidade das declarações dos titulares de cargos públicos.
Finalmente, Sr. Presidente e Srs Deputados, queremos que o Tribunal Constitucional abandone a sua jurisprudência e que, mesmo contra a vontade do detentor do cargo político, não abra mão das declarações dos seus rendimentos, como actualmente faz.
Efectivamente, se o próprio detentor do cargo público dá autorização para que a sua declaração de rendimentos seja publicada, não compreendemos por que razão o Tribunal Constitucional há-de guardar para si o privilégio do sigilo dessa declaração.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, estamos inteiramente de acordo que se abra um debate nesta Assembleia da República, em que se discuta, exaustivamente, todas as implicações deste problema, não apenas as declarações do IRS, não apenas as declarações de rendimentos feitas, como actualmente, num impresso próprio, conforme a lei, mas para que, efectivamente, seja discutido o que e que um detentor de cargo político ou de cargo público, uma vez definida esta noção, deve sujeitar ao escrutínio da opinião pública e o que é que a ela não deve sujeitar.
É que, hoje, há vias que nos repugnam, como, por exemplo, a chamada «Operação Mirage», que foi boa para a evasão fiscal, mas que foi preparada de maneira sinuosa, tortuosa, como se recordam, para detectar e perseguir ai-