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8 DE ABRIL DE 1995 2087

E o que é o Fórum? «É uma espécie de maxi-Congresso em que centenas de coisas se passam em simultâneo», explicava há poucos dias, na Gulbenkian, a representante de uma ONG portuguesa que integrou a delegação oficial. De facto, o Fórum foi, durante dez dias, uma imensa tribuna onde se fizeram ouvir as mais variadas vozes, quase todas de denúncia, tornando viva e próxima a situação de muitas das vítimas e excluídos de um modelo de desenvolvimento que só tem vindo a agravar as desigualdades existentes.
Mais de 600 ONG subscreveram, no final dos trabalhos, uma «Declaração Alternativa», onde se faz a crítica dos documentos oficiais saídos da Cimeira. Contesta-set fundamentalmente, a contradição entre os princípios dó equidade e de justiça social professados e as consequências do modelo económico neo-liberal dominante e cada vez mais universalizado.
De entre essas consequências destacam-se: o peso insustentável da dívida de dezenas de países, que Os priva de recursos indispensáveis ao seu desenvolvimento económico e social; os condicionalismos impostos pelos programas de ajustamento estrutural, que subalternizam as políticas sociais, colocando os serviços de saúde e educação fora do alcance dos mais pobres; e a concentração crescente de poder económico, político e tecnológico nas corporações e instituições financeiras transnacionais, que regem o crescimento económico em prioridade absoluta, subordinando-lhe o bem-estar social.
A Declaração Alternativa não pretende ser um documento representativo de todas as Organizações Não Governamentais. Mas dá-nos, sem dúvida, o tom das posições assumidas pela maioria dos grupos representados no Fórum Das organizações religiosas às laborais, das representações regionais às plataformas nacionais, as ONG analisaram, em profundidade, as causas estruturais da pobreza, do desemprego e da exclusão, e manifestaram uma vontade comum de colaborar com as organizações multilaterais na procura de novos mecanismos de resposta. Exemplo disso foi o apoio por elas dado à proposta 20/20 (uma das mais polémicas do Programa de Acção), que visou estabelecer percentagens fixas para as políticas sociais, tanto nas verbas destinadas pelos países ricos à ajuda ao desenvolvimento como nos orçamentos do Estado dos países receptores.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Fiz referência à diversidade dos sectores humanos presentes no Forum e, nesse contexto, não posso deixar de mencionar o papel preponderante, para não dizer dominante, das mulheres.
Para quem guarda ainda a imagem de que a voz das mulheres na cena internacional, aliás, como na cena nacional, é sobretudo uma voz reivindicativa da igualdade de oportunidades e de questões específicas relativas aos direitos reprodutivos das mulheres, a Conferência de Copenhaga foi, certamente, uma enorme surpresa.
Num crescendo difícil de prever - com início na Cimeira do Rio e tendo percorrido já os marcos da Conferência sobre Direitos Humanos, em Viena, e da Conferência sobre População e Desenvolvimento, no Cairo --, as organizações de mulheres foram, em Copenhaga, um dos lobbies mais visíveis e mais influentes.
Redefinir o emprego produtivo e o trabalho, transferir para as áreas sociais as verbas atribuídas a despesas militares e construir comunidades e não apenas mercados, foram algumas das propostas feitas em nome das organizações de mulheres, no dia 8 de Março, no plenário da Cimeira. Na tarde do mesmo dia, na grande Assembleia do Forum, essas propostas converteram-se em dança e em festa, enquanto, ao som dos ritmos mais diversos, se repetia a frase: «o século XXI será nosso; queremos pão e flores!»
A marcha para Pequim estava lançada: «180 dias - 180 vias» foi o desafio colocado a todas as presentes. Resta saber como essa marcha está a ser prosseguida em cada país e em cada região do mundo. Pela nossa parte, creio que deverá pensar-se, desde já, na participação de Deputadas desta Assembleia na Conferência e no Fórum de Beijing. Se lá não estivermos, faltaremos, com certeza, a um dos grandes rendez-vous da História neste final de século.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Sem querer terminar com uma nota de pessimismo, vem-me à memória, em jeito de remate, uma frase ouvida a um participante inglês num dos debates do Fórum, «alguns de nós viajamos na primeira classe; outros viajam no porão, mas estamos todos embarcados no mesmo Titanic».
Com efeito, a consciência crescente da globalização dos problemas torna-nos, a todos - povos do Norte e povos do Sul -, cúmplices na mesma luta pela sobrevivência da Humanidade, que parece apenas ser possível por caminhos de maior justiça na repartição dos bens que nos são comuns.
A denúncia desta situação e a afirmação conjunta, tanto por parte dos estados como da sociedade civil, da vontade de a ultrapassar constituem, sem dúvida, o principal adquirido da Cimeira de Copenhaga.
Cabe-nos agora exigir que os compromissos assumidos se concretizem e que as vontades solidárias se imponham «aos impasses sucessivamente provocados pela indiferença, pela burocracia e pela retórica vazias» (são as palavras da Primeira-Ministra Gro Bruntland).
No nosso país, teremos ocasião de aferir o impacto da Cimeira nas várias políticas nacionais quando nos confrontarmos com os programas dos partidos candidatos as próximas eleições e, sobretudo, quando aprovarmos, no final do ano, o próximo Orçamento do Estado. Da prioridade atribuída, ou não, ao elemento social na afectação de recursos dependerá a nossa fidelidade ou traição ao espírito de Copenhaga.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Os meus cumprimentos, Sr.ª Deputada Teresa Santa Clara Gomes, pela excelência do seu relato e das suas reflexões.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não temos qualquer dúvida em sublinhar a justeza e o importante significado da junção neste debate dos dois temas propostos: a Cimeira de Copenhaga e a Agenda para a Paz.
Juntar estes dois temas é dar sequência, aqui na Assembleia da República, ao que é hoje um património sólido das Nações Unidas: a consciência de que há uma ligação indissociável entre a problemática da paz e a problemática do desenvolvimento, por tal forma que «sem desenvolvimento, não há paz» ou, dito de outra forma, «a falta de desenvolvimento económico, social e político e a causa profunda dos conflitos». Citei dois passos das declarações subscritas por Boutros-Boutros Ghali.
Por isso, este debate conduz-nos, inevitavelmente, para uma reflexão global sobre a situação e o destino colecti-