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8 DE ABRIL DE 1995 2089

É possível o desenvolvimento dos países mais atrasados no quadro da liberalização selvagem do comércio mundial, que tem permitido a degradação sucessiva dos preços das matérias primas e produtos produzidos por esses países? Há muitos países desses que aumentam todos os anos significativamente a sua produção e, no entanto, o seu PIB todos os anos desce.
É possível o desenvolvimento desses países com o garrote da dívida externa? Há países desses que, mesmo assim, exportam para os países mais desenvolvidos percentagens significativas do seu produto interno bruto, que chega a atingir 6 %. São 6 % do produto interno bruto de um pobre país exportado directamente para os cofres dos países mais ricos. É possível o desenvolvimento desses países quando não há transferência de tecnologia, quando o valor acrescentado por investigação se concentra nos países ricos, quando há a apropriação por estes países dos escassos cientistas e investigadores, que vão aparecendo nos países pobres, a famosa «fuga de cérebros»?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Que capacidade tem o sistema sócio-económico dominante para dar solução aos problemas com que se confronta o mundo, quando os países 0m que pontifica - dizem que «com sucesso» - o saldo apresentado é o de legiões de desempregados e pobres? Os 20 milhões de desempregados da Comunidade e o$ 50 milhões de pobres demonstram que a causa da situação em que vive o mundo está no próprio sistema sócio-económico que o domina, no capitalismo e na irracionalidade que lhe está subjacente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Como esquecer os 400 000 sem abrigo de Londres, os 500 000 de Paris? Quer-se maior irracionalidade? Dirão que não foi construída qualquer outra sociedade mais perfeita. Di-lo-ão, porque é verdade. Mas não podem é dizer que esta é uma sociedade justa nem que a humanidade esteja condenada à irracionalidade e à injustiça. Por isso, a luta milenária do homem pela refundação da sociedade continua e há-de continuar até à superação da injustiça e dos sistemas que, como o capitalismo e o liberalismo, as geram.
A Cimeira de Copenhaga cumpriu então plenamente essa função, de exibir a chaga perante o mundo inteiro. A ideia da Cimeira foi um reflexo desse movimento de consciência do mundo acerca da sua dilacerada condição, e a sua realização foi uma contribuição poderosa para o aprofundamento dessa consciência.
Os números da nossa crueldade correram as televisões de todo o mundo, sentaram-se à mesa dos Chefes de Estado e de Governo, pesaram na consciência de todos, mesmos os que, como Bill Clinton e Ieltsin, não responderam à chamada. A Cimeira de Copenhaga cumpriu ainda essa função quando proporcionou a realização da cimeira das organizações não governamentais - como a Sr.ª Deputada referiu -, que reuniu mais de 2000 organizações, que foram a consciência crítica permanente do que a cimeira fez e do que não fez.
Cumpriu, por esse lado, mas ficou aquém das expectativas, por outro. Exposta a chaga, muitos sentiram o direito de reclamar alguns remédios que, mesmo sem atingirem as causas, dessem contribuições concretas para a solução dos problemas. Mas a Cimeira, no documento aprovado pelos 185 países participantes, não ultrapassou os compromissos não quantificados e sem valor vinculativo. É certo - e não quero subestimar esta componente - que são compromissos importantes, que têm um valor político directo. Os políticos devem honrar os seus compromissos e os povos têm o direito de confrontar os seus representantes com os compromissos que assumiram durante a Conferência. Mas o facto de esses compromissos não terem sido quantificados é um péssimo sinal.
Os 0,7 % que os países desenvolvidos deveriam consignar à ajuda continuam a não passar de, como são designadas, «ideias generosas» - e não sei por que é que lhe chamam «ideias generosas» quando não as passam à prática. Os Estados Unidos, por exemplo, dão o valor que corresponde a menos de 1/20 desses 0,7 %, isto é, dão a ridícula percentagem de 0,03 %, que é qualquer coisa como três dólares em cada 10000- e, mesmo assim, a actual maioria do Congresso pensa que é uma dádiva excessiva.
A cobrança do imposto de 0,05 % sobre os movimentos especulativos financeiros e cambiais, proposta inicialmente pelo Prémio Nobel James Tobin, também «ficou no tinteiro», como ficaram as ideias da afectação das reduções dos gastos em armamento e da sua aplicação ao desenvolvimento. Os gastos em armamento somam, ainda hoje, o valor impressionante de 800 000 milhões de dólares - fiz as contas e este valor dá qualquer coisa como 100 000 milhões de contos -, o que somado deve corresponder ao PIB de muitos países. O que significa que a Agenda para o Desenvolvimento dá os primeiros passos sob a ameaça da falta de vontade política para a sua concretização, ou seja, sob a ameaça do mesmo fracasso que hoje recai pesadamente sobre a Agenda para a Paz.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto os escassos anos da Agenda para a Paz e a experiência recente da intervenção da ONU na prevenção, manutenção e restabelecimento da paz mostram que, neste ponto, também é preciso mudar os conceitos políticos. A ONU tem sido arrastada pelas conveniências das grandes potências, em particular da dominante. É preciso dizê-lo: as intervenções na Somália, como na ex-Jugoslávia, fazem-se ao sabor de critérios mais do que duvidosos, com métodos mais do que questionáveis e, por isso, inevitavelmente, com resultados desastrosos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A defesa da paz e a promoção do desenvolvimento exigem uma reponderação do papel do hegemonismo no modelo de funcionamento dos sistemas de cooperação e segurança e, desde logo, no próprio funcionamento da ONU. Por exemplo, a ONU interveio na Somália, alegadamente por razões humanitárias, mas, ao mesmo tempo, manteve um bloqueio ao Iraque que atingiu não a sua máquina de guerra, porque esta é protegida, já que se situa numa zona onde há outras poderosas máquinas de guerra, como a turca, a síria e a iraniana, mas, sim, a sua população civil, incluindo crianças, mulheres e idosos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Por tudo isto, a reflexão sobre a situação do mundo e os caminhos para a superar têm de passar também por uma reflexão sobre o papel da ONU, a sua estrutura e o seu modelo de funcionamento.
A paz e o desenvolvimento são uma aspiração sentida pelos povos, em que muitos homens e mulheres, políticos,