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18 DE MAIO DE 1995 2495

que o partido da maioria não interprete mal o relatório do Sr. Deputado Fernando Condesso chumbando a iniciativa do PS só porque veio de um partido da oposição"

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu). - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Costa.

O Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção visa apresentar, em especial, o projecto que tem o objectivo de criar um sistema de informação para a transparência dos actos da Administração Pública. Esta iniciativa insere-se numa preocupação que vimos desenvolvendo ao longo desta legislatura no sentido de rodear de maior transparência, seja aspectos ligados ao estatuto dos titulares de cargos políticos e das organizações políticas - e aí a matéria da transparência está neste momento perfeitamente popularizada - mas também em relação às actuações da Administração Pública. E é assim que temos proposto uma publicidade mais alargada dos actos da Administração, regimes mais abertos de recorribilidade das decisões administrativas e um alargamento dos instrumentos de sindicabilidade desses actos, nomeadamente prevendo, através de iniciativas que também aqui trouxemos, novas formas de auditoria e de inspecção aos serviços e às actividades da Administração.
Esta nossa iniciativa, devo dizê-lo, colhe alguma experiência de recentes relatórios de outros países onde a preocupação com esta temática se encontra também na agenda política e, nesse sentido, gostaria de referir em particular a França e a Inglaterra. Num desses relatórios apresentados durante o ano que passou as medidas de transparência são organizadas em torno de três tópicos: pessoas, organizações e actos Esta nossa iniciativa situa-se neste terceiro domínio, visa rodear os actos de maior transparência e de maiores garantias de controlo e movimenta-se, como já notou o Sr. Deputado Narana Coissoró, no domínio da área de actuação administrativa do Estado. Adere, portanto, ao espírito e é coerente com propostas anteriores que apresentámos no sentido de assegurar mais publicidade e mais recorribilidade em relação aos actos da Administração Pública.
Esses actos apresentam hoje problemas novos em ligação sobretudo com a expansão da intervenção do Estado na vida económica, pois uma grande parte da despesa nacional passa hoje por decisões administrativas. Sabemos, aliás, que essa percentagem nos últimos 10 anos subiu enormemente e a multiplicação dos actos envolvendo despesas faz incorrer, quanto mais não fosse por razões puramente matemáticas, em mais elevadas probabilidades de erros e de ilegalidades com consequências económicas e de práticas menos correctas como as que se inscrevem no domínio do tráfico de influências e do clientelismo.
Por outro lado, esses actos são também em grande medida actos que atribuem vantagens a particulares, actos onde está em causa não apenas o respeito formal da .legalidade em sentido clássico mas onde estão em causa princípios essenciais do Estado de direito actual como, por exemplo, os princípios constitucionais da imparcialidade e da igualdade que são, muitas vezes, a coberto do respeito formal da legalidade, postergados sem que existam formas de controlo, nomeadamente em sede de contencioso administrativo, que possam obviar a esses riscos.
E estas decisões, que têm crescido na medida que referi, são também decisões que põem em causa relevantes aspectos económicos, como sejam o facto de decisões ilegais, na dupla acepção que referi, serem com frequência decisões que custam mais ao Estado e que custam mais aos contribuintes no sentido de que uma má decisão num concurso, uma má decisão na aquisição de um serviço é normalmente uma decisão mais cara para o contribuinte; no sentido de que um acto venalisado é um acto que acaba por transferir uma renda para o beneficiário desse acto venal e também no sentido de que uma decisão num concurso que premeie um concorrente, que numa análise económica pura não merecia ganhar, é também uma decisão que prejudica o contribuinte e que prejudica o País.
Para este tipo de problemas, que são novos e que têm suscitado o interesse de vários autores e diversas correntes políticas em vários países, coloca-se hoje abertamente o problema da insuficiência dos controlos e dos graus de conhecimento que são assegurados ao público, às empresas e às instâncias de controlo. É preciso todo um programa para enfrentar actualmente este quadro de insuficiência, em que a ilegalidade e o risco dessa ilegalidade aumentam, em que a probabilidade do erro económico e os custos adicionais para os contribuintes aumentam, sem que os dispositivos reactivos e de defesa estejam à altura da progressão destes riscos.
Este é um diagnóstico inevitável no Estado social contemporâneo e muito em particular no Estado português, onde claudicam muitos controlos, a começar pelos da justiça administrativa e a terminar naqueles que têm a ver com as condições de actuação da justiça financeira, bem como outros aspectos que, por carestia de tempo, não trago à colação.
Estamos preocupados com estes aspectos e já na discussão do Código Penal revelámos que, a nosso ver, o direito penal deveria dar uma contribuição neste domínio. Apresentámos a ideia, que felizmente foi aceite, de passar a incriminar essa prática na sociedade portuguesa, mas temos a ideia de que, mais do que iniciativas sectoriais, é preciso uma visão e um programa global de promoção activa da legalidade na sociedade portuguesa, onde existe um défice de cultura de legalidade e de observância da mesma que atinge níveis culturais extremamente preocupantes, nomeadamente em redor da actividade dos tribunais, onde uma autêntica cultura da revelia - como ainda há dias era notado pelo Sr. Procurador-Geral da República - perturba, obstrui e desprestigia a actividade dos tribunais.
É preciso reforçar os instrumentos de promoção activa da legalidade por duas razões básicas, sendo a primeira a garantia da observância do programa democrático inscrito na legislação. Isto porque, se uma lei não é cumprida e se um princípio legal e constitucional não é observado, não é apenas a preocupação formal do Estado de direito ou da racionalidade legal, no sentido veberiano, que estão em causa- e seria já alguma coisa-, mas é a vontade dos eleitores, traduzida nessa legislação, que é postergada.
Por isso, a democracia supõe uma política activa de promoção e de respeito da legalidade, nomeadamente na vertente daqueles princípios fundamentais que há pouco referi, ou seja, os da igualdade de tratamento e da imparcialidade. Seria imperfeita e vulnerável a democracia, se, inscrevendo estes princípios na Constituição e nas leis, não os observasse na prática dos actos da Administração, nomeadamente naquelas decisões que são economicamente mais significativas.

Vozes do PS: - Muito bem!