8 DE JUNHO DE 1995 2709
confrontações a conflitos de pequena intensidade.: Não é o que se passa e, de todos os fenómenos detectáveis que tornam difícil a racionalização de uma polemologia para o fim do século, tem especial relevo a relação entre drogas, armas e guerrilha, uma estrutura viciosa que a comunidade internacional precisa de destruir, sob pena de a insegurança e a instabilidade crescerem sem limites de áreas geográficas ou políticas, tudo urgente tanto para os governos como as autoridades espirituais.
Por isso, o envolvimento nas instituições e operações destinadas a preservar a paz e a restabelecer e manter a paz são acções prioritárias de cooperação, a que nenhum país deve furtar-se na medida larga ou estreita das suas capacidades. Por isso, a intervenção portuguesa no Conflito de Angola para mediar entre os contendores, assim como em Moçambique, são acções meritórias, independentemente dos erros ou dos acidentes de percurso, todos sempre a exigirem um tratamento que não afaste as responsabilidades mas não perturbe a realização de objectivo principal.
A contribuição no universo próximo de Portugal também o acredita para intervenções de tipo diverso no seio de grandes organizações internacionais, onde os pequenos países precisam de estar sempre activos no sentido 'de impedir a constituição de directórios ou de hegemonias que facilmente esquecem a igual dignidade de todos. A presença dos pequenos países em organizações como a ONU, a Aliança Atlântica, a União da Europa Ocidental, a Organização de Segurança e Cooperação Europeia, é uma essencial demonstração do exercício de uma soberania de serviço, e Portugal faz bem em assumir todas essas responsabilidades à sua dimensão. Porque o facto é que não estamos apenas na Península Ibérica, enfrentando o iberismo, ou na Europa, enfrentado o europeísmo, Ou no Atlântico, respondendo ao atlantismo; estamos no murado que se unificou e no qual a interdependência global tornou a cooperação numa necessidade, mesmo para os que tivessem a veleidade de não a aceitar como um dever.
É natural que os Estados, tal como as organizações não governamentais, possam reflectir melhor no seu mundo próximo os princípios a que aderem na cooperação global. Tal como acontece com a Inglaterra, a França ou a Espanha, o mundo de fala portuguesa exige e merece uma atenção especial dos governos abrangidos. O notável Winston Churchill, que supunha que não fora nomeado primeiro-ministro para assistir à queda do Império Britânico, identificou a área sobrevivente escrevendo a história dos povos de língua inglesa, que o notabilizou. É por isso que a primeira tarefa de cooperação na área de expressão cultural portuguesa é certamente a do apaziguamento das relações políticas, e deve notar-se que o progresso foi notável com a intervenção na sequência da política assumida pelo Estado português, de instituições privadas, universidades, intelectuais, artistas, em suma, sem exibição do poder e até à margem do poder.
São de assinalar manifestações institucionais desse apaziguamento, designadamente, há poucos dias, a presença de todos os Estados africanos de língua oficial portuguesa, nesta Sala, e com a representação do Brasil, para, apoiar a iniciativa portuguesa de apoio ao povo de Timor Leste, em nome da autodeterminação, em nome dos direitos do homem, mas também em nome de um conceito cultural comum, o que apoia a linha de pensamento que apela para a prioridade de cooperação de carácter cultural, tendo especialmente em vista a língua portuguesa.
Foi em 1988 que, no Recife, propus a criação :de um Instituto Internacional da Língua Portuguesa, o que repeti na visita a esta Casa, e no acto de recepção do Presidente José Sarney. Foi, porém, o Brasil que se adiantou, pela mão dele, na institucionalização, como se adiantou no projecto da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Mas é animador que seja um dos países cuja matriz histórica está na acção portuguesa que tomou a iniciativa e que esta seja global, identificadora de um conjunto onde se inclui, sem hesitações, Portugal, a metrópole que foi de todos.
Como se diz na Agenda para o Desenvolvimento. «As acções levadas a cabo em cada um dos sectores do desenvolvimento devem completar-se mutuamente para a realização de um progresso centrado no ser humano. Não será possível um desenvolvimento bem sucedido se uma dimensão for privilegiada e outra excluída. Sem a paz, a mobilização das energias humanas para fins produtivos tornar-se-ia rapidamente impossível. Sem crescimento económico, haverá falta de recursos para acorrer a qualquer problema. Sem um ambiente saudável, a produtividade destruirá as próprias bases do progresso. Sem justiça social, as desigualdades comprometerão os esforços realizados a favor da mudança. Finalmente, sem a livre participação na vida política, os indivíduos deixarão de ter mão quer sobre o seu próprio destino quer sobre o da colectividade». É por isso que a cooperação, na área do apaziguamento das relações políticas dentro de toda a execução cultural portuguesa, e a intervenção a favor do restabelecimento da paz, são acções prioritárias fundamentais para que as outras áreas se possam desenvolver e - volto a repetir - julgo que, nesta área, o progresso que Portugal conseguiu foi notável.
Devíamos certamente, atendendo à matriz cultural, racionalizar e reactivar as estruturas na área científica, técnica e cultural que naqueles territórios ficaram e que a todos lembram notáveis acções portuguesas, e dos quais restam referências vivas na correspondente estrutura de que ainda dispomos, designadamente, o Instituto de Investigação Científica Tropical, o Instituto de Medicina Tropical, o Arquivo Histórico, a Filmoteca Ultramarina.
Seria necessário, com a escassez de recursos de que dispomos, prestar alguma atenção à racionalização da intervenção governativa. Não quero estender-me muito nessa crítica mas lembraria, por exemplo, como, ao lado da intervenção do Ministério dos Negócios Estrangeiros e do Instituto Luís de Camões, do qual se esperam grandes acções, o Ministro do Planeamento e da Administração do Território, também de vez em quando, faz incursões inesperadas nesta área. O seu Ministério tem uma designação tão comprida que, por vezes, me ocorre que se lhe devia acrescentar, como fez o Sr. D. Manuel I, um «Et coetera», porque é muito difícil racionalizar toda a área de intervenção e julgo que este é um ponto fundamental que devia ser tomado em conta
Por outro lado, desejo sublinhar que, na sequência do processo de paz em Angola e Moçambique, a sociedade civil portuguesa desperta, como estão a demonstrar as jornadas em curso no Porto, para o regresso ao mundo que o português criou, e o regresso da sociedade civil é o melhor sinal do restabelecimento de relações normais.
Gostaria de acrescentar, apenas estimulado por algumas das excelentes intervenções que ouvimos aqui hoje, que «A opção africana», título das jornadas do Porto, não é uma alternativa à opção europeia mas constitui, sem dúvida, uma das opções necessárias e irrenunciáveis do Estado português. Não praticará com isto o Estado português uma grande originalidade porque o regresso a África é uma decisão europeia: o conceito Euráfrica renasceu