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2886 I SÉRIE - NÚMERO 87

Estas práticas de urbanização de génese legal ou ilegal baseavam-se na iniciativa individual e eram quase inteiramente condicionadas pelos limites da propriedade do solo e pelas estratégias dos promotores, que, entretanto, serviram de intermediários para o parcelamento urbanístico do território.
Estes processos deram resposta a uma procura crescente de solo urbano para o qual o sistema de planeamento não soube garantir níveis aceitáveis de oferta, mas traduziu-se por manchas urbanas irracionais, com elevados custos de infra-estruturação, que prolongam até hoje carências difíceis de aceitar num país europeu e degradam frequentemente as paisagens e a qualidade de vida.
Foi o II Governo Constitucional que inscreveu no seu programa uma lei-quadro do urbanismo, mas caiu antes disso, e foi o Partido Socialista que apresentou em 1980, na Assembleia da República, uma lei-quadro do ordenamento do território, mas a reforma urbanística prosseguiu com a sucessiva actualização de diplomas avulsos - sempre diplomas avulsos sem regime enquadrador, com os resultados que se têm visto até agora.
Com o X Governo Constitucional e a entrada na Comunidade Europeia é atingida a necessária estabilidade - que, pelos vistos, foi desaproveitada - e é criada pelo actual Ministro do Planeamento e da Administração do Território uma comissão que elabora, em 1988, uma lei enquadradora do regime de solos, que o Governo acaba por nunca apresentar, optando, mais uma vez e apesar dos maus exemplos anteriores, pela revisão dos diplomas avulsos de planeamento urbanístico, loteamento e obras particulares, sempre da mesma maneira, sem que qualquer diploma enquadre os direitos e deveres dos cidadãos e da Administração e dê funcionalidade ao sistema de planeamento de Estado.
Aquando da proposta deste primeiro conjunto de diplomas avulsos, o Partido Socialista apresentou nesta Assembleia, em 1989, o seu projecto de lei de bases sobre o regime urbanístico do solo e planeamento municipal, que tive a honra de ser a primeira subscritora e que teria permitido enquadrar, já na altura, a prática urbanística destes anos, se tivesse sido aprovado pelo PSD.
Mas, apesar de o Programa do Governo apresentar esta matéria como sendo de primeira prioridade, passaram-se 10 anos de estabilidade sem que o Governo definisse o processo como se poderia aplicar o planeamento urbanístico, entretanto publicado com todos os defeitos que o bluff da celeridade impôs.
Diz-se que o Governo, entretanto, aprovou o novo regime dos planos especiais de ordenamento do território, já submetido a parecer da Associação Nacional dos Municípios Portugueses.
Trata-se de uma lei que contraria a capacidade de planeamento municipal, permitindo, a pretexto de políticas sectoriais legítimas, que sejam impostos planos como o POZOR e que serviços sectoriais do Estado, a pretexto de salvaguardarem políticas sectoriais, se substituam às câmaras municipais para definir o uso urbanístico do solo nos territórios sob sua tutela, ou seja, definir a tal altura dos prédios de escritórios.
Este diploma inscreve-se num contexto de centralização de competências e de arbitrariedade em que qualquer serviço do Estado se pode sobrepor, porque essa sobreposição vem no diploma, a documentos urbanísticos como os PDM, elaborados no âmbito do processo de planeamento municipal - que o Sr. Ministro se gaba de ter instituído, mas que pode ser desfeito por qualquer diploma avulso sectorial -, recentemente instituído e ratificado pelo próprio Governo.
É a instituição de um regime permanente de incerteza, insegurança e arbitrariedade incompatíveis com o Estado democrático em que vivemos.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Que exagero, Sr.ª Deputada! Onde é que leu isso?

A Oradora: - O senhor nem leu o diploma!
É neste contexto que o Governo propõe esta autorização legislativa, sem consultar ninguém, sem consulta pública, sem que seja feito qualquer exercício de discussão que venha permitir a própria aplicação deste diploma, porque o Governo sabe que não o vai aplicar.
Não sabemos bem o que pretende ao promulgar, mas sabemos que o diploma entregue pelo Governo à Sociedade Portuguesa de Urbanistas vem obrigar à cobertura do território com novos planos de urbanismo e de pormenor, fazendo disso depender a aprovação de operações de loteamento e as correspondentes obras de urbanização - alínea d), n.º 2, da proposta de lei de autorização legislativa. Ou, então, quer-se bloquear completamente os loteamentos depois de se ter publicado legislação sobre a matéria.
Para que servem os PDM aprovados?
Este diploma vem também pôr em causa a credibilidade do sistema de planeamento ao prever uma hierarquia de planos, que não respeita os domínios em que cada plano se circunscreve - são os tais planos sectoriais -, permitindo assim ao Governo intervir permanentemente sobre decisões anteriores.
Na alínea n) do artigo 2.º, impõe-se a expropriação de prédios que fiquem afectos a fins de interesse público em planos de pormenor independentemente da sua programação, negando a flexibilidade no tempo dos processos urbanísticos, que foram aqui louvados pelo Sr. Ministro, mas que este tipo de disposições contraria. Aliás, sabe perfeitamente que, por exemplo, a Câmara de Évora já teve que suspender metade dos planos de pormenor, porque as imposições são tais que, de facto, o que isto incentiva é que as câmaras não tenham esses planos. Ou seja, este diploma é auto-contraditório com tudo o que foi publicado anteriormente.
Esta prática irá retrair as câmaras de aprovar planos de pormenor e conduzir à sua revogação - que, aliás, já aconteceu em alguns casos -, em contradição com a intenção do legislador de favorecer a elaboração de planos urbanísticos por parte das câmaras municipais, como elemento de previsibilidade - que é muito importante - da actuação, tanto do Estado como dos particulares.
Também, na alínea p) do artigo 2.º, se vem aumentar drasticamente a contribuição autárquica para os particulares que possuam solo urbanizável ainda que o não utilizem para a construção, nem que a sua transformação em solo urbano esteja programado Não sei para que há depois as programações!
Na alínea z) do artigo 2.º, vem-se impor isenções fiscais aos municípios para o estabelecimento de associações para reparcelamento, afectando, mais uma vez, as receitas municipais e interferindo no processo urbanístico que compete às câmaras conduzir e que, obviamente, aconselha a actuações flexíveis, adaptadas aos objectivos que, em cada caso, são prosseguidos - e não a que o Governo venha impor uma isenção, ainda por cima à custa de outrém, como é costume!