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2 DE MARÇO DE 1996 1183

Assim, em coerência com a posição que tomámos quando foi discutida pela primeira vez a lei da televisão, não acompanharemos esta proposta de lei.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Reis.

O Sr. António Reis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social, Srs. Deputados: O pedido de autorização legislativa apresentado pelo Governo, e que merece o acordo do Grupo Parlamentar do PS, não deve, a nosso ver, ser entendido como um mero produto da necessidade de consagrar na lei da televisão uma inevitabilidade jurídico-política decorrente dos compromissos assumidos pelo Estado português no seio da União Europeia, inevitabilidade essa à qual, resignadamente, nos teríamos de conformar, ou como uma espécie de mais um preço a pagar pela integração europeia, preço esse, porém, eivado de perigos ou de ameaças para a identidade cultural portuguesa ou para a independência nacional.
Por um lado, o reconhecimento expresso aos nacionais dos Estados membros da União Europeia de tratamento igual ao dos cidadãos portugueses, no que respeita à exploração da actividade de televisão e à participação no capital social dos operadores do sector, deve ser visto à luz da filosofia da cidadania europeia e dos seus inerentes direitos e deveres e numa base de plena reciprocidade inter-Estados. Por outro lado, é hoje cada vez mais visível que é. pura ilusão, ainda que bem intencionada, pretender que as limitações ao chamado direito de estabelecimento funcionem como válvulas de segurança na defesa da identidade cultural portuguesa ou da opinião pública nacional contra os perigos de descaracterização ou de submissão a pressões externas, ilusão essa que não se compadece nem com a internacionalização da produção audiovisual, nem com a liberdade de recepção e retransmissão de programas de radiodifusão televisiva que a evolução tecnológica em curso tornou inevitável, nem com a liberdade de receber e de consumir informações e ideias sem consideração de fronteiras, como o artigo 10.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem consagrou, até porque a ameaça aos valores que o legislador tinha em mente ao consagrar estas imitações ao direito de estabelecimento não decorre, necessária e fundamentalmente, da predominância de capital estrangeiro numa sociedade de televisão. A experiência do nosso actual quadro televisivo aí está para mostrar à exaustão que nem sempre os próprios investidores nacionais dão garantias de defender os valores da cultura e da língua portuguesas, ora descurando a produção de obras de ficção e outras de autores portugueses, ora inundando o écran com reality shows ou concursos de concepção e formato estrangeiros. Não é, com efeito, da nacionalidade do capital da entidade proprietária que decorre a existência de uma televisão respeitadora ou não da cultura e língua portuguesas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa por ter de o interromper, mas encontram-se entre nós um grupo de 100 alunos da Escola Secundária Fontes Pereira de Melo, do Porto, e um outro de 50 alunos da Escola Profissional e Tecnológica de Sicó, de Alvaiázere, que têm de se ausentar neste momento, para quem pedia a todos uma saudação muito amiga.

Aplausos gerais, de pé.

Sr. Deputado António Reis, pode prosseguir a sua intervenção.

O Orador: - É, sim, através de um outro tipo de normativos (alguns já consagrados em outros artigos da lei da televisão) que obrigue todo e qualquer operador de televisão a respeitar os valores culturais que estão no cerne das nossas comuns preocupações que se poderá e deverá evitar as consequências. negativas que alguns vêem na derrogação das limitações ao direito de estabelecimento por parte de entidades estrangeiras. Refiro-me, nomeadamente, ao artigo 19.º desta lei, que estabelece as percentagens mínimas de produção em língua portuguesa 40%- e de produção nacional - 30%.
Por isso, preferimos entender esta explicitação na lei da possibilidade de acesso ao capital de pessoas estrangeiras oriundas de países comunitários como um convite a uma maior responsabilização comum por aquilo que deve efectivamente preocupar-nos: o respeito por todos os operadores de televisão, públicos e privados, independentemente da composição do respectivo capital, um conjunto de regras de programação, regras essas que o legislador poderá no futuro até, quiçá, tornar mais exigentes e, sobretudo, a garantia do seu respectivo cumprimento, de preferência por via de uma autoridade pública independente ou de um organismo regulador de composição acima de toda a suspeita, como se. prevê no projecto de revisão constitucional que o PS acabou de apresentar.
Vou mais longe: a possibilidade de internacionalização do capital privado (que, aliás, já é um facto na TVI, com 45% em 1994) acaba, em última análise, por funcionar como mais um argumento a favor do serviço público de televisão, a ser exercido por uma sociedade de capitais públicos nacionais e à qual caibam obrigações acrescidas por comparação com as dos demais operadores privados na defesa da nossa identidade e criatividade culturais e no respeito por uma ética de antena que recuse a violência, o "voyeurismo", a vulgaridade, o sensacionalismo e a manipulação informativa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ruben de Carvalho.

O Sr. Ruben de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quem acompanhou a luta, a acção dos jornalistas nos últimos 30 anos da vida do nosso país sabe que um dos objectivos essenciais por que ela se pautou no tempo da censura e do fascismo foi, entre outros, o da clarificação dê um assunto essencial da vida dos jornais e da informação - e que respeitava à clarificação da posse material dos órgãos de comunicação social, independentemente dos que fossem.
Revelou-se - e quem trabalhou nos jornais, na rádio ou na televisão sabe-o bem - que o conhecimento público da posse do capital proprietário dos meios de comunicação social constitui um elemento fundamental da clarificação e transparência do funcionamento da comunicação social num Estado democrático. Assim o entenderam os legisladores que fizeram a lei da imprensa logo a seguir ao 25 de Abril, reflectindo não apenas a transformação de Portugal num Estado democrático mas também aquilo que tinha sido o contributo dos profissionais da comunicação social e de toda a intelectualidade portuguesa num esforço para essa clarificação, que incluía, naturalmente, a con-