O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2 DE MARÇO DE 1996 1185

Logo, concluem os recorrentes, que o projecto de lei privilegia entre dois cidadãos que porventura tenham praticado crimes do mesmo tipo, os criminosos terroristas mesmo que estes tenham visado prejudicar a independência nacional ou o funcionamento das instituições do Estado.
Segundo os recorrentes, a amnistia viola o princípio constitucional da igualdade previsto no artigo 13 º da Constituição da República Portuguesa.
Louvam-se para tal em Vital Moreira e Gomes Canotilho que, em anotação ao artigo 164.º da Constituição da República, referem também dever ser equacionado o problema da insusceptibilidade de amnistia de certos tipos de crimes, como são os crimes contra a humanidade e os crimes de responsabilidade.
Acrescentam os recorrentes que a amnistia dos tipos de crimes prevista no projecto de lei casa mal com o escopo teleológico da Constituição e com a sua matriz.
Mas a afirmação mais peremptória que fazem é a da violação do princípio, da igualdade. Apesar das considerações de Vital Moreira e Gomes Canotilho sobre a insindicabilidade da amnistia quanto à sua oportunidade e à extensão dos seus efeitos. Para os recorrentes, mesmo um acto político, sob a forma legislativa, tem de confrontar-se com o princípio constitucional da igualdade. A violação deste princípio resulta, segundo os recorrentes, de a amnistia visar os arguidos do caso FP-25 de Abril em razão das convicções políticas ou ideológicas que perfilharam.
A amnistia, porque significa o apagamento o crime, representa derrogação do sistema legal punitivo.
Muitos tecem-lhe críticas por entenderem que representa a intromissão de outros poderes na administração da Justiça.
É, no entanto, no que concerne ao perdão individual, porque dirigido a um processo em concreto, que as críticas ganham maior dimensão. Na verdade, segundo alguns autores, o perdão individual subtrai o culpado ao juiz natural, infringe o princípio da igualdade perante a lei e significa uma intolerável ingerência nos poderes exclusivos dos órgãos encarregados de administrar justiça.
Será para estes autores incompatível com o Estado de Direito, havendo mesmo quem faça tal afirmação relativamente à amnistia, porque representa a sobreposição de um poder estatal sobre o judicial.
Maia Gonçalves, contudo,, entende não ser assim.
Visando o Estado de Direito a pacificação da comunidade, poderá justificar-se que lance mão da amnistia quando entenda que político-criminalmente é mais adequado apagar determinados crimes. (Vide As medidas de graça no Código Penal e no projecto de revisão de Maia Gonçalves, in Rev. Port. de Ciência Criminal - Ano 4- Fas. 1).
Para este autor, as condições políticas, sócio-económicas ou de confrontação podem sofrer alteração, justificando-se então o uso das medidas de graça.
Outros, como Eduardo Correia e Taipas de Carvalho, aceitam a legitimidade das medidas de graça apenas quando a defesa da comunidade sócio-política é melhor realizada através da clemência do que da punição.
A amnistia não representa propriamente o apagamento do crime mas antes apagamento do dever de executar a sanção (Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime).
Assim, pode a Assembleia da República, nos termos do artigo 164.º, alínea g) da Constituição da República Portuguesa, se entender que se verificam as condições para não ser executada a sanção, quer tendo em conta a pacificação da vida comunitária, quer tendo em conta a própria socialização de arguidos, "conformar livremente o conteúdo da lei, amnistiando grupos de factos ou grupos de agentes, segundo os critérios fundados que entenda fixar e combinar da forma que repute preferível" (Professor Figueiredo Dias, obra citada).
A amnistia, porque é um pressuposto negativo da punição, e não um pressuposto negativo da punibilidade, não está relacionada com a falta de dignidade punitiva do facto. Assim, nenhum princípio há que circunscreva a possibilidade de uma amnistia a bagatelas penais.
Por outro lado, deve realçar-se que é o próprio Código Penal que torna possível a isenção de pena em crimes como ode organização terrorista e de terrorismo.
Optando, claramente, pelo aniquilamento do dever de executar a sanção, quando o comportamento dos arguidos seja de tal forma que a tutela dos bens jurídicos que o Direito Penal visa proteger se mostre melhor assegurada com a isenção de pena do que com o prosseguimento do processo crime.
Assim, esta opção do legislador mais alicerça a conclusão de que a Assembleia da República não está impedida de escolher, para amnistiar, crimes como os que constam do' projecto de lei.
Uma amnistia, como atrás se disse, citando o Professor Figueiredo Dias, envolve sempre uma selecção de factos ou agentes, ou mesmo de penas, tendo em vista situações concretas que aconselham uma determinada resposta no sentido do apagamento da sanção.
A verificação de determinadas condições tem de determinar uma escolha, ou de factos, ou de agentes. Tal como na anterior amnistia se transformaram penas de prisão em multas, relativamente a jovens e a pessoas de mais de 70 anos, sem que tal representasse violação do princípio da igualdade, porquanto se levou em consideração que a ressocialização dos mesmos se faria melhor extra-muros.
O projecto de lei visa a amnistia de factos ocorridos em certo período. As razões da escolha desse factos estão justificadas no preâmbulo.
O articulado não contém qualquer limitação à amnistia no que toca aos motivos que levaram à prática dos crimes. Não se aplicará, portanto, apenas aos casos de alegada motivação política, e muito menos será restrita aos casos em que os seus agentes estejam indiciados ou pronunciados como elementos das FP-25 de Abril. Assim, não se vê que o projecto de lei padeça de qualquer inconstitucional idade.
Neste sentido, a Comissão é de parecer que o projecto de lei n.º 107/VII não sofre de qualquer inconstitucionalidade pelo que o recurso deve ser rejeitado.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para intervenções, a Sr.ª Deputada Odete Santos, na qualidade de relatora, bem como os Srs. Deputados Barbosa de Melo, José Magalhães e Jorge Ferreira.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O relatório e parecer da comissão, aprovado por maioria, sinteticamente refere algumas questões em contraposição aos argumentos dos recorrentes. Estes entendem, para sintetizar, que, em primeiro lugar, pelos crimes que abrange, esta amnistia vai contra o escopo teleológico da Constituição e, em segundo, que viola o princípio da igualdade porque o mesmo tipo de crime cometido fora ou dentro do âmbito da organização terrorista sofre tratamento diferente.
No entanto, não foi apresentada a questão, que tem sido muito falada, da lei geral e abstracta - isso não consta dos argumentos dos recorrentes.