4212 I SÉRIE - NÚMERO 111
funcional das instituições, nomeadamente as da música, que hoje sobre todas as outras nos ocupa.
Onde está, por exemplo, em São Carlos, uma verdadeira temporada de ópera em quantidade, qualidade e equilíbrio de repertórios? Onde ficou a redefinição orgânica do mesmo São Carlos, apregoada já nos Estados-Gerais, tomada como prioridade político-cultural no primeiro estado de graça do Governo, mas que, hoje, ainda hoje, passado» dois anos, não foi posta em execução?
Pergunta-se, pois: como será possível deixar impunemente uma instituição de primeira linha na área da música durante dois anos em busca de uma identidade jurídico-funcional? Mas a verdade é que começa a tornar-se notório que o fundo da política cultural do «Governo rosa» não é mudar as coisas e os métodos para melhor mas, sim. os nomes - e só para manter um elevado diapasão propagandístico E isto tudo apesar de o Teatro de São Carlos estar agora a gastar mais do que nunca, ou seja, cerca de dois milhões e meio de contos por ano do bolso do contribuinte!
Do mesmo modo pergunta-se como é possível, perante este estado de coisas, continuar a propagandear as delícias da política de cultura de um governo.
A Orquestra Clássica do Porto foi transformada em orquestra sinfónica? Na verdade, não! Está exactamente com o seu formato primitivo inalterável. Mas o nome é que conta. Srs. e Srs Deputados: O que interessa é mudar o nome às coisas, mesmo que elas fiquem na mesma Parece que agora se acostumaram a chamar-lhe Orquestra Nacional do Porto.
Risos do PSD.
Parece que, afinal, o importante é o afastamento de mais um maestro português, o maestro Manuel Ivo Cruz, o que não admira, pois que tanto quanto sei, o maestro Ivo Cruz não afina a sua regência pela cartilha do carrilhismo socialista. Ele como outros, estava condenado ao afastamento - era só apresentar-se a melhor oportunidade.
Plano de orquestras regionais? Nem uma palavra A que existia talvez continue a existir, o que já nem é mau, as que não existiam continuam por existir, o que é, francamente, muito mau! Falo, designadamente, daquela orquestra, a das Beiras, que em 1995, no plano organizativo. estava praticamente pronta, e ainda não nos deu a ouvir um acorde, por imperfeito que fosse.
A política da música poderá conter em si todas as maravilhas que o ministro e seus passados, presentes e futuros ajudantes quiserem apregoar, mas a verdade é que não se vê e tão pouco se ouve, não soa como música, não passa de um reclame publicitário.
O esbanjamento governamental, nos seus processos já comprovadamente ineficazes de atirar com dinheiro a cada problema que se levanta, dá como resultado comprometer seriamente o futuro das instituições que tutela, o que é igual a comprometer a efectiva criatividade dos agentes artísticos e a efectiva e melhorada vivência cultural da comunidade, porque não há dinheiro ou porque o dinheiro que houve foi usado como extintor de fogos de palha que pareciam decisivos e estratégicos aos olhos de quem não tinha qualquer experiência das realidades governativas, nem sequer tem a visão do longo prazo.
E também foi ouvido há dias ao ex-secretário de Estado, em curta intervenção radiofónica, o queixume de não ter verbas para governar de facto as áreas que lhe estavam cometidas, confessando na ocasião o que já todos os interessados tinham advertido, a saber que a reformulação orgânica do Ministério em empresa de custos avantajados, a devorar verbas que fatalmente escasseariam para os projectos marcadamente culturais, o que quer dizer que as reformas orgânicas dad.is como imprescindíveis para alimentar o fogo de barragem da propaganda do Governo - e, passados dois anos. ainda não de todo implementadas, o que deve ser caso único no mundo! acabaram por nada mais conseguir do que fazer estagnar a realização dos ideais e projectos que davam visibilidade e proveito a uma real política de cultura.
Mas a reforma orgânica do Ministério tinha um mais impressionante escopo, qual seja o de reforçar o poder pessoal e o centralismo do ministro. Aliás, nem compreendo para que foi nomeado um novo membro do Governo para o lugar do demitido se o Ministro lhe retirou todas as substanciais atribuições e competências!...Podia continuar como adjunta, tornando o Governo mais escorreito, pelo menos no que toca ao número total dos seus membros.
Mas a questão, Sr.ªs e Srs. Deputados, está em que este Ministério da Cultura governa como quem trabalha a dias. Tem, como todo o restaurante que se preza, o seu prato do dia e têm também as políticas culturais deste governo a condição dos produtos congelados É preciso descongelar e pôr ao serviço. É para aquele dia e não para outro E se passa aquele dia e não é usado, deteriora-se o produto, talvez porque a sua qualidade é precária.
Há dias para tudo neste governo cultural. Até o património tem dias para este Governo. O património para este Governo é uma questão de dias: pode ser um podem ser dois. podem ser sete, que é número mágico. E passados os dias estipulados na embalagem, foi-se a validade e é melhor esquecer o produto E passados os dias do património, por exemplo, o que se constata é que as políticas são vazias e nada de novo ou de vivo foi feito.
Sr.ªs e Srs Deputados, que intervenções patrimoniais marcantes foram efectuadas nesta área por este Governo? Que obra importante, que realização extraordinária ou que projectos lançados ou realizados por este Governo ficam retidos na memória dos portugueses ao fim de sete dias de comemorações?
Nenhuma, a não ser mais uma promessa de estudar o desvio de uma estrada! Aliás, ao sétimo dia das comemorações ficámos todos a saber que se demitiu mais um responsável pelo Programa Prócôa, que, segundo as suas palavras, estava cansado de esperar pelos meios que lhe permitissem fazer algo pelo Património Cultural. E isto. Sr.ª e Srs. Deputados, cinco meses volvidos da demissão do anterior responsável pelo Prócôa, o agora ilustre Deputado da bancada socialista, Dr. Júlio Meirinhos, ao que parece também ele cansado de esperar.
Muito falam os responsáveis político-culturais, os que ainda estão em vigor e os póstumos, da pesada herança que receberam. Pois eu diria que é isso o que lhes vai valendo. Uma herança que é pesada em potencialidades para quem a souber aproveitar, mas, sobretudo, também pesada em responsabilidades para quem nada mais pode e sabe do que desprezá-la enquanto se vai servindo dela. Uma herança que, também o digo, não tem sido honrada como merecia e sem a qual nunca teria havido qualquer show-off ministerial.
Sr.ªs e Srs. Deputados: Que fique, pois, assinalada neste Hemiciclo a passagem de mais um Dia Mundial da Música, com o voto de que melhores dias possam acrescer às instituições musicais portuguesas que nem forças