576 I SÉRIE - NÚMERO 15
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro das Finanças, os Srs. Deputados Francisco Torres, Lino de Carvalho e Luís Queiró.
Como o Governo já não dispõe de tempo para responder, pergunto aos Srs. Deputados que se inscreveram se cedem tempo ao Sr. Ministro.
Informam-me que o PS cede 5 minutos ao Sr. Ministro das Finanças. Assim sendo, tem a palavra, Sr. Deputado Francisco Torres.
O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, tenho pouco tempo para tecer algumas considerações sobre esta matéria - condicionalismos da vida parlamentar que, muitas vezes, não compreendemos -, mas gostava de começar por me referir a uma afirmação que o Sr. Ministro das Finanças agora fez, e que está também exposta num jornal de hoje, sobre a responsabilização do Banco Central Europeu.
Julgo que há democraticidade em todo este processo, no entanto é bom responsabilizar as autoridades independentes. A autonomia do Banco Central Europeu, e, por isso, a autonomia dos bancos centrais nacionais, também se traduz na sua responsabilização. Ora, no modelo europeu, que não é federal, é difícil saber a quem responde o Banco Central Europeu. Não é. certamente, aos parlamentos nacionais - aliás, as várias considerações desta proposta afirmam-no claramente, de acordo com os estatutos do sistema europeu de bancos centrais, do Banco Central Europeu e do próprio Tratado -, mas há que saber se os próprios objectivos, estatutária e democraticamente consignados, estão a ser cumpridos.
O Sr. Ministro das Finanças tem defendido uma posição nesse sentido - que eu diria mais próxima da posição francesa -, a de haver um contrapeso económico por parte do Conselho ECOFIN. Fala aqui no bom entendimento entre o Conselho ECOFIN e o Banco Central Europeu, e acho que isso, obviamente, é importante, mas julgo - e isto está claro numa proposta de resolução apresentada pelo PSD sobre o Tratado de Amsterdão, sobre a Conferência Intergovernamental - que as instituições supranacionais, como o Banco Central Europeu ou a Comissão, devem ser responsabilizadas perante órgãos supranacionais, como é o Parlamento Europeu, e os aspectos de natureza intergovernamental devem responder perante os parlamentos nacionais. Nesse sentido, defendo - e gostava de ouvir a opinião do Sr. Ministro - que deve ser encontrada uma forma mais clara, mais nítida de responsabilização do Banco Central Europeu, sem perder a sua independência nem autonomia na condução da política monetária, como é óbvio, na prossecução do seu objectivo estatutário, perante o Parlamento Europeu.
Em segundo lugar, há aqui um aspecto pouco claro, quer relativo ao Conselho de Auditoria - aspecto esse que tinha sido apontado pelo Instituto Monetário Europeu e no qual não há grandes alterações mas, com certeza, ele retirou a objecção -, quer no que se refere ao artigo que consagra a função de prestamista de última instância por parte do Banco Central - que teria levantado também alguns problemas por parte do Instituto Monetário Europeu a alguns dos bancos centrais, mas, pelos vistos, ficou aqui, se não se mantém qualquer objecção.
Volto a perguntar de forma mais clara ao Sr. Ministro das Finanças se não considera que o facto de os avisos em matéria de supervisão bancária poderem ser assinados, como acontece já nas outras duas instituições de supervisão, apenas pelo Governador do Banco de Portugal não poderia trazer mais transparência ao próprio processo de supervisão. Lembro que a falta de transparência deste processo, muitas vezes, resulta de não se saber de quem é a responsabilidade clara. Autonomia significa sempre responsabilidade e os casos de falta de transparência verificados nos anos
90 em Portugal e em Espanha resultam dessa falta de responsabilização.
O Sr. Presidente: - Informado de que o Sr. Ministro das Finanças responde conjuntamente aos três pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, duas expressões percorrem permanentemente o preâmbulo desta proposta de lei e a intervenção do Sr. Ministro: autonomia e independência. Seria bom falarmos sobre elas, porque, no mínimo, o que se pode dizer é que são expressões equívocas e estamos a jogar com as palavras.
Na verdade, há autonomia e independência em relação ao País e aos interesses nacionais, mas, como, aliás. está traduzido nas preocupações, segundo a imprensa. que o Sr. Ministro ontem terá emitido em Estrasburgo e no discurso insuspeito do Sr. Deputado Francisco Torres. há dependência total em relação ao Sistema Europeu de Bancos Centrais, ao Banco Central Europeu, às orientações emitidas pelo Banco Central Europeu e aos interesses financeiros que comandam o Banco Central Europeu. que não são. seguramente, os interesses nacionais, aproximando-se muito mais dos interesses do Bundesbank.
Esta é a questão, porque não há, mesmo no quadro do modelo que os senhores aceitam e nós não, qualquer mecanismo que possa responsabilizar o Banco Central Europeu ou, por extensão, o banco central nacional, respectivamente, em relação aos Estados membros ou em relação ao seu país.
Talvez o exemplo mais paradigmático disso esteja na forma de eleição do governador e na sua forma de demissão. O governador e os administradores são eleitos ou nomeados pelo Governo português, mas só podem ser demitidos se violarem os estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais, do Banco Central Europeu. Isto nada tem a ver com a legislação nacional, nada tem a ver com os interesses nacionais.
De facto, Sr. Ministro, estamos a alterar os estatutos do Banco de Portugal com vista à sua integração no Sistema Europeu de Bancos Centrais e, com isto, o País não só perde todas as possibilidades de ter mecanismos de intervenção na política monetária, decorrentes, aliás, da moeda única, como perde também qualquer possibilidade de, através do banco central nacional, ter alguma intervenção de responsabilidade na defesa dos interesses nacionais, no quadro da política monetária e das políticas cambiais.
Esta é uma questão central, preocupante para a defesa dos interesses da economia portuguesa, quando ela, por exemplo, divirja - e seguramente divergirá muitas vezes - dos interesses das economias dominantes na Europa.
Portanto, Sr. Ministro, esta é uma questão que, independentemente do modelo, que os senhores aceitam e nós não - e aí somos claro -, seguramente nos deve preocupar a todos e em relação à qual não há respostas, não há qualquer compatibilização entre autonomia, independência e responsabilização. São tudo palavras piedosas para esconder a questão central da total dependência futura do