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13 DE FEVEREIRO DE 1998 1333

do direito à investigação de paternidade ou de maternidade. A questão põe-se, obviamente, em sede de investigação de paternidade, porque são puramente académicas as hipóteses de investigação de maternidade.
De resto, Portugal, como a França, a Suíça, o Luxemburgo e a Bélgica, mas não como a Itália, os Países Escandinavos, a Áustria, a Polónia e recentemente, com algumas restrições, a Espanha, mantém que razões de certeza e segurança do direito não vão no sentido de que seja imprescritível o direito a que alguém investigue a sua paternidade.
Ora, o que se tem passado até aqui é que, numa interpretação que não perfilhamos e que gostaríamos a Câmara não perfilhasse, se tem entendido que o ónus da prova no decurso do prazo - aliás, muito curto - de um ano recai sobre quem investiga, num entorse a princípios gerais que os juristas têm dificuldade em aceitar, uma vez que o decurso do prazo de propositura de uma acção é um prazo de caducidade e deveria, como excepção peremptória, estar sujeito ao ónus da prova por parte de quem deduz a excepção.
Por outro lado, era ainda importante que se estabelecesse e que se fixasse o que deve entender-se por cessação do tratamento como filho. A lei é equívoca nesse domínio e basta citar um mestre de direito, o Prof. Pereira Coelho, de Coimbra, até porque, sendo um mestre eminente, ele exprime o entendimento geral da doutrina. Em princípio, a cessação do tratamento deverá ser interpretada como uma cessação voluntária por uma modificação da atitude psicológica de quem deixa de tratar como filho alguém que começou a tratar como tal.
Isto significa que é muito difícil para o investigante, sobretudo ao longo dos anos, conseguir manter a prova de que continuou a ser tratado como filho por alguém que obviamente não é seu familiar. A própria vida faz com que as pessoas emigrem, os laços de convivência desapareçam... Por outras palavras, é muito mais notório aferir de um tratamento como filho de alguém que é recém-nascido, que está nos primeiros tempos de vida, do que através da vida das pessoas, que, entretanto, se separam e deixam de se encontrar.
Por isso é que, por exemplo, se tem colocado na jurisprudência a questão de se há ou não cessação do tratamento como filho quando o investigado está em coma, em estado de pré-coma, casos típicos da jurisprudência, ou em situação em que a sua saúde mental lhe não permite exprimir, livre e seriamente, a sua vontade.
Por outro lado, no fundo, não se tratando aqui o tratamento como filho de um caso técnico de posse de estado, mas sendo uma situação muito próxima dessa, sempre nos ensinaram que a regra é a de que a posse de estado é irretratável.
Por outro lado ainda, a própria possibilidade de propositura de acção nas circunstâncias que o actual, n.º 4 do artigo 1817.º do Código Civil estabelece tem muito a ver com o argumento de uma certa repugnância moral para que alguém, em vida do investigado, instaure contra, ele uma acção de investigação, até porque é legítima a expectativa de que, mais tarde ou mais cedo, o investigado voluntariamente assuma' a sua paternidade, sabendo nós que é corrente, embora não seja do dia-a-dia, que, pela via testamentária - e o testamento é o veículo adequado a que tal aconteça -, alguém reconheça outrem como seu filho.
Numa palavra, entendemos que se passaram anos de mais de dúvidas e de hesitações e que esta é uma matéria que tem de essencial a dignidade humana e o direito à identidade das pessoas, pelo que não se pretende com isto um facilitismo na área da investigação de paternidade, mas tão-só tornar claro aquilo que, já hoje, repito - e com isto concluo -, em certo entendimento, que nos parece o melhor, já resulta da lei, tendo nós apenas a necessidade de introduzir mais um número no artigo 1817.º do Código Civil para prevermos a hipótese, não negligenciável, do caso de pré-morte do filho, sabendo nós que o cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens e os descendentes do filho investigante têm legitimidade, nos termos do artigo 1818.º do Código Civil, para intentar a acção.
Era isto, muito rapidamente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, para abrir o debate, me cumpria, com muito gosto, transmitir a VV. Ex.as.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça; fazendo uma referência muito breve a esta iniciativa legislativa do Governo, direi que esta Câmara, sendo política, é hoje aqui chamada a discutir uma questão essencialmente técnica. Portanto, nem me sinto sequer especialmente legitimado a tirar muito tempo à Câmara com esta proposta de lei.
No entanto, Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados, não quero deixar de dizer o seguinte: mexer no Código Civil, que é um diploma estruturante do nosso sistema jurídico civil, era algo que apenas se deveria fazer em momentos, decisivos. Fez-se a propósito do Direito da Família, em 1977, na sequência das evoluções sociais de todos conhecidas; fez-se a propósito do regime do arrendamento urbano - e aí, do meu ponto de vista, timidamente, mas com razão. Agora, alterar um diploma que tem um prazo de vida longo e é, ele próprio, um instrumento de certeza e segurança jurídica, a propósito da matéria em debate parece-me desnecessário e pouco oportuno.
Julgo que esta pequena alteração, para resolver questões jurisprudências e da doutrina, em casos que, apesar de tudo, são cada vez mais raros, não me parece absolutamente indispensável e não contribui para essa estabilidade do Código Civil ao longo da sua vida.
Além de tudo o mais, Sr. Secretário de Estado, quero dizer-lhe que penso que este diploma não resolve as questões essenciais, mantendo alguma incerteza relativamente à questão de saber se o prazo de propositura da acção é um prazo de caducidade ou não, o que tem influência nas regras da repartição do ónus da prova.
Por outro lado, este direito à identidade, ao conhecimento da paternidade ou da maternidade, continua a ser um direito que, apesar de ter dignidade constitucional, está sujeito a prazo de caducidade e julgo que esta é a questão mais importante. Os investigantes podem recorrer ao tribunal para o efeito durante a sua menoridade e depois