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13 DE FEVEREIRO DE 1998 1341

A iniciativa legislativa popular constitui matéria estruturante do nosso regime político democrático, assumindo-se com densidade materialmente constitucional. Foi talvez por isso matéria que recolheu largo consenso em sede de revisão da Constituição da República Portuguesa; é matéria que, pelo seu objecto, deve continuar a merecer largo consenso nas soluções concretas a serem adoptadas. Pela nossa parte, tudo faremos para que esse consenso alargado possa continuar a existir.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entregar a iniciativa da lei também aos cidadãos, assumamo-lo sem preconceitos, significa adoptar mais um instituto de democracia directa na nossa democracia essencialmente representativa. Por nós, assumimo-lo com a mesma alegria com que um pai recebe o seu filho pródigo há já tanto tempo longe da sua casa paterna. Sabemos, porém, das reticências que outros sempre colocam a estes institutos próprios da democracia directa, sentindo-se quase de luto por mais uma limitação da intocável democracia representativa.
Assim aconteceu pela consagração do referendo. Assim continua a acontecer para que o referendo saia da bonita letra de forma e se torne uma efectiva realidade operante. Esperemos que, também consagrada na lei a iniciativa legislativa popular, ela possa rapidamente ser utilizada pelos cidadãos numa demonstração pujante de participação e de cidadania.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa Constituição sempre consagrou formas de participação directa dos cidadãos na vida pública. E, ao longo das sucessivas revisões constitucionais, têm vindo a ser desenvolvidas e aprofundadas essas formas de democracia participada e acrescentadas outras, como as que hoje debatemos. A Constituição claramente reconhece e incentiva a participação colectiva dos cidadãos em associações e partidos políticos, a par de outras organizações de intervenção social, como organizações de trabalhadores, associações de consumidores ou de defesa do ambiente e do património. Diga-se, porém, que a Constituição sempre privilegiou mais a vertente participativa no campo social e económico e a nível da Administração Pública do que no campo político e legislativo. Nestes últimos, a participação era limitada, em quase exclusivo, aos partidos políticos, com o seu monopólio de apresentação de candidaturas aos órgãos do poder político bem como à participação nos procedimentos legislativos laborais e de planificação económica.
Compare-se este défice político e legislativo de participação com a abertura total da Administração Pública ao cidadão, através da consagração constitucional de amplos direitos de participação na gestão e na formação de decisões administrativas, bem como no direito de acção popular para defesa dos mais variados interesses públicos. Convenhamos que o legislador se comportou egoisticamente. Consciente da luta renhida que teve de desenvolver para conquistar ao Governo monárquico o direito de iniciativa da lei e as suas prerrogativas de legislador principal, viu sempre com reticências a possibilidade de largar parte do seu poder para outros. Se é necessário fazer participar os cidadãos na coisa pública, então abra-se a Administração, más mantenha-se fechado o legislador.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não pretendemos advogar o regresso ao sistema das Assembleias do Povo, das Eklesias da clássica Atenas, modelo aliás abandonado pela sua permissividade aos demagogos e, sobretudo, pela sua impraticabilidade nas sociedades actuais. Mas, sendo o Governo representativo uma necessidade, mais do que um desejo, somos totalmente favoráveis a permeá-lo com os institutos de democracia directa que as sociedades contemporâneas permitam. Para que a democracia seja efectivamente o Governo do Povo é preciso que o Povo seja chamado a participar na coisa pública o mais possível. Não apenas como legitimante da actuação dos seus representantes, mas também como interveniente directo nas escolhas do seu destino. Ou seja, é preciso que os cidadãos intervenham muito para lá da mera participação em eleições.
Nas palavras esclarecidas do saudoso mestre Baptista Machado: «O sufrágio universal a nível do país, pelos factores de autocracia que comporta, pela distância a que se acham do cidadão comum os centros de decisão, que a partir desse sufrágio se constituem, revela-se insuficiente para dar à maioria dos indivíduos o sentimento, a vivência da participação eficaz na modelação dos seus próprios destinos e do destino da colectividade. Pressente-se a gestação e o eclodir de antagonismos explosivos e de enormes frustrações, dentro de uma sociedade técnica que está já para além da escala humana. Tais antagonismos, insatisfações, frustrações, representam uma ameaça séria para a integridade e subsistência da comunidade política, pois tendem a encontrar a sua descarga em acções de revolta e mesmo em actos terroristas. Surge assim aquele fenómeno que já recebeu o nome de oposição extraparlamentar».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa Constituição admitiu já o direito de os cidadãos apresentarem petições à Assembleia da República, exigindo desta um pronunciamento e uma resposta aos peticionantes. Na última revisão da Constituição, no artigo 167.º, deu-se um passo muito mais importante: o cidadão tem agora a possibilidade de iniciar o procedimento do referendo e da lei. É um passo qualitativamente superior. Se na petição o cidadão apenas podia esperar que o Parlamento tomasse conhecimento das suas preocupações, agora, com a consagração da iniciativa popular do referendo e da lei, o cidadão obriga ó Parlamento a tomar uma decisão de fundo sobre o problema. Não podem, pois, ser confundidos os institutos. Cada um com a sua valia, mas significando a iniciativa popular um estádio de participação do cidadão mais elevado e exigente. Razão por que os dois institutos não podem ser dotados do mesmo regime jurídico. Razão também por que, no nosso projecto de lei, se desburocratizou o procedimento de admissão e se densificou o direito de participação procedimental. São duas vertentes, para nós, essenciais à concretização do novo comando constitucional.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por um lado, consideramos essencial que não sejam frustradas as expectativas dos cidadãos proponentes. Tendo eles reunido o número de assinaturas necessárias, deve o seu projecto de lei popular ser apre