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13 DE FEVEREIRO DE 1998 1339

contas estão certas, a exigência de 26 779 assinaturas de cidadãos para apresentar uma iniciativa legislativa.
Trata-se, em ambos os casos, de uma exigência manifestamente excessiva e desencorajadora do exercício do direito de iniciativa legislativa. Não se compreende que o número de assinaturas exigido para apresentar um projecto de lei à Assembleia da República seja cinco vezes superior ao número de assinaturas necessário para fundar um partido político e muito mais do que o triplo das assinaturas necessárias para apresentar uma candidatura à Presidência da República.
Não faz sentido que nos argumentem com o Direito Comparado, dizendo que, por exemplo, em Espanha, na Itália ou no Brasil a exigência é maior. O conhecimento do Direito Comparado permite-nos seguir bons exemplos, onde eles existam, mas não nos obriga, a seguir os maus.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Uma outra ordem de questões diz respeito aos requisitos formais das iniciativas.
As exigências de identificação dos proponentes, constantes do projecto do PS, são manifestamente excessivas. Faz sentido que, como o PCP propõe, os proponentes indiquem o nome, a residência e o número de eleitor. Daí até às exigências propostas pelo PS, de, para além disso, terem ainda de indicar o bilhete de identidade e reconhecer a assinatura, vai, de facto, uma enorme distância. Para quê indicar o número do bilhete de identidade se ele já consta do cartão de eleitor? E se o reconhecimento notarial das assinaturas já não é exigido para coisa nenhuma, nem sequer para as candidaturas eleitorais, por que é que há-de passar a ser exigido para apresentar iniciativas legislativas?
Quanto às próprias iniciativas, entende o PCP que deve ser exigido que os proponentes definam concretamente o sentido das modificações que pretendem introduzir na ordem legislativa, mas a admissão da iniciativa não deve ficar dependente da perfeição técnica com que seja apresentada. E entendemos mesmo que a Assembleia da República, através dos seus serviços, deve colaborar activamente com os cidadãos, de modo a adequar, tecnicamente, a iniciativa aos fins visados pelos proponentes.
A iniciativa popular é um direito dos cidadãos, não é, necessariamente, um direito dos juristas. Os cidadãos não são obrigados, a saber articular uma iniciativa legislativa ou a conhecer os requisitos técnicos complexos da elaboração das leis. Daí que, ao contrário dó que propõem o PSD e o PS, não se tios afigure essencial que a iniciativa legislativa popular deva ter, à partida, a forma articulada ou cumprir os requisitos técnicos que são próprios das iniciativas parlamentares ou governamentais. Essa é uma mera questão de aperfeiçoamento que a própria Assembleia, em diálogo com os representantes dos proponentes, pode perfeitamente ajudar a resolver.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Outra questão diz respeito às matérias que podem ser objecto de iniciativa legislativa popular, sendo certo que existem, à partida, limitações óbvia.
Uma das limitações tem a ver com o respeito pela Constituição e pelos princípios nela consignados, não podendo ser admitidas iniciativas cuja aprovação possa ter como consequência a introdução de normas inconstitucionais na ordem jurídica.
Em segundo lugar, o respeito pela chamada «lei-travão» implica que não possam ser admitidas iniciativas que envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento. Pode, no entanto, manter-se a iniciativa desde que os proponentes aceitem que a sua vigência só se inicie no ano económico seguinte.
Uma terceira limitação diz respeito às matérias em que a iniciativa é expressamente reservada pela Constituição a determinadas entidades, pelo que é óbvio que não podem os grupos de cidadãos apresentar propostas de Orçamento do Estado, de Lei Orgânica do Governo, de Estatuto Político-Administrativo das Regiões Autónomas.
Entendemos, porém, que os limites devem ser apenas estes! Em tudo o mais, devem os cidadãos poder apresentar iniciativas legislativas. Para o PCP, devem poder ser objecto de iniciativa popular todas as matérias sobre as quais a Assembleia possa legislar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Discordamos, por isso, frontalmente, da proposta constante do projecto do PS, no sentido de excluir do âmbito da iniciativa legislativa popular quase todas as matérias incluídas na reserva absoluta de competência da Assembleia da República, limitando-a às matérias incluídas na reserva relativa. Esta limitação não faz sentido, porquanto a iniciativa legislativa popular não conflitua em nada com a competência legislativa da Assembleia da República. Ninguém propõe que esta Assembleia compartilhe as competências que tem em matéria legislativa, o que a Assembleia compartilha com os cidadãos é apenas o direito de iniciativa. E, quanto à aprovação das leis propostas, só a Assembleia o pode fazer. Por que razão há-de, então, ser limitado o direito de iniciativa dos cidadãos? Não vemos razão nenhuma para essa limitação!
Quanto à tramitação, registamos positivamente o facto de todos os projectos convergirem na necessidade de serem estabelecidos prazos para a realização das várias etapas do processo legislativo, o que, a não ser feito, poderia frustrar o sentido útil do direito de iniciativa. E registamos também positivamente a intenção constante de todos os projectos, de criar condições para que os cidadãos proponentes possam acompanhar o andamento das suas próprias iniciativas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não obstante as divergências que referi, existem condições reais para que, ponderadas todas as questões, em sede de especialidade, esta Assembleia aprove uma lei da iniciativa legislativa popular que seja um importante passo em frente em matéria de direitos dos cidadãos e no relacionamento entre a Assembleia da República e o povo português.
O Grupo Parlamentar do PCP tudo fará para que este objectivo seja alcançado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado António Filipe, tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.