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1824 I SÉRIE - NÚMERO 54

é reconhecida como a cientificamente mais correcta, a morte cerebral. Devo recordar que uni parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, o parecer n.º 10/95. entendia que o critério da morte cerebral é o único aceitável e hoje praticamente universal. No entanto, o Governo assim continua a não entender e a colocar em alternativa o critério tradicional e o critério da morte cerebral.
Por isso, no fundo, aquilo que teríamos claramente de perguntar é: em que ficamos? Se ficamos com o critério tradicional, afirme-se isso, ou se ficamos com o critério hoje unanimemente reconhecido, o da morte cerebral. É que os portugueses poderão ficar com esta dúvida e pensar, no caso de estarem numa situação de doença grave, que talvez o melhor seja ir morrer ao estrangeiro, onde a verificação da morte se faz com base na morte cerebral, do que ficar num hospital português sujeito a critérios tradicionais que não asseguram, de forma alguma, que a verificação da morte seja tida com base nos últimos critérios reconhecidos internacionalmente pelos técnicos da especialidade. Como vê, Sr.ª Ministra, nesta questão a hesitação não pode permanecer.
A segunda questão tem a ver com a governamentalização. Já aqui foi dito que na lei hoje em vigor se refere e reconhece claramente a autonomia da Ordem dos Médicos. Ou seja, na lei em vigor remete-se para a Ordem dos Médicos, por se considerar a entidade competente, a fixação dos critérios, ouvido o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, enquanto que agora, na proposta de lei que nos é presente, a autonomia da Ordem dos Médicos é cerceada na medida em que continua a fixar os critérios mas não têm qualquer eficácia, porque só terão eficácia após a sua aprovação pelo Governo através de despacho da Ministra da Saúde. Isto é uma clara governamentalização, o cerceamento da autonomia da entidade que, tecnicamente, é a única que tem capacidade para definir os critérios.
Aliás, a Sr.ª Ministra da Saúde foi clara ao dizer que o Governo não iria, na sua aprovação, exercer algum juízo técnico sobre os critérios fixados pela Ordem dos Médicos. Então, Sr.ª Ministra, para quê sujeitar os critérios definidos pela Ordem dos Médicos a um despacho da Ministra da Saúde?!
Diz-nos, em justificação deste facto, algo que nos parece perfeitamente absurdo, se me permite, que, no fundo, chega à consideração de que unia lei aprovada na Assembleia da República - esta lei, a ser aprovada na Assembleia da República - não chega para uniformizar a aplicação desses critérios nos serviços dependentes do Ministério da Saúde, e que, por isso, não chegando a lei, precisa de um despacho do membro do Governo. Perdoe-me, mas é perfeita e juridicamente absurdo dizer que não chegando a lei chega antes um despacho da Ministra da Saúde! Este argumento não pode, claramente, prosseguir. Não há qualquer razão - e a Sr.ª Ministra não invoca uma - para a governamentalização desta matéria, aliás, contrária a todas as experiências europeias que regulam este critério de verificação da morte.
Terceira questão: o secretismo. A lei actual prevê a publicidade dos critérios de verificação da morte na I Série do Diário da República, que é aquela que, como todos sabemos, será a mais lida e a mais verificada por todos os que tenham interesse nesta matéria. Prevê agora esta proposta de lei que os critérios de verificação da morte sejam remetidos para o «secretismo» da II Série do Diário da República, que raramente é consultada por todos os interessados. Se ainda fosse a III Série do Diário da República, tendo em conta, segundo penso, que será mais lida do que a própria II Série... !
Não se entende este défice claro de publicidade de uma matéria que, a meu ver, deveria ser tornada pública o mais possível, por se tratar, como é óbvio, de matéria de interesse de todos os cidadãos.
Sr.ª Ministra e Srs. Deputados, estamos obviamente disponíveis para, em sede de especialidade, fazer as alterações que se afiguram necessárias neste diploma. Penso, no entanto, que teria sido útil que o Governo tivesse presente a esta Assembleia uma proposta claramente de acordo com as orientações, pacíficas, que vigoram em toda a Europa e na classe médica e tivesse permitido que não fossem necessárias tantas «obras» como as que aqui anunciei.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Marques.

O Sr. Alberto Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Moreira da Silva, a matéria em apreço é de facto uma matéria muito séria, que não permite que haja alguma tentação, mesmo que ligeira, de tergiversar ou de resvalar um assunto tão sério para a divergência político-partidária.
V. Ex.ª citou posições da Ordem dos Médicos e do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, mas lamento que o não tenha feito de uma forma completa. É que fez uma citação correspondente ao parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida de 1994, o parecer n.º 6, mas provavelmente esqueceu-se de referir que o mesmo órgão, depois de um novo texto apresentado pela Ordem dos Médicos, emitiu um parecer, tal qual consta do relatório aprovado ontem na 1.ª Comissão, no qual, de uma forma muito clara, diz concordar em absoluto com os critérios definidos pela Ordem dos Médicos. Aquilo que está em causa é a semiologia médica da avaliação do estado de morte, o que está, de uma forma muito clara, definido neste momento no nosso país por quem de direito, que são efectivamente os técnicos, a Ordem dos Médicos. E isso deveu-se, Sr. Deputado, à iniciativa do Governo e ao grupo de trabalho que foi criado, o que importa salientar.
Também importa salientar, Sr. Deputado, que esta proposta de lei vai evoluir de uma forma muito séria, porque até agora a questão da morte cerebral apenas era exigida para as situações de recolha de órgãos e de transplantes e a partir de agora, se assim o quisermos, será para todas as situações de morte. É importante vincar isto aqui.
Pergunto-lhe, pois, ao ter omitido o parecer final do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, se o fez efectivamente por omissão ou por não ter dele conhecimento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Marques, penso que há uma clara desatenção de V. Ex.ª. Esta matéria é extraordinariamente importante, pelo que talvez devesse merecer uma melhor atenção por parte de V. Ex.ª.
Com efeito, não referi o parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciência da Vida n.º 6/94 mas, sim, o