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28 DE MARÇO DE 1998 1825

parecer n.º 1O/95. Talvez V. Ex.ª não o conheça, mas posso facultar-lhe uma cópia. Também conheço o parecer n.º 6/94, mas este nada tem a ver com o que aqui citei, e com o que estou de acordo. Seria. pois, interessante facultar-lhe uma cópia deste último parecer do Conselho.
Gostava aqui de colocar ao Sr. Deputado o seguinte desafio: estão ou não o PS e o Governo disponíveis para, na especialidade, fazerem alterações a este diploma já que, como se viu aqui, há um largo consenso para que sejam feitas? Está ou não de acordo com este desafio? Se estiver, penso que teremos condições para aprovarmos este diploma na generalidade e depois fazerem-se alterações. Se o Governo e o PS não aceitam este desafio de podermos fazer as alterações que se afiguram necessárias, penso que, então, este diploma estará claramente prejudicado à partida.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amara]): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Marques.

O Sr. Alberto Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, Sr.ªs e Srs. Deputados, a primeira ideia que me surge ao iniciar este debate parlamentar, em que se discutirão normativos sobre a verificação da morte, é justamente a vida e o valor que ela encerra. A morte biológica é, afinal, o brevíssimo ponto final da fruição terrena, espiritual e social que a vida individual contém. A vida vale sempre pela própria vida, mesmo quando agreste e difícil em situações limite. Ao invés, a morte nunca vale por si mesma. É sobre esse terrível momento da fragilidade humana - a morte - que importa clarificar critérios científicos da sua definição e respectiva verificação médica que, em certas situações, exige um nível mais especializado em termos médico-legais. Em qualquer caso, considerando-se sempre os valores da vida humana e toda a sua dignidade e respeito pela pessoa morta.
Em termos concretos, o Governo, ao apresentar a proposta de lei vertente, pretende clarificar os princípios respeitantes à verificação da morte, quer em ambiente hospitalar, quer fora deste. A proposta de lei n.º 1O4/VII é uma lei necessária e premente. Com ela, Portugal aproximar-se-á também dos diversos países da Europa em matéria de regras jurídicas aplicáveis à verificação da morte. O seu objecto principal é, pois, o de estabelecer os princípios em que se baseia a verificação da morte, daí que se identifiquem como critérios de verificação da morte a verificação da cessação irreversível das funções cardio-circulatória e respiratória ou da cessação irreversível das funções do tronco cerebral. A importância e delicadeza das matérias justificam a sua autonomização em diploma próprio, separando a temática da verificação da morte da disciplina subjacente à colheita e transplante de órgãos e tecidos de origem humana, plasmada na Lei n.º 12/93, de 22 de Abril.
A revolução da medicina e da biotecnologia veio emprestar renovada acuidade e redobrado dramatismo às interrogações suscitadas pelo processo científico e tecnológico da modernidade, estando agora em causa intervenções que têm como objecto nada mais que o próprio homem na sua integridade e na sua vida. A biomedicina e a medicina em geral têm, por isso, de ser alvo de meditação atenta, objectiva e serena em diversos campos. Em matéria como esta, respeitante ao estado das pessoas, em que se pretende, à luz dos actuais conhecimentos científicos, fixar critérios de morte cerebral, não há lugar para tergiversar sobre detalhes desnecessários. Mas, o elemento biológico central é o cérebro humano, que, afinal, é tanta coisa! Ele é sede do espírito; é consciência; é sensação acompanhada de conhecimento, é comando de todas as coisas. Ele é ainda um mundo quase desconhecido. O nosso sistema nervoso é a organização mais complexa do Universo. Para os cientistas, a actividade cerebral e a actividade do espírito terminam simultaneamente com a morte cerebral. A personalidade cessa com a morte, e o Código Civil reconhece-o no seu artigo 68.º.
A premência em clarificar esses princípios respeitantes à definição e à metodologia da verificação da morte justificou, por parte do Ministério da Saúde (como, há pouco, tivemos oportunidade de ouvir, de viva voz, pela Sr.ª Ministra da Saúde), a criação, em Dezembro de 1996, de um grupo de peritos entre os quais se incluíram representantes da Ordem dos Médicos, do Instituto de Medicina Legal e diversos médicos especialistas em neurocirurgia. Esse grupo produziu resultados que se reflectiram num conjunto de recomendações sobre a verificação da morte, a primeira das quais considerar necessário definir, em diploma autónomo, os princípios que enquadram a verificação da morte, contemplando como critérios da sua verificação a cessação irreversível das funções do tronco cerebral - a que se designa morte cerebral. Na sequência dessa iniciativa da saúde, surge a formulação de uma recomendação à Ordem dos Médicos, no sentido de se definirem os critérios técnico-científicos de verificação da morte.
A inovação proposta corresponde, pois, à necessidade de, com toda a segurança, identificar a verificação da cessação irreversível das funções cardio-circulatórias e respiratórias ou a verificação da cessação irreversível das funções do tronco cerebral (morte cerebral) aplicável nestes casos de sustentação artificial das funções cardio-circulatória e respiratória como critérios de verificação da morte e estabelece o respectivo processo.
Mais especificamente, a proposta, no n.º 3 do artigo 2.º. identifica os critérios que estabelecem a verificação da morte: cessação irreversível das funções cardio-circulatória e respiratória ou cessação irreversível das funções do tronco cerebral, morte cerebral, aplicável nos casos de sustentação artificial das funções cardio-circulatória e respiratória.
Esta verificação da morte é da competência dos médicos. Nos termos da lei. dispõe-se adequadamente que é a Ordem dos Médicos que deve definir, manter actualizados e divulgar os critérios técnicos e científicos da morte, segundo os seus saberes próprios e com total independência do poder político. A Ordem dos Médicos elaborou já um texto específico sobre os critérios de morte cerebral, onde com detalhe se estabelecem as condições e a semiologia para o diagnóstico de morte cerebral, e a metodologia e requisitos para a sua verificação. O Conselho Nacional da Ética para as Ciências da Vidas deliberou que, tal parecer da Ordem dos Médicos não suscita «nenhumas reservas», definindo categoricamente que a certificação de morte cerebral requer a demonstração da cessação das funções do tronco cerebral e da sua irreversibilidade. A Ordem dos Médicos não expressou divergência sobre que tais critérios de morte cerebral, necessariamente técnicos e da exclusiva competência da Ordem dos Médicos, carecessem de ratificação do Ministro da Saúde, ouvido, naturalmente, o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida.