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2968 I SÉRIE - NÚMERO 86

Em síntese, o Governo anda tão baralhado com a sua regionalização que já conseguiu um verdadeiro feito: pôr do lado do «não» boa parte dos que, noutras circunstâncias, não deixariam de dizer «sim».
O descalabro da regionalização do Governo é tal que entre os seus mais ilustres adversários encontram-se até fundadores do PS.
Percorre o País a convicção de que para resolver o problema, verdadeiro e angustiante, da assimetria entre o Portugal litoral e o Portugal interior, entre o País urbano e o País rural, há outro caminho e outro esforço a fazer. É o da descentralização e desconcentração administrativas; é o das transferências orçamentais e de competências para os municípios; é, ainda e sobretudo, a formação de políticas integradas de combate aos efeitos da interioridade, visando a dinamização de pólos de desenvolvimento intermédios, o que requer a conjugada acção de políticas várias, de obras públicas, de saúde e educação, de ambiente, todas elas, evidentemente, acompanhadas do estímulo às actividades económicas e de benefícios fiscais. Esse é o nosso caminho, porque achamos que é esse o esforço que o País pede.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vemos outro meio de chamar o Governo à razão que não seja o do referendo, em que os portugueses, esperamos nós, dirão ao Sr. Primeiro Ministro: Assim, não! É o que nós aconselharemos: à projectada regionalização, diremos não obrigado!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso mesmo trouxemos a esta Casa as perguntas que tornam inelutável o cumprimento da promessa do PS - que fale a soberania directamente. Suspeitamos que bem gostariam os socialistas de evitar este referendo, mas é tarde demais, porque a vossa palavra está comprometida ao mais alto nível e o vosso receio é apenas o de o perderem, não é, infelizmente, o de não terem razão.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Não havendo pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Luís Queiró, dou a palavra, para uma intervenção, ao Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos aqui a debater dois referendos no dia seguinte ao que ontem foi realizado nos termos e com os resultados conhecidos. Houve falta de empenho dos partidos e dos líderes partidários, houve falta de esclarecimento por parte do Estado e da Administração Pública sobre o significado político do referendo e a responsabilidade do eleitor, houve contestação do Parlamento e da democracia representativa e propósitos que nada têm a ver com o aprofundamento da participação dos eleitores. Continuamos, hoje, no caminho de um mau começo dos referendos em Portugal.
Em tudo isto, e quero sublinhá-lo, não há responsabilidades e posições iguais. Não há, como querem alguns comentaristas, «políticos» ou «classe política». Há partidos concretos e pessoas concretas, há quem tenha ponderado sobre o que decide e tenha sido coerente com o que decide, há quem tenha flutuado ao sabor dos interesses e dos propósitos da direita e há, igualmente, quem defenda verdadeiras aberrações, como as que hoje estão em debate, ao sabor de projectos conjunturais, e, sobretudo, há quem tenha andado em todas estas matérias a brincar aos referendos e agora continue no mesmo caminho.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Na última revisão constitucional, fez-se depender o cumprimento da lei fundamental em matéria de regiões de uma consulta directa dupla. Agora, quer aumentar-se ainda mais a contusão. Fala-se mesmo em dois referendos no mesmo dia, facto verdadeiramente intolerável! Pensemos na confusão de discursos, de tempos de antena, de temas em debate, de materiais de propaganda, de grupos de propaganda nas ruas, de boletins de voto num país de analfabetismo e iliteracia. É intolerável, é absurdo, é oportunista e ninguém pode aceitar, em consciência. boa e democrática, a proposta de simultaneidade dos referendos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Continuaremos a pensar que a democracia directa pode ser importante em articulação com a democracia representativa e a democracia participativa. Somos dos que entendem que a cidadania deve ser mais do que o voto periódico de quatro em quatro anos. Mas, em vez de um meio de participação genuína, os referendos começaram por servir como instrumentos para impedir a Assembleia da República de aprovar reformas e de abrir as vias para as implementar. Foi o caso da tentativa de resolver o problema da interrupção voluntária da gravidez, incriminando-a e fomentando o aborto clandestino. Agora, é o caso do projecto de criar regiões administrativas e, desse modo, democratizar e imprimir alguma racionalidade na administração regional do Estado. Estamos, hoje, perante uma situação em que esta administração periférica é cara e assenta em dezenas de divisões regionais diferentes.
Em tudo isto, o PS fez sempre o que o PSD lhe exigiu: cedeu constantemente ao objectivo deste partido de impedir alterações positivas e de sentido democrático e ajudou a resolver as suas contradições internas da direita, remetendo para referendo tudo aquilo que a direita quis.
Mais uma vez, hoje, não se vai ter em conta um aspecto fundamental que a regulação constitucional do referendo em 1982 procurava garantir: evitar conflitos entre a vontade majoritária da representação parlamentar e o resultado dos referendos. Abriu-se caminho para que a democracia directa entrasse em conflito com a democracia representativa.
No caso da interrupção voluntária da gravidez, referendou-se uma lei já aprovada na generalidade.
No caso da regionalização, tornou-se obrigatório na última revisão constitucional referendar a eficácia de uma lei aprovada, publicada e em vigor e que teve em conta o parecer de centenas de municípios.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Este referendo sobre a regionalização rompe com o que eslava previsto, não se manteve o «referendo orgânico» em que os municípios, através das assembleias municipais, podiam construir as regiões de baixo para cima. Não se optou, também, por um referendo regional, em que a população de cada região poderia decidir o que entende sobre a região proposta para a sua área. Optou-se, antes, por um referendo duplo, em que o