24 DE SETEMBRO DE 1998 125
sentido! E é por isso que concordo inteiramente com o que a Sr.ª Deputada Filomena Bordalo disse há pouco em relação à acção social: tem de haver um grande esforço de prevenção e, sabendo nós que mesmo com esse esforço de prevenção é impossível conter o aumento das bolsas de pobreza - eu já não digo conter as bolsas de pobreza como elas estão -, temos de qualquer modo de trabalhar com elas e para elas no sentido de as ir diminuindo gradualmente. A perspectiva da segurança social é completamente contrária. Portanto, quando falamos em solidariedade e segurança social falamos em duas componentes que têm perspectivas completamente diferentes: uma, eu diria que seria desejavelmente circunstancial, outra, eu diria que é sistémica - e desejavelmente sistémica; uma, eu diria que é desejavelmente transitória e, a outra, eu diria que é desejavelmente definitiva. Julgo que não devemos perder de vista esta ideia durante os trabalhos que se seguem.
O empolamento da solidariedade, se não se tiver em atenção aquilo que é a devolução das pessoas ao seu estatuto de dignidade e, portanto, a nossa capacidade de
inseri-las, acaba por ser apenas uma tentação alargada de um «assisencialismo» que não produz resultados e que pode ter o efeito perverso da irresponsabilidade. Em relação a este ponto, volto a dizer que quem conheça bem a pobreza e quem conheça bem os pobres saberá que muitas vezes esta intenção de solidariedade levada às últimas consequências pode significar também uma forma de exclusão, porque de algum modo já não os julgamos capazes de voltar ao sistema. Foi neste quadro, que não tem absolutamente nada de transcendente - e julgo que a Sr.ª Deputada Elisa Damião, não obstante ter feito, talvez, do meu ponto de vista, um enfoque excessivo ao que este projecto lei do CDS-PP teve de mediático -, que da Tribuna eu pedi que o projecto lei do CDS-PP fosse julgado, pelo seu conteúdo, porque nem me passa pela cabeça que a Assembleia da República possa julgar um projecto de lei pelas noticias dos jornais. Portanto, à parte esses seus desabafos -que não me dizem
respeito penso que do seu discurso também ficou claro que há aqui uma base alargada de trabalho. Parece-me que estas questões que coloco, e que são o escopo do nosso projecto de lei, são hoje partilhadas. Não as considero válidas por serem partilhadas - eu já as adoptei há muitos anos -, mas julgo que correspondem presentemente a um olhar lúcido sobre a sociedade, concretamente sobre a nossa, que ainda tem muitas fragilidades e vulnerabilidades, e sobretudo um olhar de quem, certamente, procura chegar a algum lado e não apenas deixar aqui registos no Diário.
(A Oradora reviu.)
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma intervenção o Sr. Secretário de Estado da Segurança Social e das Relações Laborais.
O Sr. Secretário de Estado da Segurança Social e das Relações Laborais (Ribeiro Mendes): - Sr. Presidente, gostaria de fazer alguns comentários breves para finalizar a intervenção por parte do Governo.
Em primeiro lugar, permitam-me uma constatação de surpresa porque quem imaginasse este debate alguns meses atrás esperaria uma veemência e uma atenção da opinião pública muito superiores ao que se verificou hoje. Naturalmente que o tempo ajudou a alterar alguns dos dados
dos problemas que se punham há dois meses, mas a falta de dramatismo do início deste debate talvez não seja, necessariamente, um mau augúrio; bem pelo contrário, quero crer que é um bom augúrio para o progresso de uma reforma que - gostaria de acentuar este aspecto se vai estruturar a partir de quatro projectos.
Todos os partidos sentiram necessidade de apresentar o seu projecto não coincidente com qualquer outro, o que dá a ideia de que a reforma da segurança social se poderá fazer sem se ir necessariamente a reboque dos alinhamentos pré-eleitorais, que, evidentemente, os calendários políticos sempre impõem. Penso, por isso, que se trata de um bom augúrio a falta de dramatismo, insisto, e o facto de haver propostas por parte de todos os grupos parlamentares ou de todos os partidos representados na Assembleia.
Em segundo lugar, gostaria de exprimir a minha convicção de que o essencial da proposta do Governo é correcta neste aspecto importante: comparando a proposta de lei de bases com a actual Lei de Bases, e não tanto com os projectos de lei que estão em confronto, julgo possível afirmar com clareza que a proposta do Governo vem colocar aquilo que estava «de pernas para o ar» nos seus correctos termos.
Na actual Lei de Bases existe a preocupação com a definição do conteúdo do direito constitucional à segurança social. Essa definição é feita a três níveis: ao nível do que na proposta se chama a protecção de cidadania, garantindo os recursos e os programas necessários à plena integração social de cada cidadão, onde quer que esta esteja em risco, definindo ao mesmo tempo o conteúdo desse direito constitucional à segurança social; ao nível da família, tornando explícito o papel decisivo da segurança social na política de família, a qual deve ser ajustada às novas realidades familiares da nossa sociedade; e, por fim, ao nível do cuidado posto na definição ou no conteúdo do direito constitucional à segurança social no que diz respeito à actividade profissional, apontando para o apoio ao emprego e flexibilizando a protecção, para adequá-la às novas realidades do trabalho, e abrindo a perspectiva de novos mecanismos que ajudem a uma saída gradual do mercado de trabalho, onde esta se justifique.
Por outro lado, pondo o acento tónico no conteúdo do direito constitucional à segurança social, a proposta de lei remete - e nesse aspecto penso ser positivo constatar alguma convergência nos projectos de lei de alguns dos grupos parlamentares - todo o essencial da regulamentação do acesso à protecção para a lei ordinária. Em vez de uma lei de regimes de segurança social como aquela que está em vigor, trata-se de uma lei de protecção que remete para a lei ordinária com maior flexibilidade para permitir o seu ajustamento, as condições de acesso a essa protecção, os tais regimes jurídicos de acesso à protecção.
Estabelece ainda princípios para a organização dos meios operacionais que concretizam a protecção, mas também neste caso com grande contenção regulamentar, ao contrário da lei em vigor. Por fim, penso ser claro na proposta de lei que se visa um equilíbrio entre aquilo que é a política e o mecanismo de solidariedade social e aquilo que releva do seguro social e creio que aqui é preciso insistir que justiça social não exclui, pelo contrário deve incluir - como foi frisado na intervenção inicial do Sr. Ministro do Trabalho -, a justiça contributiva. É o principio da contributividade para concretizar, a justiça social.