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17 DE DEZEMBRO DE 1998 1031

pois implicam precisão nos objectivos, rigor nas datas, clareza nos meios e requerem, também, a indiscutível responsabilidade dos produtores, o seu envolvimento e a sua informação, que um estudo publicado recentemente pela Associação Industrial do Porto afirma não existir em mais de 64% do total das empresas portuguesas. Uma responsabilidade dos produtores que nem por isso pode alienar a responsabilidade do Estado perante os cidadãos, da qual este não pode descartar-se.
As medidas políticas que propomos pressupõem, como é evidente, a existência de um corpo eficaz de inspecção e fiscalização, que, apesar das repetidas declarações da Sr.ª Ministra do Ambiente, continua, a poucos meses do fim do seu mandato, sem ter sequer uma lei orgânica publicada.

O Sr. José Junqueiro (PS): - É no início do próximo ano!

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Não é fácil fazer isso tudo!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A problemática dos resíduos industriais é uma questão-chave do ambiente, particularmente grave no nosso país, para a qual Os Verdes têm repetidamente alertado e dedicado especial atenção, o que é compreensível se atender-se ao facto de, apesar de alguns avanços pontuais no plano legislativo, a situação ser visivelmente caótica, constituir uma ameaça à saúde pública e à qualidade de vida dos cidadãos, incompatível com um desenvolvimento e uma sociedade sustentável. Uma situação caótica que a impunidade instalada, a falta de uma fiscalização eficaz, a inexistência de um inventário de resíduos, o não investimento sério na modernização dos processos tecnológicos, a própria ausência de uma estratégia nacional, em grande medida, torna explicável. Uma situação que se tornou caótica a insustentável e que acabou por obrigar o anterior governo, pressionado, por um lado, por Bruxelas e, por outro lado, pelo crescente descontentamento dos cidadãos, a anunciar medidas. Medidas que o PSD, então governo, ontem, como, hoje, o PS, dizia terem em vista reduzir, reutilizar e reciclar mas que, então, como agora" ficavam por um vasto a vago conjunto de intenções.
Medidas que, do todo, de concreto, só continham a parte: uma incineradora de resíduos tóxicos e perigosos, então, em Estarreja, projecto que cedo gerou forte controvérsia, contestação e rejeição. Um projecto de incineração que, pela falta de seriedade do estudo de impacte ambiental em que se baseou, pela ausência de uma visão global do problema dos resíduos, pela não sustentação em dados credíveis, pela falta de transparência do processo, desencadeou, desde, logo, a mais viva oposição de Os Verdes, das populações e das associações, a qual se revelou fatal.
A incineração que, a escassos meses das eleições, o governo do PSD ainda defendia, em debate realizado em Maio de 1995, neste Parlamento, como a melhor solução. Curiosamente, "a construção da incineradora de resíduos tóxicos e perigosos, a infra-estrutura essencial à gestão dos resíduos" que o Governo do PS manteve até metade do seu mandato, como objectivo nas Grandes Opções do Plano. A solução que, até aí, o Governo nunca questionou mas que, subitamente, poucos meses depois, trocava por um igualmente duvidoso processo de co-
-incineração. Uma troca misteriosa traduzida num memorando de entendimento, assinado, em 9 de Maio de 1997, entre a Sr.ª Ministra do Ambiente e o sector cimenteiro, a quem o Governo se submetia incondicionalmente e em quem depositava confiança para lidar com tão complexa questão. Uma decisão ardilosamente construída sem rigor sobre um conjunto de imprecisões e falsidades.
É, pois, Srs. Deputados, chegado o momento de as desmontar. Assim, a co-
-incineração não é uma solução segura, como o Governo pretende fazer crer. A co--incineração em fornos de cimenteiras, à semelhança do que acontece nos incineradores dedicados, é um modo de transferir o problema da poluição do solo para a atmosfera, meio de muito mais difícil controle. É uma queima que gera poeiras de cimento contendo elevados teores de metais pesados e cancerígenos (chumbo, crómio, cádmio), liberta produtos de grande toxicidade que não elimina totalmente, como as dioxinas e os furanos, que constituem um risco particularmente grave para a saúde. As emissões de dioxinas, segundo dados da EPA (Environmental Protection Agency), nas cimenteiras que incineram resíduos industriais, são 1700 vezes superiores aquelas que são produzidas nas cimenteiras que o não fazem.
A co-incineração não é também um meio, como pretende fazer-se crer, de pôr fim ao problema dos resíduos perigosos. Com efeito, ao contrário daquilo que o Governo diz, o volume de resíduos tóxicos cuja co-incineração o Governo pretende autorizar não ultrapassa de uma pequena parcela, 12,8%, do total, do total de resíduos perigosos produzidos anualmente no nosso pais, ou seja, 125 000 t. Não representa mais do que 5% do total de resíduos industriais produzidos, o que quer dizer que, ao contrário do que se afirma, a grande fatia de resíduos que sobram continuará a ser exportada e a maioria à espera de soluções mais adequadas.
A co-incineração também não conduz, ao contrário do que procura fazer-se crer, à redução dos resíduos.
Com efeito, sendo a queima dos resíduos industriais a razão de ser do sistema entregue às cimenteiras para co-incineração e, sendo, para estes industriais, tanto mais interessante a exploração do sistema quanto maior o volume de resíduos a queimar - o que, aliás, repetidamente, não cessam de afirmar -, torna-se evidente que toda a lógica conduzirá perversamente a facilitar a produção de resíduos e a promover mais queima. Queima essa que se oferece agora a preço mais barato do que investir numa redução de resíduos cujo retorno não é imediato.
A co-incineração também não é requalificação ambiental alguma.
Pretender que a entrega de resíduos para queimar a um dos sectores mais poluentes do Pais, precisamente a indústria cimenteira, pode contribuir para a requalificação ambiental de zonas protegidas como o Parque Natural da Serra da Arrábida ou o aglomerado urbano de Alhandra é, no mínimo, chocante e um escândalo.
Chocante não deixa de ser, também, a própria ideia do "brinde", ou seja; os filtros que, como contrapartida, o Governo aparece a oferecer às populações. Populações que, há anos e anos, vivem paredes meias com a poluição, sistematicamente ignoradas, afectadas, no dia-a-dia, na sua saúde e qualidade de vida, perante o silêncio do Governo, por indústrias que sempre as desprezaram e cujo consentimento se procura, agora, com filtros comprar.
A saúde, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, não é uma benesse, é um direito de todos, que incumbe ao Governo dar e nunca, como moeda de troca, chantagear!
A co-incineração não é, igualmente, uma solução ambientalmente credível.