O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1354 | I Série - Número 34 | 04 de Janeiro de 2001

 

Os soldados têm uma situação dramática. Sabe-se hoje que, na primeira missão portuguesa, só os sargentos tinham dosímetros para medir as radiações e que os soldados não os possuíam, não tinham conhecimento nem das medições, nem sequer do risco que corriam.
Sabe-se agora que os instrumentos que o Sr. Ministro elogiou ontem, na sua intervenção, feita em directo nos canais da televisão, não são competentes para medir as dosagens de contaminações mais letais, que podem, eventualmente, afectar a saúde destes soldados.
Mas, naturalmente, não nos podemos limitar a discutir a saúde dos soldados, que é tão importante neste contexto.
É, assim, indispensável que a Assembleia da República fale hoje sobre aquilo que foi a decisão que afecta esses soldados e que afecta as populações civis do Iraque, do Kosovo e da Jugoslávia, que foram sujeitas à utilização de armas que, à luz de todos os preceitos internacionais, são proibidas e são condenadas.
Por isso mesmo, importa fazer um balanço desta decisão, isto é, o que é que leva os soldados portugueses à presença no terreno das operações militares já depois de, sem uma decisão do Parlamento e sem uma decisão de declaração de guerra, Portugal ter participado numa operação militar de bombardeamento de um país com o qual foi mantendo sempre relações diplomáticas normais. Uma guerra sem declaração que não deixou de ser uma guerra e que afecta estes soldados como afecta a população civil.
Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados, quero lembrar-vos que, na altura, personalidades tão diversas como Mário Soares, Boaventura Sousa Santos, Freitas do Amaral, Jorge Miranda ou o próprio Ministro que hoje está em funções no cargo da Defesa consideraram que esta actuação militar era ilegal, ilegítima e injustificada. Sabemos agora que não só isso é verdade como é dramaticamente mais verdade, porque a morte semeada para intuitos políticos, nessa altura, se prolonga por uma condenação à morte destas populações civis nos anos vindouros.
Assim, a única coisa que nos resta concluir é que desse crime, dessas mortes semeadas, desse risco para as populações civis, desse risco para os soldados que foram mandados por estes governos intervenientes para o teatro das operações, só fica uma certeza: a de que quem decidiu a utilização destas armas, quem avalizou a utilização destas armas, quem usou estas armas, esses criminosos de guerra nunca se sentarão no banco dos réus!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, encontra-se a assistir à reunião plenária um grupo de 45 alunos da Escola Gonçalves Zarco, de Matosinhos, para quem peço a habitual saudação.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O que se passou nas últimas semanas, no País, foi, pura e simplesmente, inacreditável.
O Governo colocou em causa, ao mesmo tempo, a relação de confiança com instituições internacionais, o cumprimento das suas obrigações de informar, o princípio da colaboração entre órgãos de soberania e, finalmente, o esclarecimento da verdade dos factos perante os normais cidadãos.
O Governo permitiu que, durante estes atribulados dias, se instalasse a dúvida sobre se a NATO lhe transmitira, e o que lhe transmitira, quanto ao problema das consequências dos bombardeamentos com munições compostas por urânio empobrecido.
Mais, permitiu que todos nos interrogássemos sobre o modo como foram colocados os contingentes militares no Kosovo e se haviam sido os portugueses especialmente prejudicados na localização correspondente.
As dúvidas sobre os efeitos perniciosos dos bombardeamentos avolumaram-se e os factos entretanto verificados encarregaram-se de estabelecer relações. Sabia-se que o Governo não informou a Assembleia da República de especiais perigos de intervenção quando a decisão foi tomada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Soube-se que o Sr. Presidente da República deu a conhecer que o Governo lhe não havia também prestado informações sobre os potenciais perigos a que se encontravam sujeitos os militares portugueses estacionados no Kosovo. O Sr. Presidente da República, que é, note-se bem, o Comandante Supremo das Forças Armadas, de acordo com a Constituição!
Mais, ouvidos sobre tal matéria, Presidente e Primeiro-Ministro declararam surpreendentemente que queriam conhecer toda a verdade.
Afinal, levantada a dúvida sobre causas e efeitos de doenças e mortes, conviria saber o que, de facto, tinha acontecido.
Estranhamente, o Presidente desconhecia aquilo que o Primeiro-Ministro devia ter-lhe transmitido. Mais estranhamente ainda, o Primeiro-Ministro ignorava o que devia transmitir. A história não registou, sequer, qualquer iniciativa da parte do Sr. Presidente para convocar e ouvir o Conselho Superior de Defesa Nacional.

O Sr. António Capucho (PSD): - Incrível!

O Orador: - Ganhava peso esta interrogação simples: a NATO informara o Ministro Jaime Gama, ao tempo Ministro cumulativo dos Negócios Estrangeiros e da Defesa, sobre o assunto? O Ministro Jaime Gama passou o transmitido ao Ministro Castro Caldas?
Se a NATO não havia prestado as informações, criara-se um facto político de excepcional gravidade: a NATO não fornecera a um País aliado, partícipe na intervenção militar realizada sob a sua égide, acesso ao conhecimento de dados de natureza vital.
Se as informações foram transmitidas, sobrava a interrogação sobre a razão pela qual não foi comunicada aos demais órgãos de soberania. Constituiria isto um misto de irresponsabilidade política e grave omissão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!