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0384 | I Série - Número 11 | 12 de Outubro de 2001

 

Segundo uns, a liberdade condicional terá a natureza de uma verdadeira pena, substitutiva da pena inicial de prisão em que o réu tenha sido condenado.
Segundo outros - é essa a nossa opinião -, essa liberdade será apenas um ensaio de libertação prévia do condenado, isto é, uma forma de cumprir a sua pena originária de prisão fora de um sistema de encerramento, para assim se obter ou tentar obter uma mais perfeita ressocialização do criminoso através do ensinamento prático da assunção das suas responsabilidades de cidadão útil à sociedade.
O nosso sistema jurídico em matéria de liberdade condicional tem variado de acordo com diferentes regimes. Destaquemos, contudo, o regime instituído em 1976, pelo qual a liberdade condicional passou a ser concedida não por certo prazo, como até então, mas pelo tempo que faltasse para o cumprimento da pena privativa da liberdade, do que resultou que a sua revogação implicava o cumprimento do resto da pena que faltava cumprir no momento da sua concessão e que a concessão da liberdade definitiva era referida à data do termo da pena privativa da liberdade, a determinar como se não tivesse ocorrido a libertação.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 407/VIII, emergente do CDS-PP, acaba com a liberdade condicional obrigatória cumpridos cinco sextos da pena para os condenados por crimes associados ao tráfico de estupefacientes, na medida em que, decorrido este prazo, se exigirão ainda para a concessão da liberdade condicional o juízo de prognose favorável quanto ao não cometimento de futuros crimes e a compatibilidade com a prevenção geral positiva (requisitos do artigo 61.º, n.º 2, do Código Penal).
O projecto de lei n.º 492/VIII, do PSD, vai muitíssimo mais longe, eliminando a possibilidade de concessão de liberdade condicional quanto a um conjunto de crimes que são apresentados como mais violentos e repulsivos ou em caso de reincidência ou concurso de crimes, aumentando o tempo de cumprimento de pena para um mínimo de três quartos relativamente a outros delitos, acabando com a liberdade condicional obrigatória e dificultando a concessão das saídas precárias.
Discordamos do conteúdo dos dois projectos de lei em apreço, embora as razões de discordância se façam sentir com muito maior intensidade no que respeita ao projecto de lei n.º 492/VIII, emergente do PSD.
A primeira razão é a de que estes projectos assentam numa distorcida e falsa premissa: a de que, limitando a liberdade condicional ou acabando mesmo com ela, se diminuem os números de reincidência, evitando-se o cometimento de novos crimes. Ora, tal entendimento demonstra um profundo desconhecimento da razão de ser e da origem histórica da liberdade condicional.
Este instituto surgiu em 1846 como resposta da doutrina francesa contra o aumento significativo da reincidência que então se verificou. Curiosamente, defende-se agora a limitação ou eliminação da liberdade condicional em nome da segurança das pessoas e em nome da luta contra o crime. Ora, o que se deveria dizer é que, precisamente ao contrário, o cumprimento da pena de prisão sem a passagem pelo período de transição que representa a liberdade condicional é potenciador de novos crimes.
Os defensores deste tipo de soluções gostariam, na verdade, que os condenados por crimes graves cumprissem as suas penas durante todas as suas vidas, porque assim se evitaria a reincidência. Só que, enquanto não conseguirem atingir tal objectivo - e espera-se que nunca o consigam -, têm de compreender que qualquer condenado acabará por voltar à vida em liberdade, pelo que será de grande utilidade para a sociedade o ter-lhe oferecido alguma possibilidade de ressocialização ou, pelo menos, o ter evitado a sua ainda maior dessocialização.
Como o mundo muda ciclopicamente, é incompreensível que os condenados a penas de prisão de longa duração não devam beneficiar de um período de transição entre a vida na prisão e a vida em liberdade, em nome da segurança de todos nós e em nome de um princípio de emanação jurídico-constitucional: o princípio da ressocialização ou da solidariedade. É que, como nota Figueiredo Dias, a liberdade condicional é uma concretização daquele princípio de que «ao Estado que faz uso do seu ius puniendi incumbe, em compensação, um dever de ajuda e de solidariedade para com o condenado, proporcionando-lhe o máximo de condições para prevenir a reincidência e prosseguir a vida no futuro sem cometer crimes».
Aliás, Srs. Deputados, para aqueles que têm uma visão meramente securitária da justiça sempre se dirá que, em caso de violação de liberdade condicional, o preso cumpre o resto da pena mais nova pena; se não houver liberdade condicional, só o resto da pena, pelo que se conclui que a eficácia dissuasora é menor, naturalmente. Estamos, neste aspecto, de acordo com as declarações proferidas a esse respeito pelo Sr. Deputado António Filipe.
A estas razões de fundo acresce uma outra: o regime da liberdade condicional foi já objecto de um muito sensível endurecimento com a revisão do Código Penal de 1995 e estes projectos de lei não vêm acompanhados por quaisquer estudos de natureza criminológica que imponham a modificação do regime actual. Pelo contrário, o que vários estudos têm demonstrado é que Portugal surge como um dos países da Europa onde o tempo de duração efectiva das penas de prisão é maior. Não se compreende, portanto, a razão pela qual devemos alargar ainda mais este fosso.
Assentando os dois projectos em premissas indemonstradas, não merecem a nossa aprovação. Mais útil teria sido a preocupação com a alteração das condições efectivas de cumprimento da liberdade condicional, permitindo-se um efectivo acompanhamento do condenado e investindo-se em soluções facilitadoras da sua reintegração.
Com estes projectos de lei, os partidos proponentes estão a assumir, parafraseando o distinto penalista Professor Costa Andrade, «uma política criminal à flor da pele».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A alteração proposta ao artigo 49.º-A do Decreto-Lei n.º 15/93 insere-se numa política de agravamento da penalização dos crimes em conexão com a