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0469 | I Série - Número 009 | 09 de Outubro de 2003

 

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que ora se discute abre caminho a um conjunto de alterações significativas à legislação que enquadra o ordenamento do território e a intervenção urbanística.
A aprovação do presente diploma implica a criação de mais uma situação-tipo de excepção. Grosso modo, é como se o regime de excepção que vigorou com a área de intervenção da Expo 98 fosse passível de ser estendido a todas as zonas históricas e áreas críticas de reconversão urbanística, espalhados por esse país fora, em todos os aglomerados urbanos de algum significado.
Esta operação tem um nome. Chama-se "atentado contra o ordenamento do território", mais um, se tivermos em conta o que o Governo aqui aprovou, com a maioria de que dispõe nesta Câmara, tendo como pano de fundo o "milagre dos pães", agora sob a forma do se poderia chamar de "milagre das áreas metropolitanas".
Assim, nesta mesma linha, contra o ordenamento do território, contra uma verdadeira política de descentralização e de desconcentração administrativa e contra o próprio poder local, o Governo vem aqui defender mais uma proposta que, na prática, vai amputar uma fatia do poder autárquico, designadamente das assembleias municipais, que deixam de ter, pura e simplesmente, poderes para discutir e aprovar os planos de pormenor, os quais, como se sabe, são instrumentos de planeamento determinantes para o ordenamento territorial e intervenção urbanística em concreto, em cada município.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - É a esta escala que, muitas vezes, se percebe qual é a verdadeira natureza e impacto de determinadas operações de reconversão urbanística e que se criam as condições susceptíveis de uma participação efectiva das populações no processo de reflexão alargada, que qualquer operação urbanística deve ter. Veja-se o caso do programa Polis: a legislação aprovada, por proposta do Bloco de Esquerda, abriu caminho para a instituição de comissões locais de acompanhamento, que têm por função acompanhar e discutir todos os projectos e soluções à escala do plano de pormenor, o qual, por sua vez, é aprovado pela assembleia municipal.
A este título, a presente proposta de lei propõe três medidas muito simples: em primeiro lugar, abre caminho para retirar da competência das autarquias (câmaras e assembleias municipais) todas as chamadas "zonas históricas" dos municípios, não se sabendo, com rigor, a delimitação geográfica precisa de nenhuma zona histórica de qualquer município, ou seja, aprova-se algo que nenhum Deputado, nem o Governo, sabe o que significa.
Em segundo lugar, retira aos executivos municipais a competência municipal de qualquer intervenção urbanística, que é a do "licenciamento e autorização de operações urbanísticas" (artigo 6.º, n.º 1, alínea b)), e retira também às câmaras municipais a competência de discutir e aprovar os planos de pormenor, entregando esse poder a sociedades que, embora formalmente de capitais públicos, vão funcionar e agir como se fossem autênticas sociedades de direito privado, na medida em que poderão, por exemplo, efectuar "contratos com parceiros privados", os quais, naturalmente, se regem pelo direito privado. Isto, para já não falar das juntas de freguesia, elas próprias também depositárias de algumas competências consagradas em lei, mas que, pura e simplesmente, são esquecidas no diploma. Para o "atento" legislador que produziu esta proposta as juntas de freguesia nem sequer existem!
Em terceiro lugar, em nenhum momento a presente proposta fala de "direito de participação popular", tal como acontece com o regime de elaboração, execução e avaliação dos instrumentos de gestão territorial em vigor.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ou seja, de uma assentada, as populações directamente afectadas pelas tais "operações urbanísticas" poderão, de um momento para o outro, ser confrontadas com opções que não tiveram oportunidade de discutir e, sobretudo, a que não tiveram oportunidade de se opor legalmente, pois esse poder será doravante exercido pelas tais "Sociedades de Reabilitação Urbana" (SRU).

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - É um escândalo!

O Orador: - A presente proposta de lei, Sr.as e Srs. Deputados, é também a extensão do processo privatizador que este Governo tem prosseguido sistematicamente, desde a sua tomada de posse, a toda a sociedade, mas aplicando-o agora à própria raiz, ou seja, à forma de ocupação e ordenamento do território. Só falta, para o processo ficar completo, que não sejam apenas as zonas históricas e as áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística a ser objecto das tais SRU, mas todo o município, e passarem a ser os próprios PDM da competência dessas sociedades. É que, afinal de contas, o famoso "argumento" pode servir para tudo: se as sociedades de reconversão urbanística vão ser mais eficazes que os municípios para reconverter as zonas históricas, por que não o hão-de ser também para todo o município? A actual maioria ficaria certamente mais satisfeita, até porque poderia mover os seus boys sem a incomodidade de ter de lidar com os técnicos das câmaras, com pareceres, ou mesmo de estar sujeita às assembleias municipais e ao seu escrutínio.

Vozes do BE: - Muito bem!