O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1121 | I Série - Número 019 | 03 de Dezembro de 2004

 

Risos.

De facto, há um livro sobre ele que vai sair em breve, onde alguém de Arganil dizia "As senhoras comem-no com beijos". Eu, que prefaciei esse livro, digo, no prefácio, "Pois é, e ele bem gostava de ser comido".

Risos.

Querido Fernando Valle, uma saudade muito pungente para mim. Foi uma companhia admirável.
Amigo de Miguel Torga, amigo de António Sérgio, amigo de grandes escritores e de grandes pensadores do seu tempo, só tinha amizades, não creio que tivesse inimizades. Salazar, sim, que odiava, como sabemos, perseguiu-o mas perseguiu-o por razões políticas, provavelmente, em termos pessoais, até o admirava.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: São estas as palavras com que quero sublinhar o facto de termos perdido aquele que considero a minha maior referência política e humana e um dos seres humanos mais perfeitos que conheci, repito, durante toda a minha vida.

O Sr. Presidente: - Associo-me, em nome pessoal e da Mesa, às palavras tão comovidas do Sr. Deputado Almeida Santos, a propósito do falecimento do Dr. Fernando Valle.
Srs. Deputados, vamos, então, votar o voto n.º 224/IX - De pesar pelo falecimento do Dr. Fernando Valle (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Após ter heroicamente resistido até aos 104 anos, faleceu o Dr. Fernando Valle.
Deixou-nos um cidadão, um homem e um profissional que atravessou o último século e pôde testemunhar ainda os primeiros anos do século presente. Raros seres humanos terão deixado, após si, a imagem de bondade, solidariedade, amor pelo semelhante, nobreza de carácter, coragem cívica e dignidade em todos os actos da sua vida que Fernando Valle nos deixou.
Foi um médico distinto, que exerceu a medicina como um sacerdócio. Foi talvez o exemplo mais frisante, se não único, do médico que empobreceu a exercer medicina. Aluno brilhante da Universidade de Coimbra, renunciou à possibilidade de uma carreira académica para curar doentes em Arganil, Coja, e outras povoações da serra do Açor.
De dia e de noite, chovesse ou soprasse o vento, a pé ou a cavalo, lá ia o Dr. Fernando Valle aonde o chamassem para curar doentes, fazer partos, pequenas cirurgias ou mesmo curar almas, que tudo isso tinha de saber fazer o médico de família de então.
Não levava dinheiro a quem o não tinha. O mais das vezes prodigalizava os medicamentos. Se os não tinha, deixava, não raro, à cabeceira do doente o necessário para comprá-los.
Nos intervalos da profissão, exerceu sempre uma corajosa acção cívica de oposição à ditadura, batendo-se pela liberdade e pela democracia. Por isso foi preso e perseguido.
Membro do Grande Oriente Lusitano, do qual, por modéstia, nunca quis ser Grão-Mestre, era, ao morrer, o mais antigo maçon do mundo. E decerto um dos mais fiéis e permanentes intérprete dos valores por ele perfilhados. Viveu toda a sua vida, sincera e convictamente, em consonância com eles.
Fundador do Partido Socialista, e há alguns anos seu Presidente Honorário, viveu o socialismo como ele deve ser vivido: como um humanismo. E fez da sua vida uma das referências mais exemplares para quem busca a perfeição cívica e ética. Viveu verdadeiramente como um santo laico.
Deixa-nos uma maravilhosa recordação. Tentemos imitá-lo e merecê-lo.
Na sua reunião de 2 de Dezembro de 2004, a Assembleia da República aprovou um sentido voto de pesar, endereçando à família enlutada, ao Partido Socialista e à legião de admiradores do Dr. Fernando Valle o seu mais sentido pesar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em sinal de solidariedade para com a família enlutada e de homenagem, vamos guardar 1 minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.