15 DE DEZEMBRO DE 2006
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De concreto, de crescimento mesmo, de tudo o que o Governo tem para mostrar, a única coisa que concretiza é o oposto do que prometeu acontecer. De concreto, são os mais de 15 000 ha de território comprometidos com grandes empreendimentos turísticos entre Tróia e Odemira. É este o novo modelo de desenvolvimento do Governo do Partido Socialista.
Neste final de 2006, o Ministro Manuel Pinho deixa claro em que é que se traduz este prometido milagre da inovação e do desenvolvimento tecnológico. Tudo se resume, afinal, a uma velha fórmula, fórmula ou receita, se preferirem: o velho e esgotado modelo da aposta no turismo — que mais poderia ser?! —, como a solução mágica para o crescimento, desta vez ao longo da orla costeira do Alentejo.
No início de Dezembro, o Ministro da Economia foi prestimosamente apadrinhar o lançamento do empreendimento da Herdade do Pinheirinho, que, a par do projecto Costa Terra, se enquadra num plano de pormenor localizado em sítio classificado como Rede Natura. Ora vejam bem! Na sua já habitual candura, o Ministro da Economia não deixou de manifestar deslumbramento sobre o valor da paisagem da costa alentejana. Podia ser comovedor, se não soubéssemos, nós todos, que a pressão imobiliária que tem vindo a ser colocada sobre a costa alentejana só serve para impor no horizonte a derrocada desse mesmo «paraíso» que o Ministro da Economia, tão lestamente, se presta a vender a preço de saldo.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Muito bem!
A Oradora: — Ao mesmo tempo, o Ministro do Ambiente, que, com o Ministro da Economia, assinou os despachos de viabilidade destes dois projectos — Costa Terra e Herdade do Pinheirinho —, remete-se ao silêncio. Não há, Sr.as e Srs. Deputados, silêncio mais constrangedor do que este, do Ministro do Ambiente! Há, neste Governo, um Ministro, que é do ambiente e que assina despachos de viabilização de construção de novos empreendimentos, em sítios classificados como Rede Natura, quando sabe que viola legislação internacional.
É uma vergonha que a governação, no que diz respeito à preservação da natureza, esteja entregue a um Ministro que demonstra o maior desprezo pela mesma preservação da natureza.
A única forma de poder legalizar um empreendimento localizado em sítio da Rede Natura é a de lhe conferir estatuto de «utilidade pública», e a Directiva Habitats é muito clara em relação às condições que esse processo pressupõe: é de utilidade pública se for fundamental para a segurança nacional ou para a saúde pública ou para a protecção da natureza. Logo, o despacho do Ministro do Ambiente não tem cobertura legal! Mas, mais grave, Sr.as e Srs. Deputados, do que o procedimento, do ponto de vista da sua legalidade duvidosa, é a escolha política para o desenvolvimento. Perguntemo-nos: é o turismo que corresponde à prometida aposta na inovação e na qualificação?! O Ministro da Economia promete que este não é um turismo de «pé descalço», não é um turismo de massas. É claro que não é um turismo qualquer, trata-se de empreendimentos turísticos de topo de gama, como são de topo de gama os grupos empresariais que se mostram disponíveis para dar este «abraço de vampiro» à costa alentejana. Eles são o Grupo Sonae, o Grupo Amorim, o Grupo Espírito Santo, o Grupo Pestana.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Bem lembrado!
A Oradora: — Mas perguntemo-nos se isso muda alguma coisa naquilo que é fundamental em relação à actividade turística.
Porque são grandes grupos, porque são empreendimentos de topo de gama, a actividade turística vai deixar de ser sazonal? Não vai. Vai deixar de empregar, dominantemente, trabalho pouco qualificado? Não vai. Vai deixar de contribuir para a precaridade laboral? Não vai. Vai deixar de representar um custo elevadíssimo para a perda da qualidade do ambiente? Não vai.
Isso significa que um programa de investimento em turismo tem, necessariamente, de ser programado com a maior prudência e, sobretudo, numa perspectiva ampla à escala geográfica. Não pode cometer-se o erro de estudar cada projecto de novos empreendimentos apenas à escala do município, seja em Tróia ou Grândola, seja em Sines ou Odemira.
É preciso equacionar programas de desenvolvimento que conjuguem o turismo com outras actividades económicas, e todas elas com o objectivo da qualificação de recursos, humanos e naturais.
É, por isso, incompreensível que o Plano Regional de Ordenamento do Território no Alentejo Litoral, que está em preparação desde 2004, continue a não ser concluído.
Um país que se quer voltado para a modernidade tem de aprender a lição de que o ordenamento do território tem de ser produzido a uma escala geográfica que optimize as suas potencialidades e respeite o seu património histórico e natural. E isto importa para a costa alentejana como importa para toda a orla costeira nacional.
Temos uma orla costeira que, ao longo de todo o litoral, se encontra em sério risco de decomposição: o mar avança, a costa cede.