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I SÉRIE — NÚMERO 27

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A fusão das empresas concessionárias dos serviços públicos constitui uma inegável originalidade. Na maioria dos países europeus (Grã Bretanha, Itália, Espanha, entre outros), o serviço público de televisão nasceu e desenvolveu-se a partir da concessionária do serviço de radiodifusão, e aí permaneceu. Noutros países (Suécia, Hungria, República Checa, entre outros), a televisão pública seria assumida por uma empresa diferente da concessionária de radiodifusão, e assim permaneceria para sempre.
O que é invulgar é a transição de um modelo para outro. Isso aconteceu em França, em 1974, quando o governo considerou necessário desmantelar a pesadíssima e dispendiosa ORTF para, em seu lugar, criar várias empresas de capital público, mais ágeis e com menores custos. Mas essa mudança foi original.
Em Portugal, vamos percorrer um caminho inverso do francês. Será realizado agora aquilo que não foi feito em 1955, quando, mau grado o trabalho de estudo e lançamento da implantação da televisão ter sido realizado pela Emissora Nacional, o governo preferiu criar uma nova empresa, maioritariamente privada mas ferreamente controlada, onde os bancos e as principais rádios privadas, nomeadamente o Rádio Clube Português e a Rádio Renascença, detinham a maioria do capital.
Não é fácil concluir sobre qual o modelo aconselhável. A diversidade de experiências europeias aí está para o demonstrar: em alguns países, entendeu-se que a integração dos dois serviços públicos permitia a criação de sinergias, diminuindo nomeadamente os seus custos totais; noutros, preferiu-se conferir prioridade à necessária autonomia editorial dos operadores, temeu-se o gigantismo a que poderia conduzir uma empresa única ou ainda a eventual secundarização do serviço público de radiodifusão.
Todavia, no actual contexto português, a operação de fusão, na sequência do trabalho já realizado pela SGPS desde 2003 e anteriormente pela Portugal Global, parece amplamente justificada, tanto mais que responde à principal dificuldade actual do modelo português: a sua sustentabilidade económico-financeira.
O modelo de governação das concessionárias dos serviços públicos de rádio e de televisão assume também uma importância decisiva.
Antes do 25 de Abril, e mesmo a seguir ao fim do regime autoritário, os estatutos da RTP e da então Emissora Nacional não se diferenciavam em nada dos aplicados a qualquer outra das empresas públicas. Não era cumprido o actual princípio constitucional da independência das empresas face ao poder político.
A RTP e também a RDP foram muitas vezes um instrumento dos governos. Nenhuma força política, repito, nenhuma força política, que passou pelo poder depois do 25 de Abril está isenta de culpas nesta matéria. A RTP teve, desde 1974, 24 presidentes, dos quais até hoje apenas um, Coelho Ribeiro, cumpriu o seu mandato até ao fim. Sempre que mudou a maioria política no governo, mudaria no espaço de poucos meses não só a Administração da RTP como os directores de programas e, sobretudo, de informação.
Refira-se, aliás, que o actual Governo é o primeiro que respeita a escolha realizada por um executivo de maioria política diferente,…

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Uma grande escolha!

O Orador: — … mantendo-se o Conselho de Administração e grande parte da estrutura directiva por ele nomeada no início do mandato.
Esta instabilidade na gestão da RTP e a criação de uma cadeia hierárquica de controlo político do Governo até à direcção do Telejornal, que tantas vezes caracterizou a empresa, constituem uma gravíssima limitação à sua credibilidade.
Ao contrário do que se passa nos países do centro e do norte da Europa, em Portugal esqueceu-se demasiadas vezes que a concessionária presta um serviço ao público e não ao Estado, ao governo, a um partido político, a uma Igreja, a qualquer poder ou grupo de interesse, para utilizar uma definição tão arreigada nos documentos internacionais relativos ao serviço público de televisão.
Em Portugal, pelo contrário, tivemos quem, como Vítor da Cunha Rego (Presidente da RTP em 1980, durante a governação PSD), considerasse que «a RTP é um aparelho ideológico do Estado», ou, uns meses mais tarde (Proença de Carvalho), durante a governação PSD, quem entendesse legítimo que a Administração da RTP, sendo designada por um órgão de soberania com legitimidade popular, pudesse dirigir toda a empresa, sem excluir o conteúdo da programação, ou ainda (Morais Sarmento, ministro da tutela em Outubro de 2004) quem afirmasse, numa altura em que, aliás, se referia a possibilidade de substituição, depois disso concretizada, do então director de informação, José Rodrigues dos Santos, existirem limites à independência dos operadores públicos, mesmo sobre o modelo de programação porque «uma vez que são os responsáveis políticos que respondem perante o povo».
É, por isso, legítimo proceder a um balanço negativo sobre a concretização em Portugal do princípio constitucional da independência.
No entanto, importa não colocar em causa, por essa razão, o próprio serviço público. A generalidade das televisões públicas europeias é mais independente e plural do que a generalidade dos operadores privados.
Da mesma forma, não considero que exista uma incompatibilidade entre a designação governamental dos gestores e a salvaguarda do princípio constitucional da independência.
Em primeiro lugar, porque em muitos deles, desde logo na própria BBC ou em alguns serviços públicos nórdicos, existe uma intervenção determinante dos governos na gestão das empresas, a começar pela