14 | I Série - Número: 011 | 19 de Outubro de 2007
um eurodeputado para ficar ao nível da França e do Reino Unido; sobre o advogado-geral no Tribunal de Justiça ou a inclusão da «cláusula de Ioannina» de que a Polónia não abdica; sobre o desejo de proteccionismo das universidades da Áustria ou de o euro escrito em cirílico na moeda única, levantado pela Bulgária.
Todas estas «magnas» questões têm merecido lugar de destaque porque todas são olhadas agora como os obstáculos que poderão desfazer o sonho de ver um tratado aprovado sair amanhã do Pavilhão Atlântico.
Com os governos europeus a entenderem-se cada vez mais acerca da forma de ratificação do novo tratado, como temos assistido por essa Europa fora, fugindo ao referendo como o diabo foge da cruz, as atenções focam-se no supérfluo. Com efeito, paulatinamente, as instâncias europeias têm vindo a afastar alguns dos verdadeiros obstáculos que poderiam encontrar no seu caminho para a aprovação do novo tratado europeu.
Um novo tratado que já foi tratado constitucional, que como tal foi expressamente rejeitado por dois países membros, a Holanda e a França, e que desde então foi eleito como a principal preocupação das instâncias europeias, que começaram a falar num suposto impasse institucional que bloquearia a União e que teria de ser ultrapassado a todo o custo para bem da Europa e do mundo.
Um novo tratado que, entretanto, foi rebaptizado de tratado reformador, sujeito a uma operação de maquilhagem, para convencer os portugueses e os restantes povos europeus de que estamos perante coisa nova, um «simples» tratado como os anteriores de Nice ou de Amesterdão, que já não está em causa a constituição de um grande Estado federal, a perda de soberania ou de poderes de intervenção dos pequenos Estados e que, portanto, nada há a temer. De resto, ainda nem se conhece verdadeiramente o conteúdo ou o texto final daquele e, por isso, nada haverá a dizer sobre a sua ratificação.
No mês passado ficámos a saber que o Primeiro-Ministro holandês, Jan Peter Balkenende, entende que «Um referendo não é necessário (…), pois o (futuro) tratado não tem implicações constitucionais (…) e um referendo ‘curto-circuita’ o Parlamento e o Senado», referindo-se claramente ao provável bloqueio do Senado holandês a uma possível iniciativa do Parlamento para convocar um referendo, pelo que a Holanda conhecerá apenas um processo parlamentar de aprovação.
Também na França, desde a vitória da Direita e de Sárkozy nas presidenciais francesas, está afastado esse enorme «perigo» que seria a realização de um referendo gaulês, o que, conjuntamente com o bloqueio holandês e a promessa já anunciada por Gordon Brown e o governo britânico de não realizar um referendo interno, faz com que se regozijam cada vez mais os defensores da nova reforma institucional europeia com a ameaça de paralisação dos mais eurocépticos. Mas regozijam-se com prudência, pois, afinal, «nem tudo são rosas» já que, apesar de os dois países que já anteriormente, em referendo, rejeitaram o tratado constitucional europeu estarem, aparentemente, arredados do caminho, alguns outros Estados ainda não se decidiram sobre se farão ou não referendo.
As «ameaças», como são vistas por muitos, subsistem ainda na República Checa, na Dinamarca e, possivelmente, na Polónia e próprio no Reino Unido, entre outros, para além da Irlanda, o único país que está formalmente, por imposição constitucional, obrigado a realizar a consulta popular.
Também em Portugal se fez uma revisão constitucional para expressamente permitir, o que antes era vedado, com o aditamento de um novo artigo 295.º, a realização de referendos sobre a aprovação de tratados que versassem sobre a construção e o aprofundamento da União Europeia.
Mas, afinal, por que é que alterámos todos a nossa Constituição? Todos, pois foi por unanimidade. Não foi precisamente com o fito de permitir a realização em Portugal de referendos sobre matérias relativas à integração europeia, aliás, como o Partido Socialista se comprometeu no seu programa eleitoral? Mas, afinal, de que é que têm tanto receio os defensores do novo tratado? Por que é que desde que descobriram (que horror!) que num referendo era possível os eleitores exprimirem a sua opinião directamente de forma democrática e, por exemplo, dizerem que «não» a um certo tratado já ninguém acha boa ideia fazer referendos? De repente, os governos dos Estados-membros da União Europeia deixaram de achar ser boa ideia submeter a referendo e dar importância à opinião dos cidadãos quanto a esta matéria. Porquê? Porque descobriram que podia não ser igual à sua.
Talvez porque, afinal, a tal «maquilhagem» de coisas como não incluir a consagração de símbolos como a bandeira, o hino ou o lema, aliás, mais do que institucionalizados na prática, pudesse disfarçar alguns aspectos essenciais, já determinados, como a atribuição de personalidade jurídica própria à União, as perdas de soberania e competência, designadamente nas áreas da justiça e dos assuntos internos, o fim das presidências rotativas ou a continuidade de um ministro dos negócios estrangeiros para toda a União, mesmo que renomeado em alto representante da União.
Só isso pode explicar que todo o processo negocial que rodeia este novo tratado tenha sido levado a cabo de uma forma perfeitamente eurocrata, centralizada, quase secreta, sem debate público alargado, por exemplo no nosso país, pretendendo convencer as pessoas de que nada se passa, de que nada requer a sua atenção, o seu conhecimento ou a sua participação crítica e actuante num Estado de direito onde se deveria prezar a democracia participativa.
Há poucos momentos, ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro dizer que se está perto, muito perto, de ter um novo