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34 | I Série - Número: 087 | 24 de Maio de 2008

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar os projectos de lei do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pela enésima vez voltamos ao tema dos impedimentos e incompatibilidades. A razão é óbvia e já há muito passou as paredes de São Bento: tratase da transparência no exercício da acção política, da relação que tem o Deputado e outros titulares de cargos políticos com o Estado e das condições de independência do exercício do seu mandato.
Não é aceitável — dizemo-lo mais uma vez — que Deputados, que é suposto fiscalizarem a actuação do Governo e a Administração Pública, possam prestar serviços profissionais, consultadoria ou patrocínio jurídico, ao Estado, seja na administração central, seja na administração regional, seja na administração local. Há aqui um imperativo de independência da função, que é uma função de escrutínio, que não pode ser esquizofrenicamente dividida: num momento, faz-se a fiscalização política e, num outro momento, é-se remunerado por uma actividade daqueles que é suposto serem fiscalizados.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Isso não é aceitável! É um impedimento óbvio! É um impedimento em nome da transparência, em nome da dignificação do papel que as Sr.as e os Srs. Deputados aqui exercem! Dizem alguns que isso é um jacobinismo extraordinário, que é uma «ética de zelotes» ou o que quer que seja. Nós nem sequer propomos a exclusividade da função, propomos esta coisa simplicíssima, que entra pelos olhos dentro de qualquer cidadão medianamente esclarecido e que não precisa de qualquer apelo populista: uma função, quando assumida, tem de ser tomada na sua integralidade. Se a função é de fiscalização, não pode ser de fiscalização às segundas, quartas e sextas e remunerada por actividades prestadas ao Estado, a qualquer dos níveis da administração, nos outros dias da semana.
É a transparência que está aqui em causa e não qualquer Sr. Deputado ou Sr.ª Deputada em particular. É o estatuto da função que deve ser dignificado naquilo que é o seu conteúdo constitucional.
Também entendemos, Sr.as e Srs. Deputados, que, no regime das incompatibilidades, o chamado período de nojo para os titulares de cargos políticos — ministro, secretário de Estado — que abandonam funções deve ser mais dilatado para poderem participar em órgãos sociais de empresas que tutelaram quando exerceram funções. Isso é absolutamente natural. E não é necessário que tenham privatizado essa empresa ou que tenham contratado serviços a essas empresas, porque tem de haver uma relação que não pode ser de suspeição, porque, obviamente, a opinião pública tira disso uma crítica de suspeição.
Não é aceitável, não é sequer critério de recrutamento político para a formação de governos, que se tenha de fazer a dança dos gestores nos variados sectores da actividade económica e da tutela política. Isso não é aceitável nem compreensível. Porquê? Porque ficará sempre a dúvida.
Não queremos fazer processos de intenção em relação à pessoa A ou à pessoa B, este é um regime que deve ser organizado por forma a deixar muito claro à opinião pública, para crédito do regime e para crédito da transparência, que não há a possibilidade de uma promiscuidade entre a experiência política adquirida no Governo e aquelas que, futuramente, venham a ser as soluções de gestor de uma empresa privada, de um sector tutelado.
Este período dilatado, que não foi sugerido por qualquer caso recente em concreto, porque, aliás, foi apresentado muito antes do caso Mota-Engil, quer apenas verificar este ponto: ou este Parlamento se põe de acordo com aquilo que é a opinião da cidadania em geral, que é a preservação de um espaço de fronteira claro, nítido e muito vigoroso entre aquilo que são actividades de tutela política e aquilo que vêm a ser actividades de gestão privada, ou, então, a maioria dos Srs. Deputados está a contribuir para a degradação da democracia política, do regime e da confiança nas instituições. O resto, Sr.as e Srs. Deputados, é uma resistência pouco republicana a regras que não são extremadas, a regras que são absolutamente normais.
Querem contribuir para o prestígio do sistema político? Querem contribuir para o crédito da democracia, tal como ela está organizada entre nós? Então, aprovem e apoiem este tipo de medidas.
Adiá-las mais uma vez, reprová-las porque se quer ter em vista a possibilidade de uns «arranjinhos», de uns negócios para alguns, inclusivamente de uma forma desproporcionada e desigual entre as possibilidades dos vários Deputados, Sr.as e Srs. Deputados, estão a concorrer para a abstenção, para a indiferença