22 | I Série - Número: 102 | 4 de Julho de 2008
Esta Directiva impõe que a interdição de readmissão possa ir até aos cinco anos, penalizando duplamente os imigrantes, e poderá limitar o direito de asilo ao não ter em conta as diferentes circunstâncias políticas dos países de origem dos imigrantes, apesar de o direito de asilo ter uma directiva própria.
Esta Directiva limita as possibilidades de retorno voluntário.
Sei que alguns defendem que o fracasso da Directiva teria como única consequência a manutenção da actual desprotecção que, hoje, existe em alguns dos 27 países (concretamente em nove, Dinamarca, Finlândia, Reino Unido, Suécia, etc.).
Sei que a Directiva estipula que as decisões de repatriamento têm de ser tomadas caso a caso e devem assentar em critérios objectivos; que a Directiva determina que se tome em conta situações excepcionais; que a detenção só será permitida se outras medidas coercivas não puderem ser aplicadas ao caso e requer uma decisão escrita, fundada factualmente e nos termos da lei; que, no futuro, a Comissão terá capacidade para controlar e acompanhar mais de perto o que os Estados-membros fazem no domínio do regresso; que a existência de regras mais eficientes no domínio do combate à imigração ilegal e regresso permitirá que a União Europeia seja mais generosa em termos de imigração legal.
Sei tudo isto, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, mas sejamos claros: esta argumentação não é convincente e, como diz um amigo meu, há pessoas que gostam de ser enganadas.
O Sr. António Filipe (PCP): — Está a falar do Rui Pereira!
A Sr.ª Celeste Correia (PS): — O que a realidade factual nos diz é que estamos no século XXI, o século dos povos em movimento, como o qualifica António Guterres — 11,4 mil milhões de refugiados, 26 milhões de deslocados, 200 milhões que vivem, já hoje, num local diferente do seu país de origem.
Se juntarmos a tudo isto a acentuação da pobreza e das desigualdades, as alterações climáticas, a crise de combustíveis e dos alimentos, eis o cenário que leva a Europa a sentir medo: a sentir medo da imigração e a abdicar da sua matriz — a defesa da dignidade da pessoa humana e do Estado de Direito e é isso fundamentalmente que está em causa.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Celeste Correia (PS): — Todos sabemos que se não houver mecanismos que facultem a imigração legal, tende a aumentar a ilegal, promovida crescentemente por traficantes estruturadas em verdadeiras multinacionais do crime. Mas nós, socialistas, não devemos, não podemos nem queremos aceitar que a União Europeia aceite baixar padrões de protecção de direitos, que a União Europeia abdique da concepção de uma Europa de progresso social, respeitadora dos direitos humanos.
É evidente que não abdicamos do direito de os Estados terem instrumentos de defesa e que combatam a imigração ilegal, promovendo a legal, mas a aprovação desta Directiva não deixa de trazer brumas nefastas relativamente ao respeito pelos direitos humanos, que, em muitos países europeus, designadamente em Portugal, são dados adquiridos. Felizmente e orgulhamo-nos disso.
Com efeito, em Portugal, a legislação existente relativamente a esta temática é bem mais elevada e respeitadora dos direitos dos imigrantes do que a Directiva de Retorno. Um comunicado do Ministério de Administração Interna declarou: «A directiva não invalida as soluções que Portugal adoptou na lei dos estrangeiros. A legislação nacional vai continuar a ser aplicada» —, o que é aliás um direito consagrado na Directiva, nomeadamente no seu artigo 4.º.
As normas portuguesas já contemplam um regime de retorno voluntário e de afastamento que consagra com maior amplitude os direitos humanos.
Perguntar-me-ão: «mas qual é a alternativa? É deixar entrar toda a gente?» Não! Mas terá a União capacidade, não para receber toda a miséria do mundo, como disse o Presidente francês, numa expressão infeliz e redutora, mas para dar uma oportunidade a si própria e aos que desejam contribuir para o desenvolvimento da União Europeia, o que é generalizadamente reconhecido como necessário.
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.